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FACULDADE KURIOS
  HABILITAÇÃO EM PEDAGOGIA
PROF. ANTONIO MARTINS DE ALMEIDA FILHO




   POLÍTICAS BÁSICAS
       DA EDUCAÇÃO




 SENADOR POMPEU – CEARÁ
      JULHO – 2011
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     FACULDADE KURIOS
  HABILITAÇÃO EM PEDAGOGIA
PROF. ANTONIO MARTINS DE ALMEIDA FILHO




   POLÍTICAS BÁSICAS
       DA EDUCAÇÃO




 SENADOR POMPEU – CEARÁ
      JULHO – 2011
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As políticas públicas, particularmente as de caráter social, são mediatizadas pelas lutas,
pressões e conflitos entre elas. Assim, não são estáticas ou fruto de iniciativas abstratas,
mas estrategicamente empregadas no decurso dos conflitos sociais expressando, em
grande medida, a capacidade administrativa e gerencial para implementar decisões de
governo. (...)Ao longo da história, a educação redefine seu perfil reprodutor/inovador da
sociabilidade humana. Adapta-se aos modos de formação técnica e comportamental
adequados à produção e reprodução das formas particulares de organização do trabalho e
da vida.


                                                                   Eneida Shiroma
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                                      FACULDADE KURIOS
                                HABILITAÇÃO EM PEDAGOGIA
                      EMENTA DA DISCIPLINA POLÍTICAS BÁSICAS DA EDUCAÇÃO
                           PROF. ANTONIO MARTINS DE ALMEIDA FILHO




EMENTA: Sociedade, Estado e Educação – O pensamento Sociológico de Rousseau - a educação do
homem individual/social, Bonald a educação do homem social e Saint-Simon - a educação do homem
industrial. A Relação Educação e Sociedade - Os Clássicos Do Pensamento Social. As Funções do
Processo Educacional. As Políticas Educacionais no Contexto do Neoliberalismo. A Ideologia e a
Educação. A Crise do Capitalismo e da Ideologia Liberal; A Educação Neoliberal. As Políticas
Educacionais no Brasil - Contextualização Histórica. O Papel do Estado e a Educação como Direito. As
Políticas Públicas em Educação no Brasil. A Legislação Educacional Brasileira




       OBJETIVO GERAL:

       Identificar, historicamente, a importância das políticas de educação na prática
social da educação, analisando-as num contexto político econômico e cultural de país
capitalista dependente.




       REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

       AVELAR, Lúcia. (1996). "Clientelismo de Estado e política educacional
brasileira" in: Educação & Sociedade (Ano XVII, nº 54, p.: 34-50, abr.). Campinas:
Cedes.

      AZEVEDO, Janete L. (1988). Educação como política pública. São Paulo:
Autores Associados.

      DIDONET, Vital. (2005). FUNDEB: Dilemas e Perspectivas. Brasília: edição
independente, 164 p.

      DOURADO, Luiz Fernando & PARO, Vitor Henrique (org.). (2001). Políticas
Públicas e Educação Básica. São Paulo: Xamã.

       GENTILI, Pablo & MCCOWAN, Tristan (orgs.). (2003). Reinventar a escola
pública: política educacional para um novo Brasil. Petrópolis: Vozes, 272 p.

       GRACINDO, Reginha Vinhaes. (1997). "Estado, Sociedade e Educação: novas
prioridades, novas palavras-de-ordem e novos-velhos problemas" in: Revista Brasileira
de Política e Administração da Educação (v. XIII, nº. 1, p. 07-18). Rio de Janeiro:
Anpae.
5




        LIMA, Carlos Alberto Ferreira & MORAES, Raquel de Almeida. (2005). "A
política de formação de professores leigos no Brasil" in: Universidade e sociedade (Vol.
36, p. 73-80). Brasília: Andes.

       SADER, Emir & GENTILI, Pablo (org.). (1995). Pós-Neoliberalismo: as políticas
sociais e o Estado democrático. São Paulo, Paz e Terra.

      SANTOS, Wanderley Guilherme dos. (1979). Cidadania e Justiça. Rio de
Janeiro: Campus.

     STEINER, João E. & MALNIC, Gerhard (orgs.). (2006). Ensino Superior:
Conceito & Dinâmica. São Paulo: Edusp, 360 p.
6


SUMÁRIO



EMENTA DA DISCIPLINA                                               04



UNIDADE I

SOCIEDADE, ESTADO E EDUCAÇÃO - Rousseau, Bonald e Saint-Simon      07



UNIDADE II

A RELAÇÃO EDUCAÇÃO E SOCIEDADE - OS CLÁSSICOS DO PENSAMENTO
SOCIAL                                                             21



UNIDADE III

AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO CONTEXTO DO NEOLIBERALISMO            27



UNIDADE IV

AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL                                32



UNIDADE V

PAPEL DO ESTADO E A EDUCAÇÃO COMO DIREITO                          40



UNIDADE VI

AS POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO NO BRASIL                        48



UNIDADE VII

A LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL BRASILEIRA O PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO   57
7


        UNIDADE I




        1.1 SOCIEDADE, ESTADO E EDUCAÇÃO - Notas sobre Rousseau, Bonald e Saint-Simon



                                   Este texto foi apresentado em seminário promovido pela área temática “Estado, sociedade e educação” do
                                   Programa de Pós-Graduação em Educação e pelo Grupo de Pesquisa “Educação, Sociedade Civil e Estado”
                                   do Departamento de Administração Escolar e Economia da Educação da Faculdade de Educação da USP,
                                   realizado em novembro de 1995. Por Luiz Antônio Cunha. Faculdade de Educação, Universidade de São
                                   Paulo (Pesquisador-visitante, bolsista FAPESP).




         Estas notas visam destacar passagens do pensamento desses três precursores da sociologia no que diz
respeito, especialmente, a uma questão que mantém sua atualidade: a distinção social entre a educação pública e a
educação privada.

         Considerando que a sociologia, pelo menos em sua forma universitária, nasceu de uma pedagogia, pelo
magistério de Durkheim, propus-me a uma revisão do pensamento dos precursores da disciplina, no que concerne à
educação, com o objetivo de identificar gérmens da sociologia da educação. Na primeira aproximação, cujos
resultados são apresentados neste texto, foram examinadas obras de

        Rousseau e Bonald que escreveram trabalhos especialmente dedicados ao tema. Do primeiro, temos o
celebrado Emílio. e, do segundo, o desconhecido Théorie de l’éducation sociale. Saint-Simon não dedicou a esse
tema nenhum livro, mas atrevo-me a focalizar a projeção do pensamento que ele poderia ter tido a respeito,
deduzindo-o de seu industrialismo. Para tanto, vou me valer do livro de Júlio Verne, Paris no século XX.

          Rousseau foi um típico filósofo do Iluminismo, movimento de idéias predominante no século XVIII. Ainda
que não fossem homogêneos nas idéias a respeito do homem e da sociedade, os filósofos iluministas pretendiam
que a razão iluminasse as trevas da superstição e da ignorância com suas luzes, de modo que as descobertas
científicas pudessem se estender por todo o mundo Para isso, seria necessário, em primeiro lugar, recusar o
princípio de autoridade (tão caro à Igreja Católica e seus dogmas) e a concepção de que o homem é escravo da
história: ele deveria ser o seu senhor.

         O processo revolucionário ainda estava em seu início quando surgiu toda uma nova concepção do homem
e da sociedade, que passou a ser utilizada, também, como força material de uma contra-revolução que, de alguma
maneira, se esperava ou se preparava. Onde os filósofos iluministas viam superstições, passou-se a perceber as
idéias fundamentais que constituíam a sociedade. Ao invés de festejarem a razão e o novo, os românticos
celebravam o sentimento e a tradição. No lugar da autonomia individual, a sujeição à autoridade. Ao invés do
mecânico, o orgânico.

         As mudanças decorrentes da Revolução Francesa e de seus desdobramentos criaram condições para um
pensamento novo que desse conta das novas condições sociais, inclusive e particularmente da industrialização.
Embora mais atrasada do que a Inglaterra na produção industrial, a França passava por profundas mudanças
trazidas por um novo modo de produzir e de pensar, que acarretavam novos conflitos e até mesmo novos atores
sociais, como a classe operária. Ora, tanto o Iluminismo (esgotado pela própria política revolucionária) quanto o
romantismo (ultrapassado pelo dinamismo social) mostravam-se incapazes dessa tarefa. Saint-Simon defrontou-se
com as duas tradições de pensamento e procurou uma síntese que desse conta dessa nova realidade.

        Passemos, então, a cada um dos pensadores anunciados.
8


        1.1 Rousseau: a educação do homem individual/social


         Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) nasceu em Genebra, na Suíça, filho de um culto relojoeiro. Órfão de
mãe muito cedo, foi criado pelos tios. Com 16 anos abandonou Genebra e foi para Annecy, na Sabóia (Reino da
Sardenha), onde passou a viver numa espécie de pensionato para jovens. Aí se converteu ao catolicismo (era
protestante de origem) e completou sua formação humanística. Em 1741, então com 29 anos, mudou-se para Paris,
onde passou a manter-se dando aulas de música e copiando partituras, atividade que exerceria até o fim da vida.
Rousseau publicou textos sobre música (inclusive um dicionário especializado) e teatro; compôs duas óperas —
uma delas chegou a ser representada para Luís XV. Já no ano seguinte ao de sua chegada à capital francesa,
estabeleceu relações com os filósofos iluministas (Voltaire, Diderot, D’Alembert), tendo sido convidado a escrever
verbetes para a Enciclopédia, entre eles o de economia política.

         Incentivado por Diderot, Rousseau escreveu o Discurso sobre as ciências e as artes para o concurso da
Academia de Dijon, obtendo efetivamente o primeiro prêmio (1750). Mas foi com o Discurso sobre a origem e os
fundamentos da desigualdade entre os homens, escrito para o mesmo propósito, que, embora não alcançando o
mesmo resultado, veio a ter reconhecimento editorial (1755). Seu sucesso se estendeu à literatura de ficção, com
Júlia ou a nova Heloísa (1761). Rousseau havia se transformado, então, no autor da moda em Paris.

         As idéias germinadas no segundo discurso foram desenvolvidas no Contrato social e em Emílio ou da
educação, ambos publicados em 1762. As reações contra essas duas obras foram tremendas, e de diferentes lados,
inclusive de seus amigos filósofos e do clero, que desfechou ataques contra quem consideravam um inimigo da
ordem pública (isto é, da monarquia) e da religião. O Parlamento de Paris condenou Emílio à fogueira e o autor à
prisão, de que escapou fugindo, sendo acolhido por David Hume na Inglaterra (1766). Embora o segundo discurso
tivesse sido dedicado à cidade de Genebra, cujos cidadãos e magistrados foram elogiados pela liberdade de que
gozavam e pela sabedoria com que geriam os negócios públicos; embora, ainda, Rousseau tivesse sido
entusiasticamente recebido em sua cidade natal em 1754, Emílio foi também aí condenado.

          Em 1767, Rousseau recebeu autorização para retornar à França, onde retomou as cópias de partituras
musicais, os estudos de botânica e os escritos autobiográficos, assim como a poesia. Mas foi nesse período de
declínio de sua obra de filosofia social que ele exerceu sua mais controvertida atividade, a de assessor político. A
exemplo do que fizera em 1765, redigindo, a pedidos, uma Constituição para a Córsega, o filósofo elaborou, em
1772, um projeto de reforma do governo da Polônia. Esses textos de política prática foram muito criticados, como se
eles renegassem sua obra teórica, orientada para a igualdade e a liberdade. Rousseau foi contemporâneo da
Revolução Industrial, então em curso na Inglaterra, e pôde assistir a todas as conseqüências que acarretava para o
advento de um mundo novo. Diante desse fato, o filósofo, que não prezava o mundo feudal, buscava retardar e se
prevenir diante das mudanças ameaçadoras que se anunciavam. Manifestava um marcante pessimismo, que se
expressa na idéia que permeia seus trabalhos, a de que o homem é naturalmente bom, a sociedade é que o
corrompe. Como também na surpreendente primeira frase de uma obra pedagógica: “Tudo é certo em saindo das
mãos do Autor das coisas, tudo degenera nas mãos do homem” (Emílio, p. 9). No entanto, seu pensamento acabou
por ser adotado por quem queria acelerar a destruição do mundo feudal e a construção da sociedade capitalista. De
fato, mais do que um ideólogo datado, Rousseau deu à história das idéias uma importante contribuição, inclusive
para o nascimento da sociologia. Se eu tivesse de me restringir a uma pequena citação que resumisse a
contribuição do pensamento de Rousseau para o nascimento dessa disciplina, minha escolha seria a seguinte: “É
preciso estudar a sociedade pelos homens, e os homens pela sociedade; os que quiserem tratar separadamente da
política e da moral nunca entenderão nada de nenhuma das duas” (Emílio, p. 266).

          Ao contrário de Montesquieu, que se propôs compreender as leis tal como existem, a partir das condições
reais que as geraram, Rousseau inicia O contrato social com a preocupação de tomar os homens como são e as
leis como podem ser. Sua preocupação é unir o que o direito permite e o interesse prescreve, a fim de que a justiça
e a utilidade não fiquem separadas.

          Seu ponto de partida é a surpreendente constatação: “O homem nasce livre, e por toda a parte encontra-se
a ferros. O que se crê senhor dos demais, não deixa de ser mais escravo do que eles” (Contrato, p. 28).
9


          Essa ordem social aprisionadora não se origina na natureza, mas se funda em convenções. Só a família, a
mais antiga de todas as sociedades, é natural e não resulta de convenções. Ela é o primeiro modelo das sociedades
políticas, estas sim criadas por convenções.

          A convenção fundamental, o contrato social, é apresentada por Rousseau não como uma certeza nem
como um axioma, mas como uma suposição — uma hipótese de trabalho. Assim ele inicia o capítulo sobre o pacto
social: “Suponhamos os homens chegando àquele ponto em que os obstáculos prejudiciais à sua conservação no
estado de natureza sobrepujam, pela sua resistência, as forças de que cada indivíduo dispõe para manter-se nesse
estado. Então, esse estado primitivo já não pode subsistir, e o gênero humano, se não mudasse de modo de vida,
pereceria” (Contrato, p. 37 grifo meu).

         Conservar seus bens e a si mesmo seria o motivo racional para que os homens efetivassem o contrato
social. Sua razão então seria: “Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens de
cada associado com toda a força comum, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedece contudo a si mesmo,
permanecendo assim tão livre quanto antes” (Contrato, p. 38).

         Isso implica na “alienação total de cada associado, com todos os seus direitos, à comunidade toda”.
(Contrato, p. 39) O ato de cada um pôr em comum sua pessoa e todo o seu poder sob a direção suprema da
vontade geral é vantajoso porque: 1) cada um dando-se completamente, a condição é igual para todos; e 2) sendo
assim, ninguém se interessa por tornar essa condição onerosa para os demais. “Enfim, cada um dando-se a todos,
não se dá a ninguém.” (Contrato, p. 39)

          O que cada indivíduo perde com o contrato social é a liberdade natural e a posse (efeito da força ou o
direito do primeiro ocupante); por outro lado, ganha a liberdade civil e a propriedade de tudo o que possui. Qualquer
que seja a forma pela qual se dê a aquisição de bens pelos indivíduos, o direito que cada um tem sobre seus bens
está sempre subordinado ao direito que a comunidade tem sobre todos, sem o que o liame social não teria solidez,
nem o exercício da soberania teria uma força verdadeira.

        Foi a oposição dos interesses particulares que exigiu o estabelecimento das sociedades. Mas foi o acordo
desses mesmos interesses que possibilitou o contrato social, quer dizer, o nascimento das sociedades.

        O Estado é uma pessoa moral, que consiste na união de seus membros. Sua maior preocupação é com a
conservação desses membros, para o que precisa dispor de uma força universal e compulsiva para mover e dispor
cada parte de maneira mais conveniente a todos. “Assim como a natureza dá a cada homem poder absoluto sobre
todos os seus membros, o pacto social dá ao corpo político um poder absoluto sobre todos os seus, e é esse
mesmo poder que, dirigido pela vontade geral, ganha, como já disse, o nome de soberania” (Contrato, p. 54).

          Enquanto o filósofo celebra a vontade geral e a prevalência dos negócios públicos sobre os particulares,
bem como estuda a gênese e a anatomia da desigualdade entre os homens (no segundo discurso e no Contrato
social), em sua obra pedagógica Emílio, ele valoriza a educação típica da nobreza: não só seu aluno paradigmático
é um jovem abastado e “de berço”, como, também, a relação pedagógica é a que une o preceptor ao discípulo.

        Em “Economia política”, verbete da Enciclopédia, publicada no mesmo ano do Discurso sobre a
desigualdade (1755), Rousseau apresenta uma concepção social da educação bem distinta do individualismo que
emana de Emílio.

         Naquele curto texto, a educação pública é a mais importante tarefa da economia política, entendida como
administração pública. Ela é um dos princípios fundamentais do governo popular ou legítimo.

        Se é bom saber empregar os homens tais quais são, é muito melhor tornar quais se tem necessidade que
sejam: a autoridade mais absoluta é aquela que penetra no íntimo do homem e que se exerce sobre a vontade tanto
quanto sobre as ações. É certo que os povos, em grande parte, são aquilo que o governo os faz ser (“Economia”, p.
160).

        Mas formar cidadãos não é tarefa de um dia. Seria preciso educar os indivíduos ainda meninos. Eles
deveriam ser exercitados a não levar em conta sua própria individualidade, a não ser em suas relações com o corpo
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do Estado. Sua existência individual deveria ser percebida como parte da existência do Estado. A conseqüência
esperada por Rousseau é que os jovens se identificassem com esse “todo maior”, que se sentissem membros da
pátria e passassem a amá-la. Se as crianças fossem educadas em comum e em absoluta igualdade; se
assimilassem as leis do Estado e os princípios da vontade geral; se fossem educadas para respeitar esses
princípios acima de tudo; se fossem cercadas de exemplos e de coisas que lhes remetessem à “terna mãe que os
nutre” e do amor que ela tem por todos, o filósofo acreditava que o sentimento fraternal seria compartilhado por
todos. Como resultado, iriam querer apenas aquilo que a sociedade quisesse.

            A educação preconizada para as crianças deveria ser bem regulada, calcada mais nos deveres do que nos
direitos.

         Desde o primeiro momento da vida é preciso começar a merecer a viver; uma vez que, nascendo, tornamo-
nos participantes dos direitos dos cidadãos, o momento de nosso nascimento deve ser o início do exercício de
nossos deveres. Se existem leis para a idade adulta, devem ser também para a infância: que ensinem a obedecer
aos outros e, como não se deixar a razão de cada homem ser o único árbitro dos seus deveres, tanto menos se
deve deixar às luzes e preconceitos dos pais a educação dos filhos, que concerne mais ao Estado que aos pais; de
fato, e segundo o curso natural das coisas, a morte subtrai ao pai os últimos feitos da educação que começara,
enquanto a pátria sente seus efeitos cedo ou tarde: o Estado permanece, a família se dissolve (“Economia”, p. 169).

         Rousseau não pretende diminuir o papel dos pais na educação das crianças com a posição proeminente
atribuída ao Estado nessa matéria. Para ele, os pais nada mais fazem do que trocar de nome, já que, como
cidadãos, têm em comum a mesma autoridade que exerciam sobre os filhos, separadamente, no âmbito familiar.

         A educação pública seria exercida por magistrados indicados pelo Estado, conforme regras por ele
prescritas. A “magistratura educacional” deveria ser o prêmio do trabalho, o doce e honrado repouso da velhice, o
ápice de todas as honras para aqueles que tenham assumido dignamente as outras funções públicas.

         No entendimento de Rousseau, apenas três povos antigos praticaram a instrução pública, no sentido assim
definido: os cretenses, os lacedemônios e os persas, estes com o maior sucesso.2 Quando as nações se tornaram
demasiado grandes para serem bem governadas, a educação pública já não foi mais utilizada. Além dessa razão,
Rousseau alude a outras razões “que o leitor pode facilmente perceber”, responsáveis pela inexistência da
educação pública em qualquer povo moderno. Suponho que o filósofo quisesse que o leitor da Enciclopédia
pensasse na Igreja Católica, especialmente na Companhia de Jesus.

         Enquanto o filósofo celebra a vontade geral e a prevalência dos negócios públicos sobre os particulares no
Contrato social, em sua obra especificamente pedagógica, Emílio, ele valoriza o individualismo mais extremado, a
ponto de dizer que seria preciso optar entre formar o homem e fazer dele cidadão. Vejamos como essas idéias se
articulam.

         Num alentado texto de mais de quinhentas páginas, Rousseau apresenta bem mais do que um tratado de
pedagogia. Coerente com sua posição de que para bem educar é preciso dispor de toda uma visão do homem e da
sociedade, ele inclui boa parte do Contrato social no Emílio. Vou apresentar um resumo do pensamento aí exposto,
focalizando, especialmente, dois temas que me parecem centrais: o trabalho, a religião e a mulher.

        Embora o filósofo diga que escreveu essa obra motivado pela vontade de agradar “a uma boa mãe que
sabe pensar”, seu alcance ultrapassa a destinatária, se é que realmente existiu. Para a concepção de homem e de
sociedade de Rousseau, suas idéias teriam de resultar numa pedagogia.

        Para ele, tudo o que não temos ao nascer, e de que precisamos quando adultos, nos é dado pela
educação. Ela provém da natureza, dos homens ou das coisas. O desenvolvimento interno de nossas faculdades e
de nossos órgãos é a educação da natureza; o uso que nos ensinam a fazer desse desenvolvimento é a educação
dos homens; e o ganho de nossa própria experiência sobre os objetos que nos afetam é a educação das coisas.

        Dessas três, a educação dos homens é a única que podemos realmente controlar e, mesmo assim, por
suposição. Mas nem por isso Rousseau mostra apreço pela educação escolarizada. Apesar da estima que declarou
ter por certos professores da Universidade de Paris, não via como “uma verdadeira instituição pública esses
11


estabelecimentos ridículos a quem chamam colégios” (Emílio, p. 14). Resta a educação doméstica, sobre a qual
Rousseau vai concentrar sua atenção. A ela o filósofo dá uma especial importância:


                            [...] a educação do homem começa com seu nascimento; antes de falar, antes de compreender, já ele se instrui. A
                            experiência adianta-se às lições; no momento em que conhece sua ama, já muito ele adquiriu. Surpreenderiam-nos os
                            conhecimentos do homem mais bronco, se seguíssemos seu progresso desde o momento em que nasceu até aquele a
                            que chegou. Se se dividisse toda a ciência humana em duas partes, uma comum a todos os homens, outra peculiar aos
                            sábios, esta seria muito pequena em comparação com a outra. Mas não pensamos quase as aquisições gerais, porque
                            elas se fazem sem que nelas pensemos e até antes da idade da razão. De resto, o saber só se faz notar pelas diferenças
                            e, como nas equações de álgebra, as quantidades comuns não contam (Emílio, p. 42).



          Para apresentar suas idéias pedagógicas, o filósofo construiu uma situação ideal que se assemelha à
rigorosa construção do objeto de pesquisa nas Ciências Sociais. Na educação imaginada, o próprio filósofo seria o
preceptor de um jovem nobre. Com esse artifício, ele não queria dizer como deveria ser a educação dos jovens
nobres. Seu interesse estava com o homem em geral, vale dizer com a educação de uma criança que não ficasse
restrita a sua condição social. Aliás, trata se de um ponto em que Rousseau foi incisivo ao defender uma educação
que levasse em conta a possibilidade de mudanças sociais que pudessem levar a mudanças revolucionárias. Se o
senhor tivesse de se tornar mendigo, que não levasse consigo os preconceitos de sua condição anterior; se um rico
empobrecesse, que não persistisse no desprezo pelos pobres. Até mesmo o monarca pode tornar-se súdito. Logo, o
melhor a fazer nesse tempo de tão profundas mudanças é educar não em função da condição imediata da criança,
mas a prepará-la para viver em qualquer situação. Para isso seria preciso justamente atuar sobre o homem
abstrato.

         Na ordem social, em que todos os lugares estão marcados, cada um deve ser educado para o seu. Se um
indivíduo, formado para o seu, dele sai, para nada mais serve. A educação só é útil na medida em que sua carreira
acorde com a vocação dos pais; em qualquer outro caso ela é nociva ao aluno, nem que seja apenas em virtude dos
preconceitos que lhe dá. [...] Na ordem natural, sendo os homens todos iguais, sua vocação comum é o estado de
homem, e quem quer seja bem educado para esse, não pode desempenhar-se mal dos que com esse se
relacionam. Que se destine meu aluno à carreira militar, à eclesiástica ou à advocacia, pouco me importa. Antes da
vocação dos pais, a natureza chamou-o para a vida humana. Viver é o ofício que lhe quero ensinar. Saindo de
minhas mãos, ele não será, concordo, nem magistrado, nem soldado, nem padre; será primeiramente um homem.
Tudo o que um homem deve ser, ele o saberá, se necessário, tão bem quanto quem quer que seja; e por mais que
o destino o faça mudar de situação, ele estará sempre em primeiro lugar (Emílio, p. 15).

         A ocupação produtiva (“que pode outorgar a subsistência ao homem”) que mais se aproxima do estado
natural é o trabalho artesanal. Para Rousseau, o artesão só depende de seu trabalho. Ele é tão livre quanto o
lavrador é escravo, pois este está preso ao campo, cuja colheita está à mercê de outrem. O inimigo, o príncipe, um
vizinho poderoso, um processo, podem tomar-lhe a terra. Por sua dependência, o lavrador pode ser humilhado de
mil maneiras, o que não acontece com o artesão, pois diante de uma situação adversa, ele toma sua bagagem e
seu braço e vai-se embora.4 Entretanto, a agricultura é o primeiro ofício do homem: o mais honesto, o mais útil e por
conseguinte o mais nobre que se possa exercer. Emílio aprenderá a agricultura mas não irá praticá-la. Vai aprender
e praticar um ofício artesanal — e isso é para Rousseau questão fechada.

         Trata-se menos de aprender um ofício, para saber um ofício, do que para vencer os preconceitos que o
desprezam. Nunca sereis forçado a trabalhar para viver. Tanto pior. Mas pouco importa; não trabalheis por
necessidade, trabalhai por prazer. Abaixai-vos à condição de artesão para que fiqueis acima da vossa. Para
dominar a sorte e as coisas, começai tornandovos independente. Para reinar pela opinião começai reinando sobre
ela (Emílio, p. 215).

        O ofício que ele gostaria que seu discípulo aprendesse é o de marceneiro: é limpo e útil, pode ser exercido
em casa, mantém o corpo em atividade, exige do artesão engenho, habilidade, elegância e gosto. Ademais, se
Emílio viesse a se dedicar às “ciências especulativas”, ele poderia empregar o que aprendeu para fazer
instrumentos como lunetas, telescópios etc.

          Se o pedagogo mostrou a preferência pela marcenaria, não deixou de evidenciar seu desprezo por outros
ofícios artesanais, pelo automatismo que neles via ou pela força que exigiam:
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                             [...] não gostaria dessas profissões estúpidas em que os operários, sem engenho e quase autômatos, só exercitam suas
                             mãos no mesmo trabalho; os tecelões, os fazedores de meias, os canteiros: que adianta empregar nesses ofícios
                             homens de bom senso? É uma máquina que conduz outra (Emílio, p. 222).




         1.2 Bonald: a educação do homem social

          Louis de Bonald (1754-1840) era visconde, oficial dos mosqueteiros do rei e prefeito (maire) de Millau, na
França, sua cidade natal, quando eclodiu a Revolução. e início ele foi favorável às idéias revolucionárias, mas
reformulou sua posição logo após a Constituição Civil do Clero (1791). Depois de seis anos de exílio na Alemanha
(Constança e Heidelberg), retornou à França. Napoleão, que apreciou seu livro Théorie du pouvoir politique ET
religieux (1796), nomeou-o conselheiro titular da Universidade da França (1810), mas ele se recusou a assumir
encargos docentes. Com o fim do poder de Napoleão e a restauração da monarquia (1814), foi deputado 1815-
1823), ministro de Estado de Luís XVIII, diretor da censura de Carlos X e par e França. Foi eleito para a Academia
Francesa (de Letras). Seu pensamento político e social foi sintetizado na Démonstration philosophique du príncipe
constitutif de La societé (1830).

         Ao contrário do que queriam os iluministas, o homem é, para Bonald indissociável da sociedade
principalmente da sociedade religiosa. Deus governa os homens por meios humanos, por isso é que se fez homem
para regenerar as sociedades humanas. “Os olhos maldosos do ódio só se fixaram num canto do quadro, eles só
viram o particular, o homem; eu só vi o geral, a sociedade. Eles acreditaram que o homem fez a sociedade, mas eu
creio que que a sociedade faz o homem [...]” (Démonstration, p. 444).

         Nessa completa inversão da concepção rousseauniana da relação indivíduo- sociedade, Bonald tem o
conceito de sociedade como central em seu pensamento: “A sociedade é a reunião de seres semelhantes para sua
produção e sua conservação mútuas, e de seus elementos naturais e constitutivos” (Démonstration, p. 440).

         Essa definição se aplica tanto à sociedade em geral como às diferentes espécies de sociedades
particulares — doméstica, civil e religiosa —, assim como às suas combinações. Elas se distinguem das
associações (como as empresariais), que são obras humanas, e podem ser dissolvidas à vontade. Bonald foi
procurar na religião a constituição natural e geral da sociedade. A definição de religião do filósofo é a seguinte: “[...]
uma consciência mais ou menos distinta e razoável de um ser invisível e todo poderoso, criador dos seres
subordinados, a quem o homem atribui os bens e os males da vida, e do qual ele se esforça por merecer os
benefícios ou de aplacar a ira” (Démonstration, p. 501).

         O homem não encontra em si mesmo e em sua razão individual o fundamento das crenças religiosas,
sejam elas quais forem. Elas só podem ser encontradas na sociedade. O filósofo se pergunta, encaminhando a
resposta positiva, se a facilidade com que o cristianismo havia se propagado na Antigüidade pelos povos pagãos e,
no seu tempo, pelos “povos selvagens”, não poderia ser resultado (independentemente das obras sobrenaturais que
acompanhavam sua presença) de alguma coisa que se agregasse aos pensamentos, aos sentimentos do homem
social, mesmo sem o seu conhecimento, para os esclarecer e dirigir. Seria uma espécie de assimilação, da mesma
forma como se dá com as substâncias alimentares que ingerimos, que nutrem nossos corpos, sem que conheçamos
sua natureza e sua relação conosco, sem saber como elas agem em nosso organismo e se convertem em nosos
diferentes humores.

          Uma vez que a idéia da divindade entrou no mundo (pela revelação, de alguma maneira), ela se
diversificou ao infinito, fosse pelo desenvolvimento que os homens lhe deram, fosse pelas alterações que lhe
impuseram. De todo modo, transmitida pela língua, de geração a geração, ela não sai jamais da sociedade.

         Embora Bonald chame a sociedade religiosa de “mãe de todas as sociedades”, é na família que ele vai
encontrar o modelo comum a todas as sociedades. O gênero humano começou por uma família e continua
constituído por famílias. Cada família tem três elementos — pai, mãe, filho. Ao contrário dos animais, que nascem
perfeitos, o homem, além de produzir, tem de conservar sua prole. O homem nasce apenas perfectível, e tem de
tudo receber da sociedade.
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          A cada um dos elementos da sociedade doméstica corresponde uma pessoa social. Ao pai, à mãe e ao
filho correspondem o poder, o ministro e o súdito. O pai age tanto para a produção quanto para a conservação. E o
faz pelo ministério da mãe, que concorre para a realização da vontade e da ação do poder. O filho, submetido a
essa vontade e a essa ação, é o produto de um e de outro, no que diz respeito à produção e à conservação. Se o
pai é poder, a mãe é autoridade, pois necessita ser autorizada pelo esposo.

         A sociedade política, também chamada de Estado ou governo, é uma sociedade de produção e
conservação de famílias. O poder público não foi resultado de um contrato nem de uma imposição. Ele foi
necessário, conforme a natureza da vida dos seres humanos em sociedade. As causas e a origem do poder público
foram todas naturais. Os homens foram unidos para enfrentar um perigo comum diante de inimigos poderosos ou de
animais. Além desse inimigo externo, existiu, também a necessidade de reprimir um inimigo interno que, movido
pelas paixões, ameaçava a tranqüilidade da cidade e o repouso das famílias. Por uma razão, por outra ou por
ambas, a criação do poder público se deu mediante a iniciativa de um homem forte. Em conseqüência, foi o poder
que distinguiu e classificou as demais pessoas sociais, conforme procedimentos que não nos permitem encontrar o
mais leve traço de soberania popular. As funções essenciais do poder são julgar e combater. As dos ministros, o
conselho e o serviço para secundar sua ação. Como na sociedade política tudo é feito para a utilidade dos súditos,
eles não têm propriamente nada a fazer. Os súditos só têm poder e funções na sociedade doméstica.

         O poder público só pode ser independente (com relação aos súditos) se for proprietário da terra, pois toda
outra riqueza, imobiliária ou comercial, depende dos homens e de seus eventos. Em suma, a família torna-se povo e
a religião, de doméstica, torna-se pública. Na sociedade civil como na sociedade religiosa, Bonald vê sempre
poderes que comandam, súditos que obedecem e, entre eles, com diversos nomes, ministros, meios ou
intermediários, que, submetidos ao poder, recebem deste para transmitir aqueles. Esta hierarquia de pessoas e de
funções forma a “constituição natural de toda a sociedade”, também chamada de “sistema eterno da sociedade”.

        Na monarquia real, as três sociedades que compõem o “edifício social” são a sociedade religiosa (o clero),
a sociedade política (a nobreza) e a sociedade doméstica (o terceiro estado). Essas três ordens representam as três
coisas que constituem toda sociedade: as luzes, a propriedade e o trabalho. Elas integram os Estados Gerais.

         Na Teoria da educação social, Bonald trata de várias questões além da educação propriamente dita. Aos
capítulos sobre a educação doméstica, dos colégios, dos alunos, ele acrescenta outros sobre a administração geral,
a nobreza, o exército, os costumes, as letras, a filantropia pública, as finanças,


        1.2.1 Sociedade, Estado e Educação.

          O que dá unidade a todo esse conjunto, justificando o título da obra, é a preocupação geral com a
constituição da sociedade. Na sociedade conturbada de seu tempo, sacudida por revoluções, cumpria dirigi-la para
o caminho natural de onde havia sido desviada. Assim, a educação social no pensamento de Bonald pode ser
entendida em dois sentidos bem articulados: a educação dos jovens para que exerçam uma “profissão social” e a
educação dos adultos no sentido de conservar a sociedade.

         Três tipos de pessoas estão na sociedade mais do que são dela. Pertencem mais à sociedade natural do
que à sociedade política; pertencem mais às suas famílias do que ao Estado. São as crianças, as mulheres e o
povo, que correspondem, respectivamente, à fraqueza da idade, do sexo e da condição social. Essas pessoas
mantêm com a sociedade uma relação assimétrica: a sociedade deve protegê-las, mas elas não são feitas para
proteger a sociedade.

         O povo, isto é, os que exercem profissões puramente mecânicas e contínuas, permanecem no estado
habitual da infância, são apenas coração e sentimento. Seu espírito não pode se aplicar suficientemente sobre os
objetos dos conhecimentos humanos, a ponto de ser possível e útil dar-lhes esses conhecimentos. A razão do povo
deve ser seu sentimento. Portanto, é seu coração que deve ser dirigido e formado, não seu espírito.

        No entanto, nessa classe encontram-se pessoas que a natureza eleva acima de sua esfera, que ela destina
ao exercício de alguma profissão útil à sociedade. Para que essas pessoas possam cumprir seu destino, a
sociedade lhes dá os primeiros elementos dos conhecimentos, que nem a natureza nem a razão podem suprir. Esse
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é o objetivo das pequenas escolas situadas nas cidades e vilas, onde se ensina a ler, a escrever, os princípios da
religião e da aritmética.

         Bonald diz que um erro muito comum nos que muito leram, pouco meditaram e menos ainda observaram é
acreditarem na existência de talentos latentes na maioria das pessoas. Os philosophes (os iluministas?) crêem
também na existência de espíritos que eles não vêem. Nesse sentido, muitos autores que escreveram sobre a
educação pública tiveram essa quimera na mente. E, por quererem desenvolver os talentos escondidos, eles não
cultivaram ou não formaram as disposições conhecidas e comuns a todos os homens. Eles só observaram o povo
de suas janelas e só o estudaram nos livros. Saber ler e escrever não é mesmo necessário à felicidade física ou
moral do povo ou aos seus interesses.

          A sociedade dá ao povo uma garantia mais eficaz contra a trapaça e a má-fé. O que todo o povo precisa é
da religião, dos costumes e de uma honesta comodidade. Ele precisa do sentimento para manter a religião; de bons
exemplos e das leis executadas para manter os costumes; e de trabalho para manter a comodidade.

        Para Bonald, o homem é espírito, coração e sentimento, mas suas faculdades só se desenvolvem uma
depois da outra. A criança só tem sentimento, depois o coração se revela. Ambos devem ser objeto da educação
doméstica, que se destina ao homem natural.

         Mais tarde, propiciado pelos conhecimentos elementares fornecidos pela educação doméstica, o espírito se
desenvolve. Agora começa o homem social, cujo espírito é dado pela sociedade. Ele tem vontades e opiniões, que é
preciso regular e guiar. O objeto da educação social é, então, orientar para seu uso todas as faculdades do homem;
ela tem o direito de formar para a utilidade geral todas as suas faculdades: a faculdade de querer, de amar, de agir
— seu espírito, seu coração e seu sentimento.

         Há na sociedade profissões que são necessárias à conservação da sociedade natural, e outras,
necessárias à conservação da sociedade política. Assim, há famílias políticas ou sociais e famílias naturais. Se as
primeiras não tiverem os meios para dar a suas crianças uma educação social, a sociedade, em seu próprio
interesse, deve vir em sua ajuda.

        Bonald examina a objeção de que se o Estado está obrigado a educar as crianças das famílias sociais que
não dispuserem dos meios de fazê-lo por si mesmas, disso resultaria desigualdade entre os diversos membros da
sociedade. Para contestar essa objeção, ele recorre à explicação sobre as diferenças entre os homens. Para
conhecer aqueles que trabalham mais e melhor (obrigação que a natureza impõe a todos os homens), que cumprem
melhor seu dever, há um método infalível, público, isento de toda contestação: é pela sua fortuna.

          Aquele que enriquece é, portanto aquele que trabalha mais e que trabalha melhor, que cumpre mais
perfeitamente com seus deveres naturais, que apresenta a melhor garantia de sua aptidão em preencher os deveres
políticos, que merece ser distinguido e sua família, ser enobrecida (Théorie, pp. 247-248).

         Assim, o homem que enriquece e enobrece sua família pela compra de cargos nada mais faz do que provar
à sociedade que ele merece que sua família seja admitida a cumprir com os deveres políticos, pela sua aplicação e
sua aptidão no cumprimento dos deveres naturais. Bonald nem mesmo aceita a objeção de que possa haver meios
desonestos de enriquecimento numa sociedade constituída. Não se poderia admitir que o enobrecimento proviesse
apenas dos serviços distinguidos prestados à sociedade, senão apenas duas famílias por século seriam admitidas à
nobreza, enquanto que as necessidades da sociedade exigem um número um pouco maior.

         Bonald defende que deverão ser admitidos nos colégios (no ensino secundário) os filhos de todas as
famílias que devam ou que possam lhes dar a educação social ou pública.

         Toda família que não exerce uma profissão social, mas que deseja dar a suas crianças uma educação
social (ou pública), demonstra que tem a intenção de torná-las úteis à sociedade, e pode se elevar ao nível das
famílias sociais ou distinguidas. A sociedade não pode pagar a educação dessas crianças porque ignora se elas vão
querer ou se vão poder abraçar uma profissão social ou se sua família terá as qualidades necessárias para se
elevar ao nível de uma família social. Mas deve admiti-las nos estabelecimentos públicos e, assim, facilitar-lhes os
meios de serem úteis. Assim, a sociedade deverá admitir em seus estabelecimentos de educação pública todas as
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crianças sãs de corpo e de espírito, cujas famílias tenham a intenção e os meios de lhes dar a educação social. Só
não poderá assumir os encargos financeiros desses estabelecimentos.

        É preciso que os pais sejam persuadidos de que a educação social não tem por objetivo tornar os jovens
mais sábios, mas, sim, torná-los bons e próprios para receber a educação particular da profissão à qual estão
destinados, e que eles estão no colégio menos para se instruírem do que para se ocuparem (Théorie, p. 249-250).


        1.3 Saint-Simon: a educação do homem industrial

        Claude-Henri de Rouvroy, conde de Saint-Simon (1760-1825), desde muito jovem mostrou inconformidade
com as condições sociais, buscando mudanças em seu modo de vida pessoal. Participou como capitão do corpo
expedicionário francês na luta dos colonos da América contra a dominação britânica. Conheceu, então, uma
sociedade bem diferente da sua. Deparou com um modo de vida onde o comércio e a indústria eram atividades
muito valorizadas livres dos entraves feudais que persistiam na França. De volta a seu país, apoiou a Revolução,
abriu mão de seu título nobiliárquico, mas não desempenhou nenhum papel ativo, por julgar que as pessoas de
origem aristocrática deveriam aguardar o desfecho das disputas políticas.

         Enquanto o processo revolucionário se estabilizava, Saint-Simon dissipou sua fortuna na promoção de uma
convivência mundana com intelectuais e artistas, aproveitando para se instruir. Freqüentou cursos na Escola
Politécnica e na Escola de Medicina, onde a interação com os professores propiciou-lhe a participação em diversas
experiências. Foi só após 1805, completamente arruinado financeiramente, que ele veio a escrever a quase
totalidade de sua obra, valendo-se do amparo de amigos no governo.

          Além de ser um protagonista político, Saint- Simon extraiu das lutas de que participou elementos para a
construção de uma verdadeira matriz teórica, unindo teoria e prática política de um modo original. Criador do
positivismo como filosofia, desenvolveu incansável atividade panfletária contra os “ociosos” e em prol dos
industriais, os únicos que poderiam assessorar o rei na direção dos negócios públicos, de preferência exercendo
eles o poder diretamente.

         A ciência foi anunciada como a substituta da religião, depois sua parceira na condução da humanidade em
direção à harmonia e ao bem comum. Como um dos pioneiros do socialismo enquanto doutrina social, insistiu na
distinção entre sociedade e Estado, condição para se empreender uma organização social e até um governo da
sociedade sem poder estatal, no sentido político do termo; na igualdade entre os homens em cooperação, em lugar
da exploração do homem pelo homem; no fim do direito de herança; na contribuição de cada um segundo suas
capacidades e na retribuição a cada um conforme suas necessidades individuais.

         Como os filósofos do Iluminismo, ele confiava no poder da razão para transformar o mundo, recusando-se
a aceitá-lo como estava, adotando uma posição internacionalista e otimista quanto ao futuro da humanidade.
Afastava-se deles na avaliação da Idade Média, não aceitando seu julgamento de que teria sido uma época
dominada pela superstição e pela ignorância. Não escondia sua admiração pela sociedade feudal, no que tinha de
força coesiva representada pelo clero, e a religião como idéia dominante, propiciando a unidade de toda a Europa,
tendo no papa a direção intelectual. Mas ao contrário dos românticos, não aceitava que a Idade Média européia
pudesse ser o modelo do mundo novo, pois a ciência e a indústria, desde que estas apareceram na sociedade
feudal, determinaram a sua morte e se converteram nos princípios essenciais de uma nova sociedade.

        Saint-Simon insistiu em mostrar a existência, na França pós-revolucionária, de uma contradição entre o
progresso constante da indústria e as idéias comuns dos industriais. As idéias dominantes do feudalismo persistiam,
impedindo os industriais de desenvolverem todas as suas possibilidades objetivas. Eles continuaram pensando
como discípulos dos “metafísicos” (principalmente os iluministas), com aspirações à nobreza, não desenvolvendo
uma consciência dos interesses de sua classe, prolongando, assim, sua posição subalterna.

          O lugar ocupado pela burguesia deveria ter sido preenchido por um poder espiritual intermediário, já que os
homens não podem passar de uma só vez e inteiramente de uma doutrina a outra. O único papel desse poder
espiritual passageiro seria o de operar a transição de um sistema para outro, que, plenamente em funcionamento, o
dispensaria.
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         Esse poder espiritual não seria o do clero atual, que tinha se tornado “um encargo sem benefício para a
última classe da sociedade”, já que todas as suas prédicas se destinavam a levar os pobres à obediência passiva
dos ricos e dos privilegiados, os quais, por sua vez, deveriam obedecer cegamente, primeiro ao papa, depois ao rei.
Mas, se o clero estava ultrapassado, o mesmo não acontecia com o Cristianismo, doutrina de grande atualidade na
sociedade industrial.

          Em De l’organisation sociale, Saint-Simon dizia que o poder espiritual ou científico deveria ser
institucionalizado em duas academias separadas. A Academia de Ciências definiria um código de interesses,
enquanto que a Academia de Belas Artes trataria de um código de sentimentos. Elas atuariam conjuntamente no
estabelecimento de uma doutrina relativa à instrução pública.

          Embora a religião e o clero tivessem perdido o lugar que ocupavam na sociedade feudal, a sociedade
industrial plenamente constituída necessitaria de seu equivalente funcional. O pensamento científico substituiria o
dogma religioso e os cientistas ocupariam o lugar do clero. Mas a ciência não poderia ser apreendida da mesma
maneira por todos os indivíduos. Para os que fossem intelectualmente menos capazes, a verdade científica seria
difundida mediante rituais, cultos e processos místicos. A elite educada, ao contrário, apreenderia a ciência
diretamente. Assim, uma nova força coesiva se desenvolveria, garantindo a unidade da sociedade. Aí está o lugar
do pensador social como protagonista na difusão das novas formas de pensamento: a difusão de uma ética
baseada no pensamento positivo.

          Para se concluir o processo da Revolução, seria preciso acabar com o poder dos ociosos e transferi-lo aos
industriais. Saint-Simon dizia que todos os cidadãos dedicados a ocupações úteis desejavam que os agricultores,
negociantes e fabricantes de mais sucesso fossem os dirigentes dos negócios públicos, pelo menos da elaboração
do orçamento.Isso porque eles eram tidos como os mais interessados no aperfeiçoamento da moral pública e
privada, bem como no impedimento das desordens. Eles sentiriam mais do que ninguém a utilidade das ciências
positivas e os serviços que as belas artes poderiam prestar à sociedade. Além do mais, os industriais de sucesso já
teriam provado ser os mais capazes em seus negócios particulares, razão pela qual se poderia esperar que
fizessem o mesmo nos negócios públicos.

          Para mostrar a indispensabilidade dos industriais, Saint-Simon convidava o leitor de uma de suas cartas ao
rei, incluída em Du système industriel, a fazer uma suposição. Se a França perdesse de repente três mil cidadãos
pertencentes aos diversos ramos das ciências, das belas artes e da agricultura, da manufatura e do comércio, “ela
se tornaria um corpo sem alma”, em situação de inferioridade diante da nação rival. Se, ao contrário, ela
conservasse seus “homens de gênio” e perdesse trinta mil personagens consideradas as mais importantes dentre
os funcionários públicos, os militares, os legisladores, os clérigos, os proprietários ociosos, não resultaria disso
nenhum mal político para o Estado, e a nação conservaria sua posição elevada entre os povos civilizados.

          Refinando sua análise, Saint-Simon distingue dentre os industriais, no sentido estrito, os proprietários dos
não-proprietários, a quem chama de proletários ou de classe proletária. Reconhece a existência de conflitos entre
eles, bem como entre os dirigentes e os executores, entre os “chefes de trabalhos industriais” e os proletários, entre
estes e os especialistas. Em certas passagens, onde enfatiza a oposição entre os industriais, a burguesia e os
ociosos, ele sugere que os conflitos entre aquelas classes seriam espontaneamente resolvidos mediante
conciliação. Já em outras passagens, reconhece que o egoísmo desmedido dos ricos e a rebeldia dos pobres teriam
efeitos desorganizadores que comprometeriam a própria unidade social. Ele entendia a sociedade como um corpo
social, no qual as diversas partes contribuem, cada uma a seu modo, para a vida em comum. Nas suas palavras,
“mais do que um aglomerado de seres vivos, a sociedade é sobretudo uma verdadeira máquina organizada na qual
todas as partes contribuem de uma maneira diferente para o funcionamento do conjunto” (“De la physiologie
sociale”, Oeuvres, tomo V, p 177, grifo meu).

         No sistema positivo de pensamento, característico da etapa científica, todo o universo humano substituiria a
idéia de uma regulação divina pela da gravitação, como Newton havia estabelecido como hipótese para os corpos
celestes. Com os arranjos convenientes, o princípio da gravitação viria a tomar o lugar, com idéias claras e precisas,
de todos os princípios que a teologia ensinava até então 6

        A indústria, depois de ter sido a causa da evolução (que levou à Revolução), vai tornar-se o próprio fim da
vida social, penetrando todas as atividades, impondo-lhes suas características, inclusive na política. O governo
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militarizado do feudalismo estava orientado para a ação sobre os homens, por isso era hierarquizado. Já a indústria
tem por fim agir sobre a natureza, sobre as coisas, por isso o governo que lhe corresponde estará orientado para a
organização. A indústria opera uma nova socialização dos indivíduos, criando um tipo radicalmente novo de
solidariedade: é o trabalho que se torna o princípio de coesão e de integração social. Essa é a igualdade própria da
sociedade industrial, onde não existem privilegiados por razão de nascimento nesta ou naquela família.

          A plena realização do industrialismo como modo de vida implicaria o desaparecimento dos ociosos, com o
triunfo dos industriais, vindo o trabalho a ser o princípio organizativo de toda a sociedade. Assim, tendendo a tornar-
se a única classe da sociedade, os industriais (com suas diferenciações) forneceriam a base social para o princípio
da igualdade com diferenciação de funções. O sistema industrial estaria, então, baseado no princípio da igualdade
perfeita, opondo-se aos direitos de nascimento e a todo tipo de privilégio.

         Na linha de Rousseau, Saint-Simon considera que a educação (no sentido lato) é mais importante do que a
instrução propriamente dita, tendo em vista o bem-estar social. É aquela que forma os costumes, que desenvolve os
sentimentos e amplia a capacidade de previsão. Para os proletários, particularmente, a educação é muito mais
importante do que a instrução, haja vista a capacidade que o filósofo reconhece nesta classe de exercer a
administração das empresas. Isso não quer dizer que Saint-Simon condene o proletariado à educação espontânea.
Ao contrário, ele reconhece que essa classe tem mostrado disposição de se instruir, quando encontra condições
para isso, apesar de os filhos dos ricos, notadamente dos ociosos, terem mais tempo e recursos para se dedicarem
aos estudos.

         Para o filósofo, a instrução deveria ficar sob a responsabilidade do poder espiritual, devendo dela ser
retirada o conteúdo inerente à cultura dos ociosos, em especial as línguas clássicas e os autores gregos e latinos.
As ciências positivas é que deveriam ocupar o lugar deixado vago, especialmente a matemática, a física, a química
e a história natural. Detalhando seu propósito de renovar a mentalidade dos industriais, Saint-Simon sugeriu a
Napoleão (quando este retomou o poder em 1815) que instituísse cátedras públicas de política. Em 1825, no
Catecismo dos industriais, propôs a criação de três cátedras para o ensino dos principais elementos da ciência
social: uma cátedra de direção política e industrial; outra, de moral; e outra, de pesquisa científica.

         Em 1816, num opúsculo enviado à assembléia geral da Sociedade de Instrução Primária, entidade privada
destinada à promoção da instrução popular, notadamente mediante o ensino mútuo, Saint-Simon sugere a adoção
de medidas insólitas para sua época. Embora considerasse preferível e mais fácil a educação das crianças da
classe média do que da “última classe da sociedade”, ele recomendou a atração dos filhos das famílias ricas para
estudarem junto aos pobres; o prolongamento dos estudos dos “societários” até a escola secundária; e a adaptação
do currículo da escola primária às necessidades da indústria.

         Lamentavelmente, pouco mais se sabe a respeito da feição que assumiria a educação, especificamente a
instrução, na sociedade industrial preconizada por Saint-Simon.

          Quatro décadas depois de sua morte, Júlio Verne escreveu (em 1863) um romance de antecipação (ficção
científica), inédito até 1994, denominado Paris no século XX, onde projetou para a década de 1960 os processos
que considerava em curso na sociedade francesa de seu tempo, assim como a educação. Nessa projeção, a
presença do positivismo de Saint-Simon pode ser facilmente reconhecida na rejeitada caricatura do futuro
parisiense. Chama a atenção o fato de o romancista ter imaginado como seria a educação coerente com o
industrialismo pregado pelo filósofo, a que ele próprio não havia dado tal importância.

         Júlio Verne apresenta nesse romance uma visão profundamente pessimista do progresso. As maravilhas
tecnológicas não teriam resultado, um século após, na melhoria da vida humana. A educação, particularmente,
levou ao amesquinhamento das pessoas, formadas exclusivamente para o trabalho lucrativo na indústria e no
comércio. Assim, focalizar a imagem “industrialista” da educação, em Júlio Verne, é uma espécie de mirada no
negativo da imagem que dela teria Saint-Simon, pelo menos pela ótica de seu lado positivista mais extremado.

        Passemos, então, à Paris do futuro. O livro começa focalizando a distribuição dos prêmios anuais da
Sociedade Geral de Crédito Instrucional, que “correspondia perfeitamente às tendências industriais do século XX”.
Os capitais liberados pela estatização das ferrovias foram empregados numa empresa com fins educacionais. O que
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não teria nada de espantoso. “Ora, para um empresário, construir ou instruir é tudo a mesma coisa, visto que, para
falar a verdade, a instrução não passa de um tipo de construção, um pouco menos sólida” (Paris, pp. 32-33).

        Em 1937, durante o reinado de Napoleão V (Júlio Verne escrevera durante Napoleão III), o barão de
Vercampin, um bem-sucedido homem de negócios, obtivera autorização do Estado para fundir os liceus públicos e
privados numa única instituição, que cobria a França inteira, mantida por uma sociedade anônima, aprovada por
decreto imperial. No conselho administrativo estavam um diretor de ferrovias, um banqueiro, um senador, um
deputado, um coronel da polícia e o diretor geral do estabelecimento de ensino. “Como se vê, nenhum nome de
sábio ou professor no Conselho Administrativo. Era mais tranqüilizador para a instituição comercial” (Paris, p. 34).
Um inspetor do governo acompanhava as operações da companhia e as relatava ao ministro competente.

        O autor nada diz sobre o ensino superior, a não ser que a Escola Politécnica havia sido “supressa” em
1889. Nem sobre o ensino primário. Foi o ensino secundário que mereceu sua atenção.

         Nos cerca de 150 mil alunos da companhia, cuja idade e currículo leva a crer serem do ensino secundário,
“a ciência era incutida por meios mecânicos” (Paris, p. 34). As letras e as línguas mortas, como o latim e o grego,
foram relegadas a um segundo plano, com tendência à extinção. As línguas vivas, com a exceção do francês, eram
muito cultivadas, com objetivos comerciais, especialmente depois da conquista francesa da Cochinchina
(Indochina).

        A Sociedade tinha construído uma verdadeira “cidade instrucional” no Campo de Marte, onde cabiam
milhares de estudantes e mestres. Sintomaticamente no mesmo lugar onde a federação havia sido aclamada pela
massa revolucionária, 150 anos antes. Os negócios iam muito bem: o lucro do exercício de 1960 já superava o
preço de emissão das ações.

          Os estudantes premiados foram sendo chamados para ouvirem seus feitos celebrados na matemática e
nas ciências. Mas, quando foi chamado Michel Dufrénoy, primeiro prêmio em versos latinos, a gozação do público
foi geral, pelo desprezo que se tinha por essa “disciplina” remanescente. O incrível foi o prêmio que o herói do livro
(homônimo do filho de Júlio Verne) ganhara: o Manual do bom fabricante, que ele jogou no chão.

        Michel vivia numa “família eminentemente prática” (título de um capítulo do livro). Órfão, foi criado pelos
tios.

         O Sr. Stanilas Boutardin era o produto natural daquele século de indústrias; desenvolvera-se numa estufa
quente, em lugar de crescer em plena natureza; homem eminentemente prático, nada fazia que não fosse útil,
conformando suas menores idéias ao útil, com um desejo incontido de ser útil que ia dar num egoísmo
verdadeiramente ideal; unindo o útil ao desagradável, como teria dito Horácio; sua vaidade transparecia em suas
palavras, mais ainda que em seus gestos, e ele não teria permitido que sua própria sombra o precedesse; exprimia-
se por gramas e centímetros e andava com uma bengala métrica fosse qual fosse o clima, o que lhe dava um
grande conhecimento das coisas deste mundo; desprezava solenemente as artes, principalmente os artistas, para
dar a entender que os conhecia; para ele, a pintura não ia além da água forte, o desenho da cópia, a escultura da
fôrma, a música do apito das locomotivas, a literatura dos boletins da Bolsa (Paris, p. 53).

         O tio de Michel, banqueiro e industrial, crescera cercado pela mecânica, por isso explicava sua vida pelas
engrenagens ou transmissões. Movia-se regularmente com o mínimo de atrito possível, como um pistão num
cilindro perfeitamente calibrado. Transmitia seu movimento uniforme à mulher, ao filho, aos empregados, aos
criados de casa, todos eles verdadeiras máquinas-ferramentas de que ele, o grande motor, tirava o melhor partido
possível. Era um mau-caráter, incapaz de um bom ou de um mau movimento. Fizera uma imensa fortuna, animado
pelo “elã do século”. Mostrava-se reconhecido para com a indústria, que adorava como se fosse uma deusa.7

         Sua mulher, a tia de Michel, era, por sua vez,“uma verdadeira administradora, bem uma fêmea de
administrador” (Paris, p. 55).

       A história é da desventura de Michel em tentar ser “um homem prático”, exigência do tio que o queria
empregado em seu banco. E sua tentativa frustrada de ser um literato numa sociedade onde o primeiro dever do
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homem era ganhar dinheiro. Para os poetas, restava a única oportunidade de celebrar em seus versos as
maravilhas da indústria.

       A língua francesa estava recheada de palavras inglesas. Os inventores, os comerciantes de cavalos e os
vendedores de carros foram buscar na língua inglesa as palavras de que precisavam para valorizar seus produtos.8

        Na Sociedade, as cátedras de letras seriam extintas em 1962, em decorrência de uma decisão tomada em
assembléia geral dos acionistas. Dizia o desconsolado professor de retórica: “Quem quer saber de gregos e latinos,
que só servem, no máximo, para fornecer uma ou outra raiz para as palavras da ciência moderna!” (Paris, p. 132).

         Mas não só os literatos eram uma espécie em extinção. A carreira de soldado foi extinta porque não havia
mais exércitos nem guerras. No século anterior (o XIX), o desenvolvimento das máquinas de guerra havia atingido
tal ponto que o desarmamento foi o desfecho inevitável. As nações européias suprimiram o Estado militar e, com
ele, o espírito de luta. Antecipando o equilíbrio bélico da guerra fria da década de 1960, Júlio Verne dizia que
“efetivamente, as máquinas mataram a bravura e os soldados transformaram-se em mecânicos” (Paris, p. 138).

          O industrialismo teria imprimido sua marca na sociedade tão fortemente (como vaticinava Saint- Simon, o
filósofo positivista) que até mesmo as mulheres mudaram seu modo de ser — acabarão sendo substituídas por
máquinas de ar comprimido. Já era possível ver como as mulheres entraram em decadência fisiológica. O
diagnóstico do pianista Quinsonas, marginal como Michel, é bem depressivo, mostrando a adaptação da mulher ao
industrialismo e ao americanismo, seu modo de vida correspondente:

        A atitude envolvente da parisiense, seu porte gracioso, seu olhar vivo e terno, seu amável sorriso, sua
carnadura ao mesmo tempo adequada e firme, em pouco tempo deram lugar a formas longas, magras, áridas,
descarnadas, emaciadas, depauperadas, de uma desenvoltura mecânica, metódica e puritana. A cintura perdeu a
curva, o olhar ficou austero, as juntas enrijeceram; um nariz duro e rígido inclinou-se sobre os lábios finos e
chupados; o passo espichou; o anjo da geometria, antigamente tão pródigo no fornecimento de suas curvas mais
atraentes, entregou a mulher a todo o rigor da linha reta e dos ângulos agudos. A francesa virou americana; fala
gravemente dos negócios graves, encara a vida com rigidez, cavalga sobre o lombo magro dos costumes, veste-se
mal, sem gosto, e enverga coletes de tecido galvanizado, capazes de resistir às pressões mais intensas. Meu filho,
a França perdeu sua verdadeira superioridade; suas mulheres, no delicioso século de Luiz XV, haviam afeminado os
homens; de lá para cá passaram para o gênero masculino e já não valem o olhar de um artista nem a atenção de
um amante! (Paris, p. 144-145).

          Ao contrário de Saint-Simon, o filósofo positivista, Verne imaginava o aumento do poder do Estado. Apesar
da industrialização acionada pelos empresários privados, ele via a França dos próximos cem anos marcada pela
centralização estatal, movida por dez milhões de funcionários públicos. A propósito, alguém disse a Michel sobre a
possibilidade de arranjar um emprego público: “sempre é tempo de se funcionarizar”. Como as ferrovias, os teatros
haviam passado para o controle do governo.

         Depois que Michel demonstrou sua incapacidade para o trabalho no banco do tio, de onde fugira após
provocar grande prejuízo, seus amigos, marginais como ele, mas com relações vantajosas, arranjaram-lhe um
emprego no Grande Armazém Dramático. Apesar da boa vontade do diretor, ele fracassou em todas as tarefas que
lhe foram atribuídas na máquina burocrática do entretenimento oficial.

         Deserdado pelo tio banqueiro, incapaz de se adaptar no emprego público, a miséria chegou em pleno
inverno rigoroso. Perdeu contato com os amigos, marginais como ele, perdeu-se da amada e acabou morrendo de
fome e frio. Morto pela sociedade industrializada, que não admitia um poeta como ele, do mesmo modo que
condenava os artistas.


        1.3.1 À guisa de comparação

       Pelo exposto, podemos ver que os três pensadores focalizados — Rousseau, Bonald e Saint-Simon —
entendem diferentemente as relações entre sociedade, Estado e educação.
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        Para o Rousseau da Enciclopédia, educação pública é sinônimo de educação estatal, e seus destinatários
são todas as crianças nascidas na sociedade, em especial na república. Já no Emílio, o filósofo nem ao menos trata
a educação pública como tema a ser considerado, pois sua preocupação é a educação de um indivíduo abastado e
“de berço”.

          Para Bonald, há uma educação pública sinônima de educação estatal, pelo menos no tocante ao ensino
secundário, cujos destinatários são apenas os jovens oriundos das “famílias sociais”, isto é, da nobreza, aos quais
se juntariam os filhos das famílias burguesas que desejassem investir no ingresso nesse estamento. Além do mais,
o texto do filósofo reconhece a existência de escolas primárias nas cidades e nas vilas, destinadas a crianças das
“famílias naturais” que, sem se transformarem naquelas, haviam se elevado um pouco acima de sua condição
original. Tais escolas não são apresentadas pelo autor como escolas públicas. Possivelmente, elas seriam mantidas
por entidades constituintes da Sociedade Religiosa, portanto escolas privadas.

         Para Saint-Simon, finalmente, poucas são as referências à educação mantida pelo Estado. Ele se referiu,
certa vez, à Escola Politécnica (estatal) como o mais perfeito estabelecimento de ensino existente, e chegou a
propor a Napoleão a criação de cátedras para a educação dos industriais, possivelmente dos mais instruídos. No
que diz respeito ao ensino elementar, sua filiação à Sociedade de Instrução Primária — entidade civil filantrópica —
destinada a promover a educação das crianças proletárias, o filósofo apresenta sua atividade como sendo de
caráter público, embora não estatal. No mesmo sentido, a direção de toda instrução pública não ficaria a cargo do
Poder Público (do Estado), mas, sim, do Poder Espiritual, constituído da Academia de Ciências e da Academia de
Belas Artes.

         Se a expressão educação pública não-estatal está ausente dos escritos desse filósofo, a concepção está
bem presente. Ela veio a ser reforçada, na ótica do positivismo, por Augusto Comte (1830)9 e pela projeção ficcional
saint-simoniana de Júlio Verne (1863). Já na ótica socialista, também tributária do pensamento de Saint-Simon, a
educação pública não estatal veio a ser defendida por Karl Marx, pelo menos na exposição ao Conselho Geral da
Associação Internacional do Trabalho (1869).

        LUIZ ANTÔNIO CUNHA é sociólogo, mestre e doutor em educação. Lecionou na PUC/RJ, no IESAE/FGV,
na UNICAMP, na UFF, na USP e na FLACSO. Foi pesquisador-visitante da Faculdade de Educação da USP, com
bolsa da FAPESP. Dentre seus livros, os mais importantes são Educação e desenvolvimento social no Brasil (1975),
Educação, Estado e democracia no Brasil (1991), a trilogia sobre a universidade brasileira (Temporã, 1980; Crítica,
1983; Reformanda, 1988) e, o mais recente (1995), Educação brasileira: projetos em disputa (Lula x FHC na
campanha presidencial). Disponível em: http://www.anped.org.br/rbe/rbedigital/rbde01/rbde01_06_luiz_antonio_cunha.pdf
.Acessado em 27 de julho de 2011.
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        UNIDADE II



        1. A RELAÇÃO EDUCAÇÃO E SOCIEDADE - OS CLÁSSICOS DO PENSAMENTO SOCIAL


         A educação, para os clássicos como Durkheim, expressa uma doutrina pedagógica, que se apoia na
concepção do homem e sociedade. O processo educacional emerge através da família, igreja, escola e
comunidade. Fundamentalmente, Durkheim parte do ponto de vista que o homem é egoísta, que necessita ser
preparado para sua vida na sociedade. este processo é realizado pela família e também pelas escolas e
universidades:
                            A ação exercida pelas gerações adultas sobre as que ainda não estão maduras para a vida social, tem por objetivo
                            suscitar e desenvolver na criança determinados números de estados físicos, intelectuais e morais que dele reclamam,
                            por um lado, a sociedade política em seu conjunto, e por outro, o meio especifico ao qual está destinado. (DURKHEIM,
                            1973:44).



          Para Durkheim, o objeto da sociologia é o fato social, e a educação é considerada como o fato social, isto
é, se impõe, coercitivamente, como uma norma jurídica ou como uma lei. Desta maneira a ação educativa permitirá
uma maior integração do indivíduo e também permitirá uma forte identificação com o sistema social. Durkheim
rejeita a posição psicologista. Para ele, os conteúdos da educação são independentes das vontades individuais, são
as normas e os valores desenvolvidos por uma sociedade o grupo social em determinados momentos históricos,
que adquirem certa generalidade e com isso uma natureza própria, tornando-se assim ?coisas exteriores aos
indivíduos?:

        A criança só pode conhecer o dever através de seus pais e mestres. É preciso que estes sejam para ela a
encarnação e a personificação do dever. Isto é, que a autoridade moral seja a qualidade fundamental do educador.
A autoridade não é violenta, ela consiste em certa ascendência moral. Liberdade e autoridade não são termos
excludentes, eles se implicam. A liberdade é filha da autoridade bem compreendida. Pois, ser livre não consiste em
fazer aquilo que se tem vontade, e sim em se ser dono de si próprio, em saber agir segundo a razão e cumprir com
o dever. E justamente a autoridade de mestre deve ser empregada em dotar a criança desse domínio sobre si
mesma (DURKHEIM, 1973:47).

        Talcott Parsons (1964), sociólogo americano, divulgador da obra de Durkheim, observa que a educação,
entendida como socialização, é o mecanismo básico de constituição dos sistemas sociais e de manutenção e
perpetuação dos mesmos, em formas de sociedades, e destaca que sem a socialização, o sistema social é ineficaz
de manter-se integrado, de preservar sua ordem, seu equilíbrio e conservar seus limites. O equilíbrio é o fator
fundamental do sistema social e para que este sobreviva é necessário que os indivíduos que nele ingressam
assimilem e internalizem os valores e as normas que regem seu funcionamento.

         Aqui encontramos uma primeira diferença com o pensamento de Durkheim, que destaca sempre o aspecto
coercitivo da sociedade frente ao indivíduo. Parsons afirma que é necessário uma complementação do sistema
social e do sistema de personalidade, ambos sistemas tem necessidades básicas que podem ser resolvidas de
forma complementar. O sistema social para Parsons funciona armonicamente a partir do equilíbrio do sistema de
personalidade. A criança aceita o marco normativo do sistema social em troca do amor e carinho maternos. Este
processo se desenvolve através de mediações primarias: os próprios pais através da internalização de normas inicia
o processo de socialização primaria. A criança não percebe que as necessidades do sistema social estão se
tornando suas próprias necessidades. Desta maneira, para Parsons, o indivíduo é funcional para o sistema social.
Tanto para Durkheim como para Parsons, os princípios básicos que fundamentam e regem ao sistema social são:

        Continuidade;
        Conservação;
        Ordem;
        Harmonia;
        Equilíbrio
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       Estes princípios regem tanto no sistema social, como nos subsistemas. De acordo com Durkheim bem
como Parsons, a educação não é um elemento para a mudança social, e sim, pelo contrário, é um elemento
fundamental para a conservação e funcionamento do sistema social.

         Uma corrente oposta a Durkheim y Parsons estaria constituída pela obra de Dewey e Mannheim. O ponto
de partida de ambos autores é que a educação constitui um mecanismo dinamizador das sociedades através de um
indivíduo que promove mudanças. O processo educacional para Dewey e Mannheim, possibilita ao indivíduo atuar
na sociedade sem reproduzir experiências anteriores, acriticamente. Pelo contrario, elas serão avaliadas
criticamente , com o objetivo de modificar seu comportamento e desta maneira produzir mudanças sociais.

        É muito conhecida e difundida no Brasil a obra de Dewey, razão pela qual não a aprofundaremos em
detalhes. Entretanto, é necessário assinalar que para Dewey é impossível separar a educação do mundo da vida:


                                    A       educação       não      é     preparação     nem      conformidade.      Educação      é      vida,
                                    é viver, é desenvolver, é crescer. (DEWEY, 1971:29).



         Para Dewey, a escola é definida como uma micro-comunidade democrática. Seria o esboço da socialização
democrática, ponto de partida para reforçar a democratização da sociedade. Segundo Dewey, educação e
democracia formam parte de uma totalidade, definem a democracia com palavras liberais, onde os indivíduos
deveriam ter chances iguais. Em outras palavras, igualdade de oportunidades dentro dum universo social de
diferenças individuais. Para Mannheim, a educação é uma técnica social, que tem como finalidade controlar a
natureza e a historia do homem e a sociedade, desde uma perspectiva democrática.

        Define a educação como:


                           O processo de socialização dos indivíduos para uma sociedade harmoniosa, democrática porem controlada, planejada,
                           mantida pelos próprios indivíduos que a compõe.



         A pesquisa é uma das técnicas sociais necessárias para que se conheçam as constelações históricas
especificas. O planejamento é a intervenção racional, controlada nessas constelações para corrigir suas distorções
e seus defeitos. O instrumento que por excelência põe em pratica os planos desenvolvidos é a Educação.
(MANNHEIM, 1971:34).

        A pratica da socialização percorre diversos espaços, como família e outros grupos primários, a escola,
clubes, sindicatos, etc. Assim, a pratica democrática emerge horizontalmente permitindo a estruturação duma
sociedade igualitária. Concorda com Dewey que essa pratica deveria ser institucionalizada.



        1.1 AS FUNÇÕES DO PROCESSO EDUCACIONAL

         A pesar das profundas diferenças que separam as correntes sociológicas que se ocuparam da questão, e
que não podem ser ignoradas, existe entre elas um ponto de encontro: a educação constitui um processo de
transmissão cultural no sentido amplo do termo (valores, normas, atitudes, experiências, imagens, representações)
cuja função principal é a reprodução do sistema social. Isto é claro no pensamento durkheimiano, ao afirmar:

                           Em resumo, longe de a educação ter por objeto único e principal o indivíduo e seus interesses, ela é antes de tudo o
                           meio pelo qual a sociedade renova perpetuamente as condições de sua própria existência. A sociedade só pode viver se
                           dentre seus membros existe uma suficiente homogeneidade. A educação perpetua e reforça essa homogeneidade,
                           fixando desde cedo na alma da criança as semelhanças essenciais que a vida coletiva supõe. (DURKHEIM, 1973:52).
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         Também é este o sentido da formalização do processo de socialização do sistema social parsoniano; da
aprendizagem de papeis sociais atribuída a tal socialização por Linton; dos arbítrios culturais reproduzidos pela
prática pedagógica, que constituem um dos principais mecanismos de reprodução social para Bourdieu e Passeron.
Aceitando esta perspectiva de analise, o problema é: como a educação cumpre essa função e como se articula a
outros mecanismos de reprodução social. Dado que o tema remete a uma vasta e complexa questão, mais
importante que se perguntar pelas funções da educação em geral, é delimitar inicialmente o campo de analise às
funções da escola - uma das instituições que cumprem essa função de reprodução ideológica, deixando de lado
momentaneamente outras tão importantes quanto aquela (família, meios de comunicação, sindicatos, partidos, etc.).
Parece adequado recuperar as postulações que tentam uma articulação global entre a escola e a reprodução social.
O fato de que as mesmas se centram fundamentalmente no problema da reprodução ideológica pode servir como
uma primeira aproximação.

         No entanto, não se deve perder de vista que estes desenvolvimentos teóricos são ao mesmo tempo
suficientemente amplos e estreitos. Amplos, porque se referem ao conjunto dos aparelhos ideológicos que fazem
com que a sociedade exista e se mantenha. Restritos, porque privilegiam, precisamente, de modo geral, a análise
da ideologia, de maneira quase exclusiva. Em primeiro lugar, deve-se perguntar: qual é a função atribuída aos
aparelhos ideológicos no processo de reprodução social

          Se se privilegia a produção de bens materiais como eixo de analise no funcionamento da sociedade, a
historia da humanidade pode ser reconstruída através das formas de organização do trabalho social, isto é, a forma
pela qual os homens produzem bens materiais para a sua subsistência. Desde este ponto de vista, é possível
pensar que existe uma divisão entre os diversos agentes que desempenham tal trabalho social.

         Porem, talvez o mais importante seja o fato de que sobre tal divisão se ergue a possibilidade de que um
setor da sociedade organize o conjunto da atividade produtiva, obtendo benefícios provenientes de seu controle dos
meios de produção.

         E fundamentalmente no âmbito econômico, embora não exclusivamente, que se coloca a possibilidade
existência das classe sociais. E é também nesse âmbito que se desenha, de inicio, a possibilidade de conflito social
que emerge da relação de exploração e subordinação à qual está submetido o conjunto social dos não-proprietarios.
Claro está que a estruturação de tais classes, partindo da existência do conflito, supõe uma permanente
modificação da forma que sua relação assume. Radica-se aí a possibilidade de identificação de diferentes épocas
históricas e o reconhecimento de que a sociedade capitalista constitui apenas uma dessas épocas: aquela
caracterizada pela forma em que a organização social do trabalho conduz à existência de um modo de exploração
social a qual se gera a mais-valia.

        Por que, então, pensar na reprodução em suas diferentes formas?

        A mudança social ocorre necessariamente pelo fato de ser o conflito econômico intrínseco ao conceito de
sociedade que serve de ponto de partida?

         Responder afirmativamente a essa pergunta seria cair em uma visão simplista da sociedade. Se tal conflito
existe potencialmente, a possibilidade de sua realização a fim de produzir efeitos que realmente modifiquem a
estrutura social, supõe um complexo processo que não se resolve unicamente com mudanças no interior do
processo produtivo.

        Se se admite este suposto, chegar-se-á à conclusão de que a sociedade não se reproduz apenas no
aspecto econômico, mas em todos seus níveis.

          Compreender como e porque a sociedade logra se reproduzir, captar quais são os mecanismos eficazes
sobre os quais se assentam o seu funcionamento, pode ser, então, uma chave para compreender suas reais
possibilidades de mudança.

         Em conseqüência, a visualização do conflito deverá transcender o econômico. A analise da reprodução
social também fará o mesmo.
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          De fato, parece pouco convincente atribuir a persistência de uma forma social ao simples fato de que existe
uma classe social possuidora dos meios de produção, que se apropria do excedente econômico gerado pelo
conjunto social dos trabalhadores. Igualmente, é pouco convincente pensar que a sociedade se mantém em função
do estrito ? controle social cujo monopólio aquela classe detém.

         Sem duvida, a sociedade é algo mas complexo e em sua interpretação deve-se introduzir não apenas a
analise de suas instancias como, também, e fundamentalmente, a articulação entre as mesmas. Dai a importância
de alguns trabalhos que pretendem centrar-se na analise das superestruturas, em sua articulação com o aspecto
econômico.

        A escola e a reprodução social

        As primeiras apreciações em torno dos chamados aparelhos ideológicos do Estado foram feitas por
Gramsci. As superestruturas do bloco histórico constituem uma totalidade complexa em cujo interior se distinguem
duas esferas essenciais: a sociedade política e a sociedade civil.

         A sociedade política agrupa o aparelho de Estado, entendido este em seu sentido restrito, realizando o
conjunto das atividades da superestrutura que dão conta da função de dominação. Por sua vez, a sociedade civil
constitui a maior parte da superestrutura e é formada pelo conjunto dos organismos vulgarmente chamados
privados e que correspondem à função de hegemonia que o grupo social dominante exerce sobre a sociedade
global. Esta sociedade civil pode ser considerada sob três aspectos analiticamente diferentes e complementares:

                            Como ideologia da classe dominante, ela alcança todos os ramos da ideologia, da arte à ciência, incluindo a economia, o
                            direito, etc. Como concepção do mundo, difundida em todas as acamadas sociais para vinculá-las à classe dirigente, ela
                            se adapta a todos os grupos: dai provêm seus diferentes graus qualitativos: filosofia, religião, sentido comum, folclore;
                            como direção ideológica da sociedade, ela se articula em três níveis essenciais: a ideologia propriamente dita, a estrutura
                            ideológica - isto é, as organizações que a criam e a difundem - e o material ideológico, isto é: os instrumentos técnicos de
                            difusão da ideologia: sistema escolar, mas media e bibliotecas. (PORTELLI, 1971: 23)



          A partir destas considerações gerais, os problemas da ?estrutura e do material ideológico? passaram a ser
temas recorrentes de analise. Não obstante, o característico nesses estudos foi subordinar o conflito social surgido
no interior de tais instituições à analise formal de tais aparelhos ideológicos.

         Contudo, o processo educacional deixou de ser analisado como um processo a-histórico, para ser referido
à sociedade capitalista. Então, as perguntas fundamentais passaram a ser: que relação guarda o sistema escolar
com a estrutura das relações de classe Como tal sistema escolar age de maneira a assegurar a reprodução
ideológica e, em conseqüência, a reprodução da sociedade capitalista E, por fim, a pergunta, como os fatores
sociais agem no interior desse sistema educacional. Um dos principais esforços de elucidação deste problema foi
enunciado desta maneira:

         Para compreender adequadamente a natureza das relações que unem o sistema escolar à estrutura das
relações de classe e elucidar sem cair em uma espécie de metafísica da harmonia das esferas o do
providencialismo do melhor e do pior, das correspondências, homologias e coincidências redutíveis em ultima
analise à convergência de interesses, alianças ideológicas e afinidades entre habitus, deixando de lado o discurso
interminável que resultaria de percorrer em cada caso a rede completa das relações circulares que unem estruturas
e praticas pela mediação do habitus como produto das estruturas, para definir os limites de validade (isto é, validade
desses limites) de uma expressão abstrata como a de sistema de relações entre o sistema de ensino e a estrutura
das relações de classe. (BOURDIEU & PASSERON, 1976:212).

        Isto é, o nexo conceitual entre estruturas e praticas, que estes autores elaboram, é o de habitus definido
como:

                            Sistema de disposições duráveis e transferíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona a cada
                            momento como matriz de percepções, apreciações e ações, e torna possível a realização de tarefas suficientemente
                            diferenciadas, graças à transferencia analógica de esquemas que permitem resolver problemas da mesma forma, e,
                            graças a correções incessantes dos resultados obtidos, dialeticamente produzidos por estes resultados (BOURDIEU &
                            PASSERON, 1976:214).
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       Com estes postulados, tenta-se demostrar que a sociedade se organiza não apenas a partir de bens
econômicos, mas também a partir da produção de bens simbólicos, de habitus de classe, que, transmitidos
fundamentalmente pela família, levam a que os indivíduos organizem um modo de vida e uma determinada
concepção do mundo. A introdução desta dimensão se fundamenta no conceito de classe em jogo:


                            As diferenças propriamente econômicas são explicadas por distinções simbólicas na maneira de usufruir esses bens, ou
                            melhor, (é) através do consumo, e mais, através do consumo simbólico (ou ostentatorio) que se transmitem os bens
                            simbólicos, as diferenças de fato (se transformam assim) em distinções significativas. A lógica do sistema de ações e
                            procedimentos expressivos não pode ser compreendida de maneira independente de sua função, que é dar uma
                            tradução simbólica do sistema social como sistema de inclusão e exclusão, segundo a expressão de Mc Guire, mas
                            também significar a comunidade ou a distinção, transmutando os bens econômicos em atos de comunicação. De fato,
                            nada mais falso do que acreditar que as ações simbólicas (ou o aspecto simbólico das ações) nada significam Alem
                            delas mesmas; em verdade, elas expressam sempre uma posição social segundo uma lógica que é a mesma da
                            estrutura social: a lógica da distinção (BOURDIEU & PASSERON, 1976:217).



         Agora, bem instaladas as classes sociais a nível do mercado, este passa a ser visualizado como a
mediação entre a produção - ou a forma de participação na produção - e o jogo de distinções simbólicas onde se
reproduzem as relações de força entre as classes. Então, a pergunta é: quem e através de que mecanismos,
reproduzem essas distinções simbólicas. Esses autores privilegiam família como instituição reprodutora dos sistema
social. A família é que introduz o indivíduo no mundo da cultura, as crianças são socializadas muito antes de
entrarem na escola. Essa socialização corresponde a valores (em sentido amplo) que são patrimônio cultural do
universo social a que pertencem. Como, então, se relaciona a sua ação com aquela empreendida pelo sistema
educacional. Durkheim, como seus seguidores, se esforçava por assinalar que a importância do processo
educacional se baseava no fato de que o mesmo tinha como função principal a transmissão da cultura na
sociedade. Esta cultura era assim apresentada como única, indivisa, propriedade de todos os membros que
compõem o conjunto social. Uma das pretensões de Bourdieu e Passeron é justamente demostrar a não existência
de uma cultura única, mais que:


                            Na realidade, devido ao fato de que elas correspondem a interesses materiais e simbólicos de grupos ou classes
                            diferentemente situadas nas relações de força, esses agentes pedagógicos tendem sempre a reproduzir a estrutura de
                            distribuição do capital cultural entre esses grupos ou classes, contribuído do mesmo modo para a reprodução da
                            estrutura social: com efeito, as leis do mercado em que se forma o valor econômico ou simbólico, isto é, o valor enquanto
                            capital cultural, dos arbítrios culturais reproduzidos pelas diferentes ações pedagógicas (indivíduos educados) constituem
                            um dos mecanismos mais o menos determinantes segundo os tipos de formação social, pelos quais se acha assegurada
                            a reprodução social, definida como reprodução das relações de força entre classes sociais. (BOURDIEU & PASSERON,
                            1976:218).



         O sistema escolar reproduz, assim, a nível social, os diferentes capitais culturais das classes sociais e, por
fim, as próprias classes sociais. Os mecanismos de reprodução encontram sua explicação ultima nas?relações de
poder?, relações essas de domínio e subordinação que não podem ser explicadas por um simples reconhecimento
de consumos diferenciais. Assim, quando analisam a função ideológica do sistema escolar, uma de suas
preocupações é justamente a da possível autonomia que pode ser atribuída a ele, em relação à estrutura de
classes. Com efeito, Bourdieu e Passeron perguntam:


                            Como levar em conta a autonomia relativa que a Escola deve à sua função específica, sem deixar escapar as funções de
                            classes que ela desempenha, necessariamente, em uma sociedade dividida em classes? (BOURDIEU & PASSERON,
                            1976:219).



         E respondem:

                            Se não é fácil perceber simultaneamente a autonomia relativa do sistema escolar, e sua dependência relativa à estrutura
                            das relações de classe, é porque, entre outras razões, a percepção das funções de classe do sistema escolar está
                            associada, na tradição teórica, a uma representação instrumentalista das relações entre a escola e as classes
                            dominantes como se a comprovação da autonomia supusesse a ilusão de neutralidade do sistema de ensino.
                            (BOURDIEU & PASSERON, 1976:220).
26


         O que parece, sim, surgir da exposição é que no caso das relações entre escola e classes sociais a
harmonia apresentada pelos autores parece perfeita: as estruturas objetivas produzem os habitus de classe e, em
particular, as disposições e predisposições que, gerando as praticas adaptadas a essas estruturas, permitem o
funcionamento e a perpetuação das estruturas.

        Bourdieu e Passeron falam da reprodução das classes do ponto de vista de uma analise ideológica.

          Neste sentido, a noção de existência de códigos lingüisticos é de central importância. Existem códigos
lingüisticos que se expressam claramente na linguagem, gerando relações diferentes, constituem representações,
significações próprias da cultura de grupos ou classes sociais. Frente a essa cultura fragmentada, o sistema escolar
impõe uma norma lingüistica e cultural determinada, mas aproximada àquela que é parte do universo simbólico das
famílias burguesas, e distanciada, em conseqüência, daquela dos setores populares. O êxito ou o fracasso das
crianças na escola se explica pela distancia de sua cultura ou língua em relação à cultura e à língua escolares.
Finalmente, introduziremos o ponto de vista de Poulantzas sobre o papel da escola, no qual se privilegia como eixo
de analise a divisão trabalho intelectual/trabalho manual, como forma de analisar tanto a função ideológica como a
de reprodução da força de trabalho anexa à mesma:



                            Com efeito, só se pode dizer de forma totalmente análoga e aproximativa que a escola forma trabalho intelectual de um
                            lado e trabalho manual (formação técnica) de outro. Numerosos estudos mostraram amplamente que a escola capitalista
                            não pode, situada globalmente como está, ao lado do trabalho intelectual, formar o essencial do trabalho manual. A
                            formação profissional operaria e essencialmente o saber técnico operário não se ensina (não pode ser ensinado) na
                            escola capitalista, nem mesmo em suas máquinas e aparelhos do ensino técnico. O que se ensina principalmente à
                            classe operaria é a disciplina, o respeito à autoridade, a veneração de um trabalho intelectual que se acha quase sempre
                            fora do aparelho escolar. De maneira alguma, as coisas se apresentam da mesma forma para a nova pequena burguesia
                            e para o trabalho intelectual, sendo sua força de trabalho, em seu lado intelectual, efetivamente formada pela escola.
                            (POULANTZAS, 1975:288)




        Isto é, o que Poulantzas tenta reafirmar é que as funções da escola só podem ser analisadas em função
das classes sociais às quais dirige sua ação, e não em função de instituições ou redes escolares. Isso nos permite
encontrar no interior da escola uma reprodução da divisão social do trabalho e afirmar que:

O principal papel da escola capitalista não é ?qualificar? diferentemente o trabalho manual e o trabalho intelectual,
mas, muito mas, desqualificar o trabalho manual (sujeitá-lo), qualificando só o trabalho intelectual. Disponível em:
http://www.antroposmoderno.com/antro-articulo.php?id_articulo=243. Acessado em 27 de julho de 2011.
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Políticas educacionais e pensadores sociais

  • 1. FACULDADE KURIOS HABILITAÇÃO EM PEDAGOGIA PROF. ANTONIO MARTINS DE ALMEIDA FILHO POLÍTICAS BÁSICAS DA EDUCAÇÃO SENADOR POMPEU – CEARÁ JULHO – 2011
  • 2. 2 FACULDADE KURIOS HABILITAÇÃO EM PEDAGOGIA PROF. ANTONIO MARTINS DE ALMEIDA FILHO POLÍTICAS BÁSICAS DA EDUCAÇÃO SENADOR POMPEU – CEARÁ JULHO – 2011
  • 3. 3 As políticas públicas, particularmente as de caráter social, são mediatizadas pelas lutas, pressões e conflitos entre elas. Assim, não são estáticas ou fruto de iniciativas abstratas, mas estrategicamente empregadas no decurso dos conflitos sociais expressando, em grande medida, a capacidade administrativa e gerencial para implementar decisões de governo. (...)Ao longo da história, a educação redefine seu perfil reprodutor/inovador da sociabilidade humana. Adapta-se aos modos de formação técnica e comportamental adequados à produção e reprodução das formas particulares de organização do trabalho e da vida. Eneida Shiroma
  • 4. 4 FACULDADE KURIOS HABILITAÇÃO EM PEDAGOGIA EMENTA DA DISCIPLINA POLÍTICAS BÁSICAS DA EDUCAÇÃO PROF. ANTONIO MARTINS DE ALMEIDA FILHO EMENTA: Sociedade, Estado e Educação – O pensamento Sociológico de Rousseau - a educação do homem individual/social, Bonald a educação do homem social e Saint-Simon - a educação do homem industrial. A Relação Educação e Sociedade - Os Clássicos Do Pensamento Social. As Funções do Processo Educacional. As Políticas Educacionais no Contexto do Neoliberalismo. A Ideologia e a Educação. A Crise do Capitalismo e da Ideologia Liberal; A Educação Neoliberal. As Políticas Educacionais no Brasil - Contextualização Histórica. O Papel do Estado e a Educação como Direito. As Políticas Públicas em Educação no Brasil. A Legislação Educacional Brasileira OBJETIVO GERAL: Identificar, historicamente, a importância das políticas de educação na prática social da educação, analisando-as num contexto político econômico e cultural de país capitalista dependente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: AVELAR, Lúcia. (1996). "Clientelismo de Estado e política educacional brasileira" in: Educação & Sociedade (Ano XVII, nº 54, p.: 34-50, abr.). Campinas: Cedes. AZEVEDO, Janete L. (1988). Educação como política pública. São Paulo: Autores Associados. DIDONET, Vital. (2005). FUNDEB: Dilemas e Perspectivas. Brasília: edição independente, 164 p. DOURADO, Luiz Fernando & PARO, Vitor Henrique (org.). (2001). Políticas Públicas e Educação Básica. São Paulo: Xamã. GENTILI, Pablo & MCCOWAN, Tristan (orgs.). (2003). Reinventar a escola pública: política educacional para um novo Brasil. Petrópolis: Vozes, 272 p. GRACINDO, Reginha Vinhaes. (1997). "Estado, Sociedade e Educação: novas prioridades, novas palavras-de-ordem e novos-velhos problemas" in: Revista Brasileira de Política e Administração da Educação (v. XIII, nº. 1, p. 07-18). Rio de Janeiro: Anpae.
  • 5. 5 LIMA, Carlos Alberto Ferreira & MORAES, Raquel de Almeida. (2005). "A política de formação de professores leigos no Brasil" in: Universidade e sociedade (Vol. 36, p. 73-80). Brasília: Andes. SADER, Emir & GENTILI, Pablo (org.). (1995). Pós-Neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. São Paulo, Paz e Terra. SANTOS, Wanderley Guilherme dos. (1979). Cidadania e Justiça. Rio de Janeiro: Campus. STEINER, João E. & MALNIC, Gerhard (orgs.). (2006). Ensino Superior: Conceito & Dinâmica. São Paulo: Edusp, 360 p.
  • 6. 6 SUMÁRIO EMENTA DA DISCIPLINA 04 UNIDADE I SOCIEDADE, ESTADO E EDUCAÇÃO - Rousseau, Bonald e Saint-Simon 07 UNIDADE II A RELAÇÃO EDUCAÇÃO E SOCIEDADE - OS CLÁSSICOS DO PENSAMENTO SOCIAL 21 UNIDADE III AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO CONTEXTO DO NEOLIBERALISMO 27 UNIDADE IV AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL 32 UNIDADE V PAPEL DO ESTADO E A EDUCAÇÃO COMO DIREITO 40 UNIDADE VI AS POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO NO BRASIL 48 UNIDADE VII A LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL BRASILEIRA O PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO 57
  • 7. 7 UNIDADE I 1.1 SOCIEDADE, ESTADO E EDUCAÇÃO - Notas sobre Rousseau, Bonald e Saint-Simon Este texto foi apresentado em seminário promovido pela área temática “Estado, sociedade e educação” do Programa de Pós-Graduação em Educação e pelo Grupo de Pesquisa “Educação, Sociedade Civil e Estado” do Departamento de Administração Escolar e Economia da Educação da Faculdade de Educação da USP, realizado em novembro de 1995. Por Luiz Antônio Cunha. Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo (Pesquisador-visitante, bolsista FAPESP). Estas notas visam destacar passagens do pensamento desses três precursores da sociologia no que diz respeito, especialmente, a uma questão que mantém sua atualidade: a distinção social entre a educação pública e a educação privada. Considerando que a sociologia, pelo menos em sua forma universitária, nasceu de uma pedagogia, pelo magistério de Durkheim, propus-me a uma revisão do pensamento dos precursores da disciplina, no que concerne à educação, com o objetivo de identificar gérmens da sociologia da educação. Na primeira aproximação, cujos resultados são apresentados neste texto, foram examinadas obras de Rousseau e Bonald que escreveram trabalhos especialmente dedicados ao tema. Do primeiro, temos o celebrado Emílio. e, do segundo, o desconhecido Théorie de l’éducation sociale. Saint-Simon não dedicou a esse tema nenhum livro, mas atrevo-me a focalizar a projeção do pensamento que ele poderia ter tido a respeito, deduzindo-o de seu industrialismo. Para tanto, vou me valer do livro de Júlio Verne, Paris no século XX. Rousseau foi um típico filósofo do Iluminismo, movimento de idéias predominante no século XVIII. Ainda que não fossem homogêneos nas idéias a respeito do homem e da sociedade, os filósofos iluministas pretendiam que a razão iluminasse as trevas da superstição e da ignorância com suas luzes, de modo que as descobertas científicas pudessem se estender por todo o mundo Para isso, seria necessário, em primeiro lugar, recusar o princípio de autoridade (tão caro à Igreja Católica e seus dogmas) e a concepção de que o homem é escravo da história: ele deveria ser o seu senhor. O processo revolucionário ainda estava em seu início quando surgiu toda uma nova concepção do homem e da sociedade, que passou a ser utilizada, também, como força material de uma contra-revolução que, de alguma maneira, se esperava ou se preparava. Onde os filósofos iluministas viam superstições, passou-se a perceber as idéias fundamentais que constituíam a sociedade. Ao invés de festejarem a razão e o novo, os românticos celebravam o sentimento e a tradição. No lugar da autonomia individual, a sujeição à autoridade. Ao invés do mecânico, o orgânico. As mudanças decorrentes da Revolução Francesa e de seus desdobramentos criaram condições para um pensamento novo que desse conta das novas condições sociais, inclusive e particularmente da industrialização. Embora mais atrasada do que a Inglaterra na produção industrial, a França passava por profundas mudanças trazidas por um novo modo de produzir e de pensar, que acarretavam novos conflitos e até mesmo novos atores sociais, como a classe operária. Ora, tanto o Iluminismo (esgotado pela própria política revolucionária) quanto o romantismo (ultrapassado pelo dinamismo social) mostravam-se incapazes dessa tarefa. Saint-Simon defrontou-se com as duas tradições de pensamento e procurou uma síntese que desse conta dessa nova realidade. Passemos, então, a cada um dos pensadores anunciados.
  • 8. 8 1.1 Rousseau: a educação do homem individual/social Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) nasceu em Genebra, na Suíça, filho de um culto relojoeiro. Órfão de mãe muito cedo, foi criado pelos tios. Com 16 anos abandonou Genebra e foi para Annecy, na Sabóia (Reino da Sardenha), onde passou a viver numa espécie de pensionato para jovens. Aí se converteu ao catolicismo (era protestante de origem) e completou sua formação humanística. Em 1741, então com 29 anos, mudou-se para Paris, onde passou a manter-se dando aulas de música e copiando partituras, atividade que exerceria até o fim da vida. Rousseau publicou textos sobre música (inclusive um dicionário especializado) e teatro; compôs duas óperas — uma delas chegou a ser representada para Luís XV. Já no ano seguinte ao de sua chegada à capital francesa, estabeleceu relações com os filósofos iluministas (Voltaire, Diderot, D’Alembert), tendo sido convidado a escrever verbetes para a Enciclopédia, entre eles o de economia política. Incentivado por Diderot, Rousseau escreveu o Discurso sobre as ciências e as artes para o concurso da Academia de Dijon, obtendo efetivamente o primeiro prêmio (1750). Mas foi com o Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens, escrito para o mesmo propósito, que, embora não alcançando o mesmo resultado, veio a ter reconhecimento editorial (1755). Seu sucesso se estendeu à literatura de ficção, com Júlia ou a nova Heloísa (1761). Rousseau havia se transformado, então, no autor da moda em Paris. As idéias germinadas no segundo discurso foram desenvolvidas no Contrato social e em Emílio ou da educação, ambos publicados em 1762. As reações contra essas duas obras foram tremendas, e de diferentes lados, inclusive de seus amigos filósofos e do clero, que desfechou ataques contra quem consideravam um inimigo da ordem pública (isto é, da monarquia) e da religião. O Parlamento de Paris condenou Emílio à fogueira e o autor à prisão, de que escapou fugindo, sendo acolhido por David Hume na Inglaterra (1766). Embora o segundo discurso tivesse sido dedicado à cidade de Genebra, cujos cidadãos e magistrados foram elogiados pela liberdade de que gozavam e pela sabedoria com que geriam os negócios públicos; embora, ainda, Rousseau tivesse sido entusiasticamente recebido em sua cidade natal em 1754, Emílio foi também aí condenado. Em 1767, Rousseau recebeu autorização para retornar à França, onde retomou as cópias de partituras musicais, os estudos de botânica e os escritos autobiográficos, assim como a poesia. Mas foi nesse período de declínio de sua obra de filosofia social que ele exerceu sua mais controvertida atividade, a de assessor político. A exemplo do que fizera em 1765, redigindo, a pedidos, uma Constituição para a Córsega, o filósofo elaborou, em 1772, um projeto de reforma do governo da Polônia. Esses textos de política prática foram muito criticados, como se eles renegassem sua obra teórica, orientada para a igualdade e a liberdade. Rousseau foi contemporâneo da Revolução Industrial, então em curso na Inglaterra, e pôde assistir a todas as conseqüências que acarretava para o advento de um mundo novo. Diante desse fato, o filósofo, que não prezava o mundo feudal, buscava retardar e se prevenir diante das mudanças ameaçadoras que se anunciavam. Manifestava um marcante pessimismo, que se expressa na idéia que permeia seus trabalhos, a de que o homem é naturalmente bom, a sociedade é que o corrompe. Como também na surpreendente primeira frase de uma obra pedagógica: “Tudo é certo em saindo das mãos do Autor das coisas, tudo degenera nas mãos do homem” (Emílio, p. 9). No entanto, seu pensamento acabou por ser adotado por quem queria acelerar a destruição do mundo feudal e a construção da sociedade capitalista. De fato, mais do que um ideólogo datado, Rousseau deu à história das idéias uma importante contribuição, inclusive para o nascimento da sociologia. Se eu tivesse de me restringir a uma pequena citação que resumisse a contribuição do pensamento de Rousseau para o nascimento dessa disciplina, minha escolha seria a seguinte: “É preciso estudar a sociedade pelos homens, e os homens pela sociedade; os que quiserem tratar separadamente da política e da moral nunca entenderão nada de nenhuma das duas” (Emílio, p. 266). Ao contrário de Montesquieu, que se propôs compreender as leis tal como existem, a partir das condições reais que as geraram, Rousseau inicia O contrato social com a preocupação de tomar os homens como são e as leis como podem ser. Sua preocupação é unir o que o direito permite e o interesse prescreve, a fim de que a justiça e a utilidade não fiquem separadas. Seu ponto de partida é a surpreendente constatação: “O homem nasce livre, e por toda a parte encontra-se a ferros. O que se crê senhor dos demais, não deixa de ser mais escravo do que eles” (Contrato, p. 28).
  • 9. 9 Essa ordem social aprisionadora não se origina na natureza, mas se funda em convenções. Só a família, a mais antiga de todas as sociedades, é natural e não resulta de convenções. Ela é o primeiro modelo das sociedades políticas, estas sim criadas por convenções. A convenção fundamental, o contrato social, é apresentada por Rousseau não como uma certeza nem como um axioma, mas como uma suposição — uma hipótese de trabalho. Assim ele inicia o capítulo sobre o pacto social: “Suponhamos os homens chegando àquele ponto em que os obstáculos prejudiciais à sua conservação no estado de natureza sobrepujam, pela sua resistência, as forças de que cada indivíduo dispõe para manter-se nesse estado. Então, esse estado primitivo já não pode subsistir, e o gênero humano, se não mudasse de modo de vida, pereceria” (Contrato, p. 37 grifo meu). Conservar seus bens e a si mesmo seria o motivo racional para que os homens efetivassem o contrato social. Sua razão então seria: “Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens de cada associado com toda a força comum, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedece contudo a si mesmo, permanecendo assim tão livre quanto antes” (Contrato, p. 38). Isso implica na “alienação total de cada associado, com todos os seus direitos, à comunidade toda”. (Contrato, p. 39) O ato de cada um pôr em comum sua pessoa e todo o seu poder sob a direção suprema da vontade geral é vantajoso porque: 1) cada um dando-se completamente, a condição é igual para todos; e 2) sendo assim, ninguém se interessa por tornar essa condição onerosa para os demais. “Enfim, cada um dando-se a todos, não se dá a ninguém.” (Contrato, p. 39) O que cada indivíduo perde com o contrato social é a liberdade natural e a posse (efeito da força ou o direito do primeiro ocupante); por outro lado, ganha a liberdade civil e a propriedade de tudo o que possui. Qualquer que seja a forma pela qual se dê a aquisição de bens pelos indivíduos, o direito que cada um tem sobre seus bens está sempre subordinado ao direito que a comunidade tem sobre todos, sem o que o liame social não teria solidez, nem o exercício da soberania teria uma força verdadeira. Foi a oposição dos interesses particulares que exigiu o estabelecimento das sociedades. Mas foi o acordo desses mesmos interesses que possibilitou o contrato social, quer dizer, o nascimento das sociedades. O Estado é uma pessoa moral, que consiste na união de seus membros. Sua maior preocupação é com a conservação desses membros, para o que precisa dispor de uma força universal e compulsiva para mover e dispor cada parte de maneira mais conveniente a todos. “Assim como a natureza dá a cada homem poder absoluto sobre todos os seus membros, o pacto social dá ao corpo político um poder absoluto sobre todos os seus, e é esse mesmo poder que, dirigido pela vontade geral, ganha, como já disse, o nome de soberania” (Contrato, p. 54). Enquanto o filósofo celebra a vontade geral e a prevalência dos negócios públicos sobre os particulares, bem como estuda a gênese e a anatomia da desigualdade entre os homens (no segundo discurso e no Contrato social), em sua obra pedagógica Emílio, ele valoriza a educação típica da nobreza: não só seu aluno paradigmático é um jovem abastado e “de berço”, como, também, a relação pedagógica é a que une o preceptor ao discípulo. Em “Economia política”, verbete da Enciclopédia, publicada no mesmo ano do Discurso sobre a desigualdade (1755), Rousseau apresenta uma concepção social da educação bem distinta do individualismo que emana de Emílio. Naquele curto texto, a educação pública é a mais importante tarefa da economia política, entendida como administração pública. Ela é um dos princípios fundamentais do governo popular ou legítimo. Se é bom saber empregar os homens tais quais são, é muito melhor tornar quais se tem necessidade que sejam: a autoridade mais absoluta é aquela que penetra no íntimo do homem e que se exerce sobre a vontade tanto quanto sobre as ações. É certo que os povos, em grande parte, são aquilo que o governo os faz ser (“Economia”, p. 160). Mas formar cidadãos não é tarefa de um dia. Seria preciso educar os indivíduos ainda meninos. Eles deveriam ser exercitados a não levar em conta sua própria individualidade, a não ser em suas relações com o corpo
  • 10. 10 do Estado. Sua existência individual deveria ser percebida como parte da existência do Estado. A conseqüência esperada por Rousseau é que os jovens se identificassem com esse “todo maior”, que se sentissem membros da pátria e passassem a amá-la. Se as crianças fossem educadas em comum e em absoluta igualdade; se assimilassem as leis do Estado e os princípios da vontade geral; se fossem educadas para respeitar esses princípios acima de tudo; se fossem cercadas de exemplos e de coisas que lhes remetessem à “terna mãe que os nutre” e do amor que ela tem por todos, o filósofo acreditava que o sentimento fraternal seria compartilhado por todos. Como resultado, iriam querer apenas aquilo que a sociedade quisesse. A educação preconizada para as crianças deveria ser bem regulada, calcada mais nos deveres do que nos direitos. Desde o primeiro momento da vida é preciso começar a merecer a viver; uma vez que, nascendo, tornamo- nos participantes dos direitos dos cidadãos, o momento de nosso nascimento deve ser o início do exercício de nossos deveres. Se existem leis para a idade adulta, devem ser também para a infância: que ensinem a obedecer aos outros e, como não se deixar a razão de cada homem ser o único árbitro dos seus deveres, tanto menos se deve deixar às luzes e preconceitos dos pais a educação dos filhos, que concerne mais ao Estado que aos pais; de fato, e segundo o curso natural das coisas, a morte subtrai ao pai os últimos feitos da educação que começara, enquanto a pátria sente seus efeitos cedo ou tarde: o Estado permanece, a família se dissolve (“Economia”, p. 169). Rousseau não pretende diminuir o papel dos pais na educação das crianças com a posição proeminente atribuída ao Estado nessa matéria. Para ele, os pais nada mais fazem do que trocar de nome, já que, como cidadãos, têm em comum a mesma autoridade que exerciam sobre os filhos, separadamente, no âmbito familiar. A educação pública seria exercida por magistrados indicados pelo Estado, conforme regras por ele prescritas. A “magistratura educacional” deveria ser o prêmio do trabalho, o doce e honrado repouso da velhice, o ápice de todas as honras para aqueles que tenham assumido dignamente as outras funções públicas. No entendimento de Rousseau, apenas três povos antigos praticaram a instrução pública, no sentido assim definido: os cretenses, os lacedemônios e os persas, estes com o maior sucesso.2 Quando as nações se tornaram demasiado grandes para serem bem governadas, a educação pública já não foi mais utilizada. Além dessa razão, Rousseau alude a outras razões “que o leitor pode facilmente perceber”, responsáveis pela inexistência da educação pública em qualquer povo moderno. Suponho que o filósofo quisesse que o leitor da Enciclopédia pensasse na Igreja Católica, especialmente na Companhia de Jesus. Enquanto o filósofo celebra a vontade geral e a prevalência dos negócios públicos sobre os particulares no Contrato social, em sua obra especificamente pedagógica, Emílio, ele valoriza o individualismo mais extremado, a ponto de dizer que seria preciso optar entre formar o homem e fazer dele cidadão. Vejamos como essas idéias se articulam. Num alentado texto de mais de quinhentas páginas, Rousseau apresenta bem mais do que um tratado de pedagogia. Coerente com sua posição de que para bem educar é preciso dispor de toda uma visão do homem e da sociedade, ele inclui boa parte do Contrato social no Emílio. Vou apresentar um resumo do pensamento aí exposto, focalizando, especialmente, dois temas que me parecem centrais: o trabalho, a religião e a mulher. Embora o filósofo diga que escreveu essa obra motivado pela vontade de agradar “a uma boa mãe que sabe pensar”, seu alcance ultrapassa a destinatária, se é que realmente existiu. Para a concepção de homem e de sociedade de Rousseau, suas idéias teriam de resultar numa pedagogia. Para ele, tudo o que não temos ao nascer, e de que precisamos quando adultos, nos é dado pela educação. Ela provém da natureza, dos homens ou das coisas. O desenvolvimento interno de nossas faculdades e de nossos órgãos é a educação da natureza; o uso que nos ensinam a fazer desse desenvolvimento é a educação dos homens; e o ganho de nossa própria experiência sobre os objetos que nos afetam é a educação das coisas. Dessas três, a educação dos homens é a única que podemos realmente controlar e, mesmo assim, por suposição. Mas nem por isso Rousseau mostra apreço pela educação escolarizada. Apesar da estima que declarou ter por certos professores da Universidade de Paris, não via como “uma verdadeira instituição pública esses
  • 11. 11 estabelecimentos ridículos a quem chamam colégios” (Emílio, p. 14). Resta a educação doméstica, sobre a qual Rousseau vai concentrar sua atenção. A ela o filósofo dá uma especial importância: [...] a educação do homem começa com seu nascimento; antes de falar, antes de compreender, já ele se instrui. A experiência adianta-se às lições; no momento em que conhece sua ama, já muito ele adquiriu. Surpreenderiam-nos os conhecimentos do homem mais bronco, se seguíssemos seu progresso desde o momento em que nasceu até aquele a que chegou. Se se dividisse toda a ciência humana em duas partes, uma comum a todos os homens, outra peculiar aos sábios, esta seria muito pequena em comparação com a outra. Mas não pensamos quase as aquisições gerais, porque elas se fazem sem que nelas pensemos e até antes da idade da razão. De resto, o saber só se faz notar pelas diferenças e, como nas equações de álgebra, as quantidades comuns não contam (Emílio, p. 42). Para apresentar suas idéias pedagógicas, o filósofo construiu uma situação ideal que se assemelha à rigorosa construção do objeto de pesquisa nas Ciências Sociais. Na educação imaginada, o próprio filósofo seria o preceptor de um jovem nobre. Com esse artifício, ele não queria dizer como deveria ser a educação dos jovens nobres. Seu interesse estava com o homem em geral, vale dizer com a educação de uma criança que não ficasse restrita a sua condição social. Aliás, trata se de um ponto em que Rousseau foi incisivo ao defender uma educação que levasse em conta a possibilidade de mudanças sociais que pudessem levar a mudanças revolucionárias. Se o senhor tivesse de se tornar mendigo, que não levasse consigo os preconceitos de sua condição anterior; se um rico empobrecesse, que não persistisse no desprezo pelos pobres. Até mesmo o monarca pode tornar-se súdito. Logo, o melhor a fazer nesse tempo de tão profundas mudanças é educar não em função da condição imediata da criança, mas a prepará-la para viver em qualquer situação. Para isso seria preciso justamente atuar sobre o homem abstrato. Na ordem social, em que todos os lugares estão marcados, cada um deve ser educado para o seu. Se um indivíduo, formado para o seu, dele sai, para nada mais serve. A educação só é útil na medida em que sua carreira acorde com a vocação dos pais; em qualquer outro caso ela é nociva ao aluno, nem que seja apenas em virtude dos preconceitos que lhe dá. [...] Na ordem natural, sendo os homens todos iguais, sua vocação comum é o estado de homem, e quem quer seja bem educado para esse, não pode desempenhar-se mal dos que com esse se relacionam. Que se destine meu aluno à carreira militar, à eclesiástica ou à advocacia, pouco me importa. Antes da vocação dos pais, a natureza chamou-o para a vida humana. Viver é o ofício que lhe quero ensinar. Saindo de minhas mãos, ele não será, concordo, nem magistrado, nem soldado, nem padre; será primeiramente um homem. Tudo o que um homem deve ser, ele o saberá, se necessário, tão bem quanto quem quer que seja; e por mais que o destino o faça mudar de situação, ele estará sempre em primeiro lugar (Emílio, p. 15). A ocupação produtiva (“que pode outorgar a subsistência ao homem”) que mais se aproxima do estado natural é o trabalho artesanal. Para Rousseau, o artesão só depende de seu trabalho. Ele é tão livre quanto o lavrador é escravo, pois este está preso ao campo, cuja colheita está à mercê de outrem. O inimigo, o príncipe, um vizinho poderoso, um processo, podem tomar-lhe a terra. Por sua dependência, o lavrador pode ser humilhado de mil maneiras, o que não acontece com o artesão, pois diante de uma situação adversa, ele toma sua bagagem e seu braço e vai-se embora.4 Entretanto, a agricultura é o primeiro ofício do homem: o mais honesto, o mais útil e por conseguinte o mais nobre que se possa exercer. Emílio aprenderá a agricultura mas não irá praticá-la. Vai aprender e praticar um ofício artesanal — e isso é para Rousseau questão fechada. Trata-se menos de aprender um ofício, para saber um ofício, do que para vencer os preconceitos que o desprezam. Nunca sereis forçado a trabalhar para viver. Tanto pior. Mas pouco importa; não trabalheis por necessidade, trabalhai por prazer. Abaixai-vos à condição de artesão para que fiqueis acima da vossa. Para dominar a sorte e as coisas, começai tornandovos independente. Para reinar pela opinião começai reinando sobre ela (Emílio, p. 215). O ofício que ele gostaria que seu discípulo aprendesse é o de marceneiro: é limpo e útil, pode ser exercido em casa, mantém o corpo em atividade, exige do artesão engenho, habilidade, elegância e gosto. Ademais, se Emílio viesse a se dedicar às “ciências especulativas”, ele poderia empregar o que aprendeu para fazer instrumentos como lunetas, telescópios etc. Se o pedagogo mostrou a preferência pela marcenaria, não deixou de evidenciar seu desprezo por outros ofícios artesanais, pelo automatismo que neles via ou pela força que exigiam:
  • 12. 12 [...] não gostaria dessas profissões estúpidas em que os operários, sem engenho e quase autômatos, só exercitam suas mãos no mesmo trabalho; os tecelões, os fazedores de meias, os canteiros: que adianta empregar nesses ofícios homens de bom senso? É uma máquina que conduz outra (Emílio, p. 222). 1.2 Bonald: a educação do homem social Louis de Bonald (1754-1840) era visconde, oficial dos mosqueteiros do rei e prefeito (maire) de Millau, na França, sua cidade natal, quando eclodiu a Revolução. e início ele foi favorável às idéias revolucionárias, mas reformulou sua posição logo após a Constituição Civil do Clero (1791). Depois de seis anos de exílio na Alemanha (Constança e Heidelberg), retornou à França. Napoleão, que apreciou seu livro Théorie du pouvoir politique ET religieux (1796), nomeou-o conselheiro titular da Universidade da França (1810), mas ele se recusou a assumir encargos docentes. Com o fim do poder de Napoleão e a restauração da monarquia (1814), foi deputado 1815- 1823), ministro de Estado de Luís XVIII, diretor da censura de Carlos X e par e França. Foi eleito para a Academia Francesa (de Letras). Seu pensamento político e social foi sintetizado na Démonstration philosophique du príncipe constitutif de La societé (1830). Ao contrário do que queriam os iluministas, o homem é, para Bonald indissociável da sociedade principalmente da sociedade religiosa. Deus governa os homens por meios humanos, por isso é que se fez homem para regenerar as sociedades humanas. “Os olhos maldosos do ódio só se fixaram num canto do quadro, eles só viram o particular, o homem; eu só vi o geral, a sociedade. Eles acreditaram que o homem fez a sociedade, mas eu creio que que a sociedade faz o homem [...]” (Démonstration, p. 444). Nessa completa inversão da concepção rousseauniana da relação indivíduo- sociedade, Bonald tem o conceito de sociedade como central em seu pensamento: “A sociedade é a reunião de seres semelhantes para sua produção e sua conservação mútuas, e de seus elementos naturais e constitutivos” (Démonstration, p. 440). Essa definição se aplica tanto à sociedade em geral como às diferentes espécies de sociedades particulares — doméstica, civil e religiosa —, assim como às suas combinações. Elas se distinguem das associações (como as empresariais), que são obras humanas, e podem ser dissolvidas à vontade. Bonald foi procurar na religião a constituição natural e geral da sociedade. A definição de religião do filósofo é a seguinte: “[...] uma consciência mais ou menos distinta e razoável de um ser invisível e todo poderoso, criador dos seres subordinados, a quem o homem atribui os bens e os males da vida, e do qual ele se esforça por merecer os benefícios ou de aplacar a ira” (Démonstration, p. 501). O homem não encontra em si mesmo e em sua razão individual o fundamento das crenças religiosas, sejam elas quais forem. Elas só podem ser encontradas na sociedade. O filósofo se pergunta, encaminhando a resposta positiva, se a facilidade com que o cristianismo havia se propagado na Antigüidade pelos povos pagãos e, no seu tempo, pelos “povos selvagens”, não poderia ser resultado (independentemente das obras sobrenaturais que acompanhavam sua presença) de alguma coisa que se agregasse aos pensamentos, aos sentimentos do homem social, mesmo sem o seu conhecimento, para os esclarecer e dirigir. Seria uma espécie de assimilação, da mesma forma como se dá com as substâncias alimentares que ingerimos, que nutrem nossos corpos, sem que conheçamos sua natureza e sua relação conosco, sem saber como elas agem em nosso organismo e se convertem em nosos diferentes humores. Uma vez que a idéia da divindade entrou no mundo (pela revelação, de alguma maneira), ela se diversificou ao infinito, fosse pelo desenvolvimento que os homens lhe deram, fosse pelas alterações que lhe impuseram. De todo modo, transmitida pela língua, de geração a geração, ela não sai jamais da sociedade. Embora Bonald chame a sociedade religiosa de “mãe de todas as sociedades”, é na família que ele vai encontrar o modelo comum a todas as sociedades. O gênero humano começou por uma família e continua constituído por famílias. Cada família tem três elementos — pai, mãe, filho. Ao contrário dos animais, que nascem perfeitos, o homem, além de produzir, tem de conservar sua prole. O homem nasce apenas perfectível, e tem de tudo receber da sociedade.
  • 13. 13 A cada um dos elementos da sociedade doméstica corresponde uma pessoa social. Ao pai, à mãe e ao filho correspondem o poder, o ministro e o súdito. O pai age tanto para a produção quanto para a conservação. E o faz pelo ministério da mãe, que concorre para a realização da vontade e da ação do poder. O filho, submetido a essa vontade e a essa ação, é o produto de um e de outro, no que diz respeito à produção e à conservação. Se o pai é poder, a mãe é autoridade, pois necessita ser autorizada pelo esposo. A sociedade política, também chamada de Estado ou governo, é uma sociedade de produção e conservação de famílias. O poder público não foi resultado de um contrato nem de uma imposição. Ele foi necessário, conforme a natureza da vida dos seres humanos em sociedade. As causas e a origem do poder público foram todas naturais. Os homens foram unidos para enfrentar um perigo comum diante de inimigos poderosos ou de animais. Além desse inimigo externo, existiu, também a necessidade de reprimir um inimigo interno que, movido pelas paixões, ameaçava a tranqüilidade da cidade e o repouso das famílias. Por uma razão, por outra ou por ambas, a criação do poder público se deu mediante a iniciativa de um homem forte. Em conseqüência, foi o poder que distinguiu e classificou as demais pessoas sociais, conforme procedimentos que não nos permitem encontrar o mais leve traço de soberania popular. As funções essenciais do poder são julgar e combater. As dos ministros, o conselho e o serviço para secundar sua ação. Como na sociedade política tudo é feito para a utilidade dos súditos, eles não têm propriamente nada a fazer. Os súditos só têm poder e funções na sociedade doméstica. O poder público só pode ser independente (com relação aos súditos) se for proprietário da terra, pois toda outra riqueza, imobiliária ou comercial, depende dos homens e de seus eventos. Em suma, a família torna-se povo e a religião, de doméstica, torna-se pública. Na sociedade civil como na sociedade religiosa, Bonald vê sempre poderes que comandam, súditos que obedecem e, entre eles, com diversos nomes, ministros, meios ou intermediários, que, submetidos ao poder, recebem deste para transmitir aqueles. Esta hierarquia de pessoas e de funções forma a “constituição natural de toda a sociedade”, também chamada de “sistema eterno da sociedade”. Na monarquia real, as três sociedades que compõem o “edifício social” são a sociedade religiosa (o clero), a sociedade política (a nobreza) e a sociedade doméstica (o terceiro estado). Essas três ordens representam as três coisas que constituem toda sociedade: as luzes, a propriedade e o trabalho. Elas integram os Estados Gerais. Na Teoria da educação social, Bonald trata de várias questões além da educação propriamente dita. Aos capítulos sobre a educação doméstica, dos colégios, dos alunos, ele acrescenta outros sobre a administração geral, a nobreza, o exército, os costumes, as letras, a filantropia pública, as finanças, 1.2.1 Sociedade, Estado e Educação. O que dá unidade a todo esse conjunto, justificando o título da obra, é a preocupação geral com a constituição da sociedade. Na sociedade conturbada de seu tempo, sacudida por revoluções, cumpria dirigi-la para o caminho natural de onde havia sido desviada. Assim, a educação social no pensamento de Bonald pode ser entendida em dois sentidos bem articulados: a educação dos jovens para que exerçam uma “profissão social” e a educação dos adultos no sentido de conservar a sociedade. Três tipos de pessoas estão na sociedade mais do que são dela. Pertencem mais à sociedade natural do que à sociedade política; pertencem mais às suas famílias do que ao Estado. São as crianças, as mulheres e o povo, que correspondem, respectivamente, à fraqueza da idade, do sexo e da condição social. Essas pessoas mantêm com a sociedade uma relação assimétrica: a sociedade deve protegê-las, mas elas não são feitas para proteger a sociedade. O povo, isto é, os que exercem profissões puramente mecânicas e contínuas, permanecem no estado habitual da infância, são apenas coração e sentimento. Seu espírito não pode se aplicar suficientemente sobre os objetos dos conhecimentos humanos, a ponto de ser possível e útil dar-lhes esses conhecimentos. A razão do povo deve ser seu sentimento. Portanto, é seu coração que deve ser dirigido e formado, não seu espírito. No entanto, nessa classe encontram-se pessoas que a natureza eleva acima de sua esfera, que ela destina ao exercício de alguma profissão útil à sociedade. Para que essas pessoas possam cumprir seu destino, a sociedade lhes dá os primeiros elementos dos conhecimentos, que nem a natureza nem a razão podem suprir. Esse
  • 14. 14 é o objetivo das pequenas escolas situadas nas cidades e vilas, onde se ensina a ler, a escrever, os princípios da religião e da aritmética. Bonald diz que um erro muito comum nos que muito leram, pouco meditaram e menos ainda observaram é acreditarem na existência de talentos latentes na maioria das pessoas. Os philosophes (os iluministas?) crêem também na existência de espíritos que eles não vêem. Nesse sentido, muitos autores que escreveram sobre a educação pública tiveram essa quimera na mente. E, por quererem desenvolver os talentos escondidos, eles não cultivaram ou não formaram as disposições conhecidas e comuns a todos os homens. Eles só observaram o povo de suas janelas e só o estudaram nos livros. Saber ler e escrever não é mesmo necessário à felicidade física ou moral do povo ou aos seus interesses. A sociedade dá ao povo uma garantia mais eficaz contra a trapaça e a má-fé. O que todo o povo precisa é da religião, dos costumes e de uma honesta comodidade. Ele precisa do sentimento para manter a religião; de bons exemplos e das leis executadas para manter os costumes; e de trabalho para manter a comodidade. Para Bonald, o homem é espírito, coração e sentimento, mas suas faculdades só se desenvolvem uma depois da outra. A criança só tem sentimento, depois o coração se revela. Ambos devem ser objeto da educação doméstica, que se destina ao homem natural. Mais tarde, propiciado pelos conhecimentos elementares fornecidos pela educação doméstica, o espírito se desenvolve. Agora começa o homem social, cujo espírito é dado pela sociedade. Ele tem vontades e opiniões, que é preciso regular e guiar. O objeto da educação social é, então, orientar para seu uso todas as faculdades do homem; ela tem o direito de formar para a utilidade geral todas as suas faculdades: a faculdade de querer, de amar, de agir — seu espírito, seu coração e seu sentimento. Há na sociedade profissões que são necessárias à conservação da sociedade natural, e outras, necessárias à conservação da sociedade política. Assim, há famílias políticas ou sociais e famílias naturais. Se as primeiras não tiverem os meios para dar a suas crianças uma educação social, a sociedade, em seu próprio interesse, deve vir em sua ajuda. Bonald examina a objeção de que se o Estado está obrigado a educar as crianças das famílias sociais que não dispuserem dos meios de fazê-lo por si mesmas, disso resultaria desigualdade entre os diversos membros da sociedade. Para contestar essa objeção, ele recorre à explicação sobre as diferenças entre os homens. Para conhecer aqueles que trabalham mais e melhor (obrigação que a natureza impõe a todos os homens), que cumprem melhor seu dever, há um método infalível, público, isento de toda contestação: é pela sua fortuna. Aquele que enriquece é, portanto aquele que trabalha mais e que trabalha melhor, que cumpre mais perfeitamente com seus deveres naturais, que apresenta a melhor garantia de sua aptidão em preencher os deveres políticos, que merece ser distinguido e sua família, ser enobrecida (Théorie, pp. 247-248). Assim, o homem que enriquece e enobrece sua família pela compra de cargos nada mais faz do que provar à sociedade que ele merece que sua família seja admitida a cumprir com os deveres políticos, pela sua aplicação e sua aptidão no cumprimento dos deveres naturais. Bonald nem mesmo aceita a objeção de que possa haver meios desonestos de enriquecimento numa sociedade constituída. Não se poderia admitir que o enobrecimento proviesse apenas dos serviços distinguidos prestados à sociedade, senão apenas duas famílias por século seriam admitidas à nobreza, enquanto que as necessidades da sociedade exigem um número um pouco maior. Bonald defende que deverão ser admitidos nos colégios (no ensino secundário) os filhos de todas as famílias que devam ou que possam lhes dar a educação social ou pública. Toda família que não exerce uma profissão social, mas que deseja dar a suas crianças uma educação social (ou pública), demonstra que tem a intenção de torná-las úteis à sociedade, e pode se elevar ao nível das famílias sociais ou distinguidas. A sociedade não pode pagar a educação dessas crianças porque ignora se elas vão querer ou se vão poder abraçar uma profissão social ou se sua família terá as qualidades necessárias para se elevar ao nível de uma família social. Mas deve admiti-las nos estabelecimentos públicos e, assim, facilitar-lhes os meios de serem úteis. Assim, a sociedade deverá admitir em seus estabelecimentos de educação pública todas as
  • 15. 15 crianças sãs de corpo e de espírito, cujas famílias tenham a intenção e os meios de lhes dar a educação social. Só não poderá assumir os encargos financeiros desses estabelecimentos. É preciso que os pais sejam persuadidos de que a educação social não tem por objetivo tornar os jovens mais sábios, mas, sim, torná-los bons e próprios para receber a educação particular da profissão à qual estão destinados, e que eles estão no colégio menos para se instruírem do que para se ocuparem (Théorie, p. 249-250). 1.3 Saint-Simon: a educação do homem industrial Claude-Henri de Rouvroy, conde de Saint-Simon (1760-1825), desde muito jovem mostrou inconformidade com as condições sociais, buscando mudanças em seu modo de vida pessoal. Participou como capitão do corpo expedicionário francês na luta dos colonos da América contra a dominação britânica. Conheceu, então, uma sociedade bem diferente da sua. Deparou com um modo de vida onde o comércio e a indústria eram atividades muito valorizadas livres dos entraves feudais que persistiam na França. De volta a seu país, apoiou a Revolução, abriu mão de seu título nobiliárquico, mas não desempenhou nenhum papel ativo, por julgar que as pessoas de origem aristocrática deveriam aguardar o desfecho das disputas políticas. Enquanto o processo revolucionário se estabilizava, Saint-Simon dissipou sua fortuna na promoção de uma convivência mundana com intelectuais e artistas, aproveitando para se instruir. Freqüentou cursos na Escola Politécnica e na Escola de Medicina, onde a interação com os professores propiciou-lhe a participação em diversas experiências. Foi só após 1805, completamente arruinado financeiramente, que ele veio a escrever a quase totalidade de sua obra, valendo-se do amparo de amigos no governo. Além de ser um protagonista político, Saint- Simon extraiu das lutas de que participou elementos para a construção de uma verdadeira matriz teórica, unindo teoria e prática política de um modo original. Criador do positivismo como filosofia, desenvolveu incansável atividade panfletária contra os “ociosos” e em prol dos industriais, os únicos que poderiam assessorar o rei na direção dos negócios públicos, de preferência exercendo eles o poder diretamente. A ciência foi anunciada como a substituta da religião, depois sua parceira na condução da humanidade em direção à harmonia e ao bem comum. Como um dos pioneiros do socialismo enquanto doutrina social, insistiu na distinção entre sociedade e Estado, condição para se empreender uma organização social e até um governo da sociedade sem poder estatal, no sentido político do termo; na igualdade entre os homens em cooperação, em lugar da exploração do homem pelo homem; no fim do direito de herança; na contribuição de cada um segundo suas capacidades e na retribuição a cada um conforme suas necessidades individuais. Como os filósofos do Iluminismo, ele confiava no poder da razão para transformar o mundo, recusando-se a aceitá-lo como estava, adotando uma posição internacionalista e otimista quanto ao futuro da humanidade. Afastava-se deles na avaliação da Idade Média, não aceitando seu julgamento de que teria sido uma época dominada pela superstição e pela ignorância. Não escondia sua admiração pela sociedade feudal, no que tinha de força coesiva representada pelo clero, e a religião como idéia dominante, propiciando a unidade de toda a Europa, tendo no papa a direção intelectual. Mas ao contrário dos românticos, não aceitava que a Idade Média européia pudesse ser o modelo do mundo novo, pois a ciência e a indústria, desde que estas apareceram na sociedade feudal, determinaram a sua morte e se converteram nos princípios essenciais de uma nova sociedade. Saint-Simon insistiu em mostrar a existência, na França pós-revolucionária, de uma contradição entre o progresso constante da indústria e as idéias comuns dos industriais. As idéias dominantes do feudalismo persistiam, impedindo os industriais de desenvolverem todas as suas possibilidades objetivas. Eles continuaram pensando como discípulos dos “metafísicos” (principalmente os iluministas), com aspirações à nobreza, não desenvolvendo uma consciência dos interesses de sua classe, prolongando, assim, sua posição subalterna. O lugar ocupado pela burguesia deveria ter sido preenchido por um poder espiritual intermediário, já que os homens não podem passar de uma só vez e inteiramente de uma doutrina a outra. O único papel desse poder espiritual passageiro seria o de operar a transição de um sistema para outro, que, plenamente em funcionamento, o dispensaria.
  • 16. 16 Esse poder espiritual não seria o do clero atual, que tinha se tornado “um encargo sem benefício para a última classe da sociedade”, já que todas as suas prédicas se destinavam a levar os pobres à obediência passiva dos ricos e dos privilegiados, os quais, por sua vez, deveriam obedecer cegamente, primeiro ao papa, depois ao rei. Mas, se o clero estava ultrapassado, o mesmo não acontecia com o Cristianismo, doutrina de grande atualidade na sociedade industrial. Em De l’organisation sociale, Saint-Simon dizia que o poder espiritual ou científico deveria ser institucionalizado em duas academias separadas. A Academia de Ciências definiria um código de interesses, enquanto que a Academia de Belas Artes trataria de um código de sentimentos. Elas atuariam conjuntamente no estabelecimento de uma doutrina relativa à instrução pública. Embora a religião e o clero tivessem perdido o lugar que ocupavam na sociedade feudal, a sociedade industrial plenamente constituída necessitaria de seu equivalente funcional. O pensamento científico substituiria o dogma religioso e os cientistas ocupariam o lugar do clero. Mas a ciência não poderia ser apreendida da mesma maneira por todos os indivíduos. Para os que fossem intelectualmente menos capazes, a verdade científica seria difundida mediante rituais, cultos e processos místicos. A elite educada, ao contrário, apreenderia a ciência diretamente. Assim, uma nova força coesiva se desenvolveria, garantindo a unidade da sociedade. Aí está o lugar do pensador social como protagonista na difusão das novas formas de pensamento: a difusão de uma ética baseada no pensamento positivo. Para se concluir o processo da Revolução, seria preciso acabar com o poder dos ociosos e transferi-lo aos industriais. Saint-Simon dizia que todos os cidadãos dedicados a ocupações úteis desejavam que os agricultores, negociantes e fabricantes de mais sucesso fossem os dirigentes dos negócios públicos, pelo menos da elaboração do orçamento.Isso porque eles eram tidos como os mais interessados no aperfeiçoamento da moral pública e privada, bem como no impedimento das desordens. Eles sentiriam mais do que ninguém a utilidade das ciências positivas e os serviços que as belas artes poderiam prestar à sociedade. Além do mais, os industriais de sucesso já teriam provado ser os mais capazes em seus negócios particulares, razão pela qual se poderia esperar que fizessem o mesmo nos negócios públicos. Para mostrar a indispensabilidade dos industriais, Saint-Simon convidava o leitor de uma de suas cartas ao rei, incluída em Du système industriel, a fazer uma suposição. Se a França perdesse de repente três mil cidadãos pertencentes aos diversos ramos das ciências, das belas artes e da agricultura, da manufatura e do comércio, “ela se tornaria um corpo sem alma”, em situação de inferioridade diante da nação rival. Se, ao contrário, ela conservasse seus “homens de gênio” e perdesse trinta mil personagens consideradas as mais importantes dentre os funcionários públicos, os militares, os legisladores, os clérigos, os proprietários ociosos, não resultaria disso nenhum mal político para o Estado, e a nação conservaria sua posição elevada entre os povos civilizados. Refinando sua análise, Saint-Simon distingue dentre os industriais, no sentido estrito, os proprietários dos não-proprietários, a quem chama de proletários ou de classe proletária. Reconhece a existência de conflitos entre eles, bem como entre os dirigentes e os executores, entre os “chefes de trabalhos industriais” e os proletários, entre estes e os especialistas. Em certas passagens, onde enfatiza a oposição entre os industriais, a burguesia e os ociosos, ele sugere que os conflitos entre aquelas classes seriam espontaneamente resolvidos mediante conciliação. Já em outras passagens, reconhece que o egoísmo desmedido dos ricos e a rebeldia dos pobres teriam efeitos desorganizadores que comprometeriam a própria unidade social. Ele entendia a sociedade como um corpo social, no qual as diversas partes contribuem, cada uma a seu modo, para a vida em comum. Nas suas palavras, “mais do que um aglomerado de seres vivos, a sociedade é sobretudo uma verdadeira máquina organizada na qual todas as partes contribuem de uma maneira diferente para o funcionamento do conjunto” (“De la physiologie sociale”, Oeuvres, tomo V, p 177, grifo meu). No sistema positivo de pensamento, característico da etapa científica, todo o universo humano substituiria a idéia de uma regulação divina pela da gravitação, como Newton havia estabelecido como hipótese para os corpos celestes. Com os arranjos convenientes, o princípio da gravitação viria a tomar o lugar, com idéias claras e precisas, de todos os princípios que a teologia ensinava até então 6 A indústria, depois de ter sido a causa da evolução (que levou à Revolução), vai tornar-se o próprio fim da vida social, penetrando todas as atividades, impondo-lhes suas características, inclusive na política. O governo
  • 17. 17 militarizado do feudalismo estava orientado para a ação sobre os homens, por isso era hierarquizado. Já a indústria tem por fim agir sobre a natureza, sobre as coisas, por isso o governo que lhe corresponde estará orientado para a organização. A indústria opera uma nova socialização dos indivíduos, criando um tipo radicalmente novo de solidariedade: é o trabalho que se torna o princípio de coesão e de integração social. Essa é a igualdade própria da sociedade industrial, onde não existem privilegiados por razão de nascimento nesta ou naquela família. A plena realização do industrialismo como modo de vida implicaria o desaparecimento dos ociosos, com o triunfo dos industriais, vindo o trabalho a ser o princípio organizativo de toda a sociedade. Assim, tendendo a tornar- se a única classe da sociedade, os industriais (com suas diferenciações) forneceriam a base social para o princípio da igualdade com diferenciação de funções. O sistema industrial estaria, então, baseado no princípio da igualdade perfeita, opondo-se aos direitos de nascimento e a todo tipo de privilégio. Na linha de Rousseau, Saint-Simon considera que a educação (no sentido lato) é mais importante do que a instrução propriamente dita, tendo em vista o bem-estar social. É aquela que forma os costumes, que desenvolve os sentimentos e amplia a capacidade de previsão. Para os proletários, particularmente, a educação é muito mais importante do que a instrução, haja vista a capacidade que o filósofo reconhece nesta classe de exercer a administração das empresas. Isso não quer dizer que Saint-Simon condene o proletariado à educação espontânea. Ao contrário, ele reconhece que essa classe tem mostrado disposição de se instruir, quando encontra condições para isso, apesar de os filhos dos ricos, notadamente dos ociosos, terem mais tempo e recursos para se dedicarem aos estudos. Para o filósofo, a instrução deveria ficar sob a responsabilidade do poder espiritual, devendo dela ser retirada o conteúdo inerente à cultura dos ociosos, em especial as línguas clássicas e os autores gregos e latinos. As ciências positivas é que deveriam ocupar o lugar deixado vago, especialmente a matemática, a física, a química e a história natural. Detalhando seu propósito de renovar a mentalidade dos industriais, Saint-Simon sugeriu a Napoleão (quando este retomou o poder em 1815) que instituísse cátedras públicas de política. Em 1825, no Catecismo dos industriais, propôs a criação de três cátedras para o ensino dos principais elementos da ciência social: uma cátedra de direção política e industrial; outra, de moral; e outra, de pesquisa científica. Em 1816, num opúsculo enviado à assembléia geral da Sociedade de Instrução Primária, entidade privada destinada à promoção da instrução popular, notadamente mediante o ensino mútuo, Saint-Simon sugere a adoção de medidas insólitas para sua época. Embora considerasse preferível e mais fácil a educação das crianças da classe média do que da “última classe da sociedade”, ele recomendou a atração dos filhos das famílias ricas para estudarem junto aos pobres; o prolongamento dos estudos dos “societários” até a escola secundária; e a adaptação do currículo da escola primária às necessidades da indústria. Lamentavelmente, pouco mais se sabe a respeito da feição que assumiria a educação, especificamente a instrução, na sociedade industrial preconizada por Saint-Simon. Quatro décadas depois de sua morte, Júlio Verne escreveu (em 1863) um romance de antecipação (ficção científica), inédito até 1994, denominado Paris no século XX, onde projetou para a década de 1960 os processos que considerava em curso na sociedade francesa de seu tempo, assim como a educação. Nessa projeção, a presença do positivismo de Saint-Simon pode ser facilmente reconhecida na rejeitada caricatura do futuro parisiense. Chama a atenção o fato de o romancista ter imaginado como seria a educação coerente com o industrialismo pregado pelo filósofo, a que ele próprio não havia dado tal importância. Júlio Verne apresenta nesse romance uma visão profundamente pessimista do progresso. As maravilhas tecnológicas não teriam resultado, um século após, na melhoria da vida humana. A educação, particularmente, levou ao amesquinhamento das pessoas, formadas exclusivamente para o trabalho lucrativo na indústria e no comércio. Assim, focalizar a imagem “industrialista” da educação, em Júlio Verne, é uma espécie de mirada no negativo da imagem que dela teria Saint-Simon, pelo menos pela ótica de seu lado positivista mais extremado. Passemos, então, à Paris do futuro. O livro começa focalizando a distribuição dos prêmios anuais da Sociedade Geral de Crédito Instrucional, que “correspondia perfeitamente às tendências industriais do século XX”. Os capitais liberados pela estatização das ferrovias foram empregados numa empresa com fins educacionais. O que
  • 18. 18 não teria nada de espantoso. “Ora, para um empresário, construir ou instruir é tudo a mesma coisa, visto que, para falar a verdade, a instrução não passa de um tipo de construção, um pouco menos sólida” (Paris, pp. 32-33). Em 1937, durante o reinado de Napoleão V (Júlio Verne escrevera durante Napoleão III), o barão de Vercampin, um bem-sucedido homem de negócios, obtivera autorização do Estado para fundir os liceus públicos e privados numa única instituição, que cobria a França inteira, mantida por uma sociedade anônima, aprovada por decreto imperial. No conselho administrativo estavam um diretor de ferrovias, um banqueiro, um senador, um deputado, um coronel da polícia e o diretor geral do estabelecimento de ensino. “Como se vê, nenhum nome de sábio ou professor no Conselho Administrativo. Era mais tranqüilizador para a instituição comercial” (Paris, p. 34). Um inspetor do governo acompanhava as operações da companhia e as relatava ao ministro competente. O autor nada diz sobre o ensino superior, a não ser que a Escola Politécnica havia sido “supressa” em 1889. Nem sobre o ensino primário. Foi o ensino secundário que mereceu sua atenção. Nos cerca de 150 mil alunos da companhia, cuja idade e currículo leva a crer serem do ensino secundário, “a ciência era incutida por meios mecânicos” (Paris, p. 34). As letras e as línguas mortas, como o latim e o grego, foram relegadas a um segundo plano, com tendência à extinção. As línguas vivas, com a exceção do francês, eram muito cultivadas, com objetivos comerciais, especialmente depois da conquista francesa da Cochinchina (Indochina). A Sociedade tinha construído uma verdadeira “cidade instrucional” no Campo de Marte, onde cabiam milhares de estudantes e mestres. Sintomaticamente no mesmo lugar onde a federação havia sido aclamada pela massa revolucionária, 150 anos antes. Os negócios iam muito bem: o lucro do exercício de 1960 já superava o preço de emissão das ações. Os estudantes premiados foram sendo chamados para ouvirem seus feitos celebrados na matemática e nas ciências. Mas, quando foi chamado Michel Dufrénoy, primeiro prêmio em versos latinos, a gozação do público foi geral, pelo desprezo que se tinha por essa “disciplina” remanescente. O incrível foi o prêmio que o herói do livro (homônimo do filho de Júlio Verne) ganhara: o Manual do bom fabricante, que ele jogou no chão. Michel vivia numa “família eminentemente prática” (título de um capítulo do livro). Órfão, foi criado pelos tios. O Sr. Stanilas Boutardin era o produto natural daquele século de indústrias; desenvolvera-se numa estufa quente, em lugar de crescer em plena natureza; homem eminentemente prático, nada fazia que não fosse útil, conformando suas menores idéias ao útil, com um desejo incontido de ser útil que ia dar num egoísmo verdadeiramente ideal; unindo o útil ao desagradável, como teria dito Horácio; sua vaidade transparecia em suas palavras, mais ainda que em seus gestos, e ele não teria permitido que sua própria sombra o precedesse; exprimia- se por gramas e centímetros e andava com uma bengala métrica fosse qual fosse o clima, o que lhe dava um grande conhecimento das coisas deste mundo; desprezava solenemente as artes, principalmente os artistas, para dar a entender que os conhecia; para ele, a pintura não ia além da água forte, o desenho da cópia, a escultura da fôrma, a música do apito das locomotivas, a literatura dos boletins da Bolsa (Paris, p. 53). O tio de Michel, banqueiro e industrial, crescera cercado pela mecânica, por isso explicava sua vida pelas engrenagens ou transmissões. Movia-se regularmente com o mínimo de atrito possível, como um pistão num cilindro perfeitamente calibrado. Transmitia seu movimento uniforme à mulher, ao filho, aos empregados, aos criados de casa, todos eles verdadeiras máquinas-ferramentas de que ele, o grande motor, tirava o melhor partido possível. Era um mau-caráter, incapaz de um bom ou de um mau movimento. Fizera uma imensa fortuna, animado pelo “elã do século”. Mostrava-se reconhecido para com a indústria, que adorava como se fosse uma deusa.7 Sua mulher, a tia de Michel, era, por sua vez,“uma verdadeira administradora, bem uma fêmea de administrador” (Paris, p. 55). A história é da desventura de Michel em tentar ser “um homem prático”, exigência do tio que o queria empregado em seu banco. E sua tentativa frustrada de ser um literato numa sociedade onde o primeiro dever do
  • 19. 19 homem era ganhar dinheiro. Para os poetas, restava a única oportunidade de celebrar em seus versos as maravilhas da indústria. A língua francesa estava recheada de palavras inglesas. Os inventores, os comerciantes de cavalos e os vendedores de carros foram buscar na língua inglesa as palavras de que precisavam para valorizar seus produtos.8 Na Sociedade, as cátedras de letras seriam extintas em 1962, em decorrência de uma decisão tomada em assembléia geral dos acionistas. Dizia o desconsolado professor de retórica: “Quem quer saber de gregos e latinos, que só servem, no máximo, para fornecer uma ou outra raiz para as palavras da ciência moderna!” (Paris, p. 132). Mas não só os literatos eram uma espécie em extinção. A carreira de soldado foi extinta porque não havia mais exércitos nem guerras. No século anterior (o XIX), o desenvolvimento das máquinas de guerra havia atingido tal ponto que o desarmamento foi o desfecho inevitável. As nações européias suprimiram o Estado militar e, com ele, o espírito de luta. Antecipando o equilíbrio bélico da guerra fria da década de 1960, Júlio Verne dizia que “efetivamente, as máquinas mataram a bravura e os soldados transformaram-se em mecânicos” (Paris, p. 138). O industrialismo teria imprimido sua marca na sociedade tão fortemente (como vaticinava Saint- Simon, o filósofo positivista) que até mesmo as mulheres mudaram seu modo de ser — acabarão sendo substituídas por máquinas de ar comprimido. Já era possível ver como as mulheres entraram em decadência fisiológica. O diagnóstico do pianista Quinsonas, marginal como Michel, é bem depressivo, mostrando a adaptação da mulher ao industrialismo e ao americanismo, seu modo de vida correspondente: A atitude envolvente da parisiense, seu porte gracioso, seu olhar vivo e terno, seu amável sorriso, sua carnadura ao mesmo tempo adequada e firme, em pouco tempo deram lugar a formas longas, magras, áridas, descarnadas, emaciadas, depauperadas, de uma desenvoltura mecânica, metódica e puritana. A cintura perdeu a curva, o olhar ficou austero, as juntas enrijeceram; um nariz duro e rígido inclinou-se sobre os lábios finos e chupados; o passo espichou; o anjo da geometria, antigamente tão pródigo no fornecimento de suas curvas mais atraentes, entregou a mulher a todo o rigor da linha reta e dos ângulos agudos. A francesa virou americana; fala gravemente dos negócios graves, encara a vida com rigidez, cavalga sobre o lombo magro dos costumes, veste-se mal, sem gosto, e enverga coletes de tecido galvanizado, capazes de resistir às pressões mais intensas. Meu filho, a França perdeu sua verdadeira superioridade; suas mulheres, no delicioso século de Luiz XV, haviam afeminado os homens; de lá para cá passaram para o gênero masculino e já não valem o olhar de um artista nem a atenção de um amante! (Paris, p. 144-145). Ao contrário de Saint-Simon, o filósofo positivista, Verne imaginava o aumento do poder do Estado. Apesar da industrialização acionada pelos empresários privados, ele via a França dos próximos cem anos marcada pela centralização estatal, movida por dez milhões de funcionários públicos. A propósito, alguém disse a Michel sobre a possibilidade de arranjar um emprego público: “sempre é tempo de se funcionarizar”. Como as ferrovias, os teatros haviam passado para o controle do governo. Depois que Michel demonstrou sua incapacidade para o trabalho no banco do tio, de onde fugira após provocar grande prejuízo, seus amigos, marginais como ele, mas com relações vantajosas, arranjaram-lhe um emprego no Grande Armazém Dramático. Apesar da boa vontade do diretor, ele fracassou em todas as tarefas que lhe foram atribuídas na máquina burocrática do entretenimento oficial. Deserdado pelo tio banqueiro, incapaz de se adaptar no emprego público, a miséria chegou em pleno inverno rigoroso. Perdeu contato com os amigos, marginais como ele, perdeu-se da amada e acabou morrendo de fome e frio. Morto pela sociedade industrializada, que não admitia um poeta como ele, do mesmo modo que condenava os artistas. 1.3.1 À guisa de comparação Pelo exposto, podemos ver que os três pensadores focalizados — Rousseau, Bonald e Saint-Simon — entendem diferentemente as relações entre sociedade, Estado e educação.
  • 20. 20 Para o Rousseau da Enciclopédia, educação pública é sinônimo de educação estatal, e seus destinatários são todas as crianças nascidas na sociedade, em especial na república. Já no Emílio, o filósofo nem ao menos trata a educação pública como tema a ser considerado, pois sua preocupação é a educação de um indivíduo abastado e “de berço”. Para Bonald, há uma educação pública sinônima de educação estatal, pelo menos no tocante ao ensino secundário, cujos destinatários são apenas os jovens oriundos das “famílias sociais”, isto é, da nobreza, aos quais se juntariam os filhos das famílias burguesas que desejassem investir no ingresso nesse estamento. Além do mais, o texto do filósofo reconhece a existência de escolas primárias nas cidades e nas vilas, destinadas a crianças das “famílias naturais” que, sem se transformarem naquelas, haviam se elevado um pouco acima de sua condição original. Tais escolas não são apresentadas pelo autor como escolas públicas. Possivelmente, elas seriam mantidas por entidades constituintes da Sociedade Religiosa, portanto escolas privadas. Para Saint-Simon, finalmente, poucas são as referências à educação mantida pelo Estado. Ele se referiu, certa vez, à Escola Politécnica (estatal) como o mais perfeito estabelecimento de ensino existente, e chegou a propor a Napoleão a criação de cátedras para a educação dos industriais, possivelmente dos mais instruídos. No que diz respeito ao ensino elementar, sua filiação à Sociedade de Instrução Primária — entidade civil filantrópica — destinada a promover a educação das crianças proletárias, o filósofo apresenta sua atividade como sendo de caráter público, embora não estatal. No mesmo sentido, a direção de toda instrução pública não ficaria a cargo do Poder Público (do Estado), mas, sim, do Poder Espiritual, constituído da Academia de Ciências e da Academia de Belas Artes. Se a expressão educação pública não-estatal está ausente dos escritos desse filósofo, a concepção está bem presente. Ela veio a ser reforçada, na ótica do positivismo, por Augusto Comte (1830)9 e pela projeção ficcional saint-simoniana de Júlio Verne (1863). Já na ótica socialista, também tributária do pensamento de Saint-Simon, a educação pública não estatal veio a ser defendida por Karl Marx, pelo menos na exposição ao Conselho Geral da Associação Internacional do Trabalho (1869). LUIZ ANTÔNIO CUNHA é sociólogo, mestre e doutor em educação. Lecionou na PUC/RJ, no IESAE/FGV, na UNICAMP, na UFF, na USP e na FLACSO. Foi pesquisador-visitante da Faculdade de Educação da USP, com bolsa da FAPESP. Dentre seus livros, os mais importantes são Educação e desenvolvimento social no Brasil (1975), Educação, Estado e democracia no Brasil (1991), a trilogia sobre a universidade brasileira (Temporã, 1980; Crítica, 1983; Reformanda, 1988) e, o mais recente (1995), Educação brasileira: projetos em disputa (Lula x FHC na campanha presidencial). Disponível em: http://www.anped.org.br/rbe/rbedigital/rbde01/rbde01_06_luiz_antonio_cunha.pdf .Acessado em 27 de julho de 2011.
  • 21. 21 UNIDADE II 1. A RELAÇÃO EDUCAÇÃO E SOCIEDADE - OS CLÁSSICOS DO PENSAMENTO SOCIAL A educação, para os clássicos como Durkheim, expressa uma doutrina pedagógica, que se apoia na concepção do homem e sociedade. O processo educacional emerge através da família, igreja, escola e comunidade. Fundamentalmente, Durkheim parte do ponto de vista que o homem é egoísta, que necessita ser preparado para sua vida na sociedade. este processo é realizado pela família e também pelas escolas e universidades: A ação exercida pelas gerações adultas sobre as que ainda não estão maduras para a vida social, tem por objetivo suscitar e desenvolver na criança determinados números de estados físicos, intelectuais e morais que dele reclamam, por um lado, a sociedade política em seu conjunto, e por outro, o meio especifico ao qual está destinado. (DURKHEIM, 1973:44). Para Durkheim, o objeto da sociologia é o fato social, e a educação é considerada como o fato social, isto é, se impõe, coercitivamente, como uma norma jurídica ou como uma lei. Desta maneira a ação educativa permitirá uma maior integração do indivíduo e também permitirá uma forte identificação com o sistema social. Durkheim rejeita a posição psicologista. Para ele, os conteúdos da educação são independentes das vontades individuais, são as normas e os valores desenvolvidos por uma sociedade o grupo social em determinados momentos históricos, que adquirem certa generalidade e com isso uma natureza própria, tornando-se assim ?coisas exteriores aos indivíduos?: A criança só pode conhecer o dever através de seus pais e mestres. É preciso que estes sejam para ela a encarnação e a personificação do dever. Isto é, que a autoridade moral seja a qualidade fundamental do educador. A autoridade não é violenta, ela consiste em certa ascendência moral. Liberdade e autoridade não são termos excludentes, eles se implicam. A liberdade é filha da autoridade bem compreendida. Pois, ser livre não consiste em fazer aquilo que se tem vontade, e sim em se ser dono de si próprio, em saber agir segundo a razão e cumprir com o dever. E justamente a autoridade de mestre deve ser empregada em dotar a criança desse domínio sobre si mesma (DURKHEIM, 1973:47). Talcott Parsons (1964), sociólogo americano, divulgador da obra de Durkheim, observa que a educação, entendida como socialização, é o mecanismo básico de constituição dos sistemas sociais e de manutenção e perpetuação dos mesmos, em formas de sociedades, e destaca que sem a socialização, o sistema social é ineficaz de manter-se integrado, de preservar sua ordem, seu equilíbrio e conservar seus limites. O equilíbrio é o fator fundamental do sistema social e para que este sobreviva é necessário que os indivíduos que nele ingressam assimilem e internalizem os valores e as normas que regem seu funcionamento. Aqui encontramos uma primeira diferença com o pensamento de Durkheim, que destaca sempre o aspecto coercitivo da sociedade frente ao indivíduo. Parsons afirma que é necessário uma complementação do sistema social e do sistema de personalidade, ambos sistemas tem necessidades básicas que podem ser resolvidas de forma complementar. O sistema social para Parsons funciona armonicamente a partir do equilíbrio do sistema de personalidade. A criança aceita o marco normativo do sistema social em troca do amor e carinho maternos. Este processo se desenvolve através de mediações primarias: os próprios pais através da internalização de normas inicia o processo de socialização primaria. A criança não percebe que as necessidades do sistema social estão se tornando suas próprias necessidades. Desta maneira, para Parsons, o indivíduo é funcional para o sistema social. Tanto para Durkheim como para Parsons, os princípios básicos que fundamentam e regem ao sistema social são: Continuidade; Conservação; Ordem; Harmonia; Equilíbrio
  • 22. 22 Estes princípios regem tanto no sistema social, como nos subsistemas. De acordo com Durkheim bem como Parsons, a educação não é um elemento para a mudança social, e sim, pelo contrário, é um elemento fundamental para a conservação e funcionamento do sistema social. Uma corrente oposta a Durkheim y Parsons estaria constituída pela obra de Dewey e Mannheim. O ponto de partida de ambos autores é que a educação constitui um mecanismo dinamizador das sociedades através de um indivíduo que promove mudanças. O processo educacional para Dewey e Mannheim, possibilita ao indivíduo atuar na sociedade sem reproduzir experiências anteriores, acriticamente. Pelo contrario, elas serão avaliadas criticamente , com o objetivo de modificar seu comportamento e desta maneira produzir mudanças sociais. É muito conhecida e difundida no Brasil a obra de Dewey, razão pela qual não a aprofundaremos em detalhes. Entretanto, é necessário assinalar que para Dewey é impossível separar a educação do mundo da vida: A educação não é preparação nem conformidade. Educação é vida, é viver, é desenvolver, é crescer. (DEWEY, 1971:29). Para Dewey, a escola é definida como uma micro-comunidade democrática. Seria o esboço da socialização democrática, ponto de partida para reforçar a democratização da sociedade. Segundo Dewey, educação e democracia formam parte de uma totalidade, definem a democracia com palavras liberais, onde os indivíduos deveriam ter chances iguais. Em outras palavras, igualdade de oportunidades dentro dum universo social de diferenças individuais. Para Mannheim, a educação é uma técnica social, que tem como finalidade controlar a natureza e a historia do homem e a sociedade, desde uma perspectiva democrática. Define a educação como: O processo de socialização dos indivíduos para uma sociedade harmoniosa, democrática porem controlada, planejada, mantida pelos próprios indivíduos que a compõe. A pesquisa é uma das técnicas sociais necessárias para que se conheçam as constelações históricas especificas. O planejamento é a intervenção racional, controlada nessas constelações para corrigir suas distorções e seus defeitos. O instrumento que por excelência põe em pratica os planos desenvolvidos é a Educação. (MANNHEIM, 1971:34). A pratica da socialização percorre diversos espaços, como família e outros grupos primários, a escola, clubes, sindicatos, etc. Assim, a pratica democrática emerge horizontalmente permitindo a estruturação duma sociedade igualitária. Concorda com Dewey que essa pratica deveria ser institucionalizada. 1.1 AS FUNÇÕES DO PROCESSO EDUCACIONAL A pesar das profundas diferenças que separam as correntes sociológicas que se ocuparam da questão, e que não podem ser ignoradas, existe entre elas um ponto de encontro: a educação constitui um processo de transmissão cultural no sentido amplo do termo (valores, normas, atitudes, experiências, imagens, representações) cuja função principal é a reprodução do sistema social. Isto é claro no pensamento durkheimiano, ao afirmar: Em resumo, longe de a educação ter por objeto único e principal o indivíduo e seus interesses, ela é antes de tudo o meio pelo qual a sociedade renova perpetuamente as condições de sua própria existência. A sociedade só pode viver se dentre seus membros existe uma suficiente homogeneidade. A educação perpetua e reforça essa homogeneidade, fixando desde cedo na alma da criança as semelhanças essenciais que a vida coletiva supõe. (DURKHEIM, 1973:52).
  • 23. 23 Também é este o sentido da formalização do processo de socialização do sistema social parsoniano; da aprendizagem de papeis sociais atribuída a tal socialização por Linton; dos arbítrios culturais reproduzidos pela prática pedagógica, que constituem um dos principais mecanismos de reprodução social para Bourdieu e Passeron. Aceitando esta perspectiva de analise, o problema é: como a educação cumpre essa função e como se articula a outros mecanismos de reprodução social. Dado que o tema remete a uma vasta e complexa questão, mais importante que se perguntar pelas funções da educação em geral, é delimitar inicialmente o campo de analise às funções da escola - uma das instituições que cumprem essa função de reprodução ideológica, deixando de lado momentaneamente outras tão importantes quanto aquela (família, meios de comunicação, sindicatos, partidos, etc.). Parece adequado recuperar as postulações que tentam uma articulação global entre a escola e a reprodução social. O fato de que as mesmas se centram fundamentalmente no problema da reprodução ideológica pode servir como uma primeira aproximação. No entanto, não se deve perder de vista que estes desenvolvimentos teóricos são ao mesmo tempo suficientemente amplos e estreitos. Amplos, porque se referem ao conjunto dos aparelhos ideológicos que fazem com que a sociedade exista e se mantenha. Restritos, porque privilegiam, precisamente, de modo geral, a análise da ideologia, de maneira quase exclusiva. Em primeiro lugar, deve-se perguntar: qual é a função atribuída aos aparelhos ideológicos no processo de reprodução social Se se privilegia a produção de bens materiais como eixo de analise no funcionamento da sociedade, a historia da humanidade pode ser reconstruída através das formas de organização do trabalho social, isto é, a forma pela qual os homens produzem bens materiais para a sua subsistência. Desde este ponto de vista, é possível pensar que existe uma divisão entre os diversos agentes que desempenham tal trabalho social. Porem, talvez o mais importante seja o fato de que sobre tal divisão se ergue a possibilidade de que um setor da sociedade organize o conjunto da atividade produtiva, obtendo benefícios provenientes de seu controle dos meios de produção. E fundamentalmente no âmbito econômico, embora não exclusivamente, que se coloca a possibilidade existência das classe sociais. E é também nesse âmbito que se desenha, de inicio, a possibilidade de conflito social que emerge da relação de exploração e subordinação à qual está submetido o conjunto social dos não-proprietarios. Claro está que a estruturação de tais classes, partindo da existência do conflito, supõe uma permanente modificação da forma que sua relação assume. Radica-se aí a possibilidade de identificação de diferentes épocas históricas e o reconhecimento de que a sociedade capitalista constitui apenas uma dessas épocas: aquela caracterizada pela forma em que a organização social do trabalho conduz à existência de um modo de exploração social a qual se gera a mais-valia. Por que, então, pensar na reprodução em suas diferentes formas? A mudança social ocorre necessariamente pelo fato de ser o conflito econômico intrínseco ao conceito de sociedade que serve de ponto de partida? Responder afirmativamente a essa pergunta seria cair em uma visão simplista da sociedade. Se tal conflito existe potencialmente, a possibilidade de sua realização a fim de produzir efeitos que realmente modifiquem a estrutura social, supõe um complexo processo que não se resolve unicamente com mudanças no interior do processo produtivo. Se se admite este suposto, chegar-se-á à conclusão de que a sociedade não se reproduz apenas no aspecto econômico, mas em todos seus níveis. Compreender como e porque a sociedade logra se reproduzir, captar quais são os mecanismos eficazes sobre os quais se assentam o seu funcionamento, pode ser, então, uma chave para compreender suas reais possibilidades de mudança. Em conseqüência, a visualização do conflito deverá transcender o econômico. A analise da reprodução social também fará o mesmo.
  • 24. 24 De fato, parece pouco convincente atribuir a persistência de uma forma social ao simples fato de que existe uma classe social possuidora dos meios de produção, que se apropria do excedente econômico gerado pelo conjunto social dos trabalhadores. Igualmente, é pouco convincente pensar que a sociedade se mantém em função do estrito ? controle social cujo monopólio aquela classe detém. Sem duvida, a sociedade é algo mas complexo e em sua interpretação deve-se introduzir não apenas a analise de suas instancias como, também, e fundamentalmente, a articulação entre as mesmas. Dai a importância de alguns trabalhos que pretendem centrar-se na analise das superestruturas, em sua articulação com o aspecto econômico. A escola e a reprodução social As primeiras apreciações em torno dos chamados aparelhos ideológicos do Estado foram feitas por Gramsci. As superestruturas do bloco histórico constituem uma totalidade complexa em cujo interior se distinguem duas esferas essenciais: a sociedade política e a sociedade civil. A sociedade política agrupa o aparelho de Estado, entendido este em seu sentido restrito, realizando o conjunto das atividades da superestrutura que dão conta da função de dominação. Por sua vez, a sociedade civil constitui a maior parte da superestrutura e é formada pelo conjunto dos organismos vulgarmente chamados privados e que correspondem à função de hegemonia que o grupo social dominante exerce sobre a sociedade global. Esta sociedade civil pode ser considerada sob três aspectos analiticamente diferentes e complementares: Como ideologia da classe dominante, ela alcança todos os ramos da ideologia, da arte à ciência, incluindo a economia, o direito, etc. Como concepção do mundo, difundida em todas as acamadas sociais para vinculá-las à classe dirigente, ela se adapta a todos os grupos: dai provêm seus diferentes graus qualitativos: filosofia, religião, sentido comum, folclore; como direção ideológica da sociedade, ela se articula em três níveis essenciais: a ideologia propriamente dita, a estrutura ideológica - isto é, as organizações que a criam e a difundem - e o material ideológico, isto é: os instrumentos técnicos de difusão da ideologia: sistema escolar, mas media e bibliotecas. (PORTELLI, 1971: 23) A partir destas considerações gerais, os problemas da ?estrutura e do material ideológico? passaram a ser temas recorrentes de analise. Não obstante, o característico nesses estudos foi subordinar o conflito social surgido no interior de tais instituições à analise formal de tais aparelhos ideológicos. Contudo, o processo educacional deixou de ser analisado como um processo a-histórico, para ser referido à sociedade capitalista. Então, as perguntas fundamentais passaram a ser: que relação guarda o sistema escolar com a estrutura das relações de classe Como tal sistema escolar age de maneira a assegurar a reprodução ideológica e, em conseqüência, a reprodução da sociedade capitalista E, por fim, a pergunta, como os fatores sociais agem no interior desse sistema educacional. Um dos principais esforços de elucidação deste problema foi enunciado desta maneira: Para compreender adequadamente a natureza das relações que unem o sistema escolar à estrutura das relações de classe e elucidar sem cair em uma espécie de metafísica da harmonia das esferas o do providencialismo do melhor e do pior, das correspondências, homologias e coincidências redutíveis em ultima analise à convergência de interesses, alianças ideológicas e afinidades entre habitus, deixando de lado o discurso interminável que resultaria de percorrer em cada caso a rede completa das relações circulares que unem estruturas e praticas pela mediação do habitus como produto das estruturas, para definir os limites de validade (isto é, validade desses limites) de uma expressão abstrata como a de sistema de relações entre o sistema de ensino e a estrutura das relações de classe. (BOURDIEU & PASSERON, 1976:212). Isto é, o nexo conceitual entre estruturas e praticas, que estes autores elaboram, é o de habitus definido como: Sistema de disposições duráveis e transferíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona a cada momento como matriz de percepções, apreciações e ações, e torna possível a realização de tarefas suficientemente diferenciadas, graças à transferencia analógica de esquemas que permitem resolver problemas da mesma forma, e, graças a correções incessantes dos resultados obtidos, dialeticamente produzidos por estes resultados (BOURDIEU & PASSERON, 1976:214).
  • 25. 25 Com estes postulados, tenta-se demostrar que a sociedade se organiza não apenas a partir de bens econômicos, mas também a partir da produção de bens simbólicos, de habitus de classe, que, transmitidos fundamentalmente pela família, levam a que os indivíduos organizem um modo de vida e uma determinada concepção do mundo. A introdução desta dimensão se fundamenta no conceito de classe em jogo: As diferenças propriamente econômicas são explicadas por distinções simbólicas na maneira de usufruir esses bens, ou melhor, (é) através do consumo, e mais, através do consumo simbólico (ou ostentatorio) que se transmitem os bens simbólicos, as diferenças de fato (se transformam assim) em distinções significativas. A lógica do sistema de ações e procedimentos expressivos não pode ser compreendida de maneira independente de sua função, que é dar uma tradução simbólica do sistema social como sistema de inclusão e exclusão, segundo a expressão de Mc Guire, mas também significar a comunidade ou a distinção, transmutando os bens econômicos em atos de comunicação. De fato, nada mais falso do que acreditar que as ações simbólicas (ou o aspecto simbólico das ações) nada significam Alem delas mesmas; em verdade, elas expressam sempre uma posição social segundo uma lógica que é a mesma da estrutura social: a lógica da distinção (BOURDIEU & PASSERON, 1976:217). Agora, bem instaladas as classes sociais a nível do mercado, este passa a ser visualizado como a mediação entre a produção - ou a forma de participação na produção - e o jogo de distinções simbólicas onde se reproduzem as relações de força entre as classes. Então, a pergunta é: quem e através de que mecanismos, reproduzem essas distinções simbólicas. Esses autores privilegiam família como instituição reprodutora dos sistema social. A família é que introduz o indivíduo no mundo da cultura, as crianças são socializadas muito antes de entrarem na escola. Essa socialização corresponde a valores (em sentido amplo) que são patrimônio cultural do universo social a que pertencem. Como, então, se relaciona a sua ação com aquela empreendida pelo sistema educacional. Durkheim, como seus seguidores, se esforçava por assinalar que a importância do processo educacional se baseava no fato de que o mesmo tinha como função principal a transmissão da cultura na sociedade. Esta cultura era assim apresentada como única, indivisa, propriedade de todos os membros que compõem o conjunto social. Uma das pretensões de Bourdieu e Passeron é justamente demostrar a não existência de uma cultura única, mais que: Na realidade, devido ao fato de que elas correspondem a interesses materiais e simbólicos de grupos ou classes diferentemente situadas nas relações de força, esses agentes pedagógicos tendem sempre a reproduzir a estrutura de distribuição do capital cultural entre esses grupos ou classes, contribuído do mesmo modo para a reprodução da estrutura social: com efeito, as leis do mercado em que se forma o valor econômico ou simbólico, isto é, o valor enquanto capital cultural, dos arbítrios culturais reproduzidos pelas diferentes ações pedagógicas (indivíduos educados) constituem um dos mecanismos mais o menos determinantes segundo os tipos de formação social, pelos quais se acha assegurada a reprodução social, definida como reprodução das relações de força entre classes sociais. (BOURDIEU & PASSERON, 1976:218). O sistema escolar reproduz, assim, a nível social, os diferentes capitais culturais das classes sociais e, por fim, as próprias classes sociais. Os mecanismos de reprodução encontram sua explicação ultima nas?relações de poder?, relações essas de domínio e subordinação que não podem ser explicadas por um simples reconhecimento de consumos diferenciais. Assim, quando analisam a função ideológica do sistema escolar, uma de suas preocupações é justamente a da possível autonomia que pode ser atribuída a ele, em relação à estrutura de classes. Com efeito, Bourdieu e Passeron perguntam: Como levar em conta a autonomia relativa que a Escola deve à sua função específica, sem deixar escapar as funções de classes que ela desempenha, necessariamente, em uma sociedade dividida em classes? (BOURDIEU & PASSERON, 1976:219). E respondem: Se não é fácil perceber simultaneamente a autonomia relativa do sistema escolar, e sua dependência relativa à estrutura das relações de classe, é porque, entre outras razões, a percepção das funções de classe do sistema escolar está associada, na tradição teórica, a uma representação instrumentalista das relações entre a escola e as classes dominantes como se a comprovação da autonomia supusesse a ilusão de neutralidade do sistema de ensino. (BOURDIEU & PASSERON, 1976:220).
  • 26. 26 O que parece, sim, surgir da exposição é que no caso das relações entre escola e classes sociais a harmonia apresentada pelos autores parece perfeita: as estruturas objetivas produzem os habitus de classe e, em particular, as disposições e predisposições que, gerando as praticas adaptadas a essas estruturas, permitem o funcionamento e a perpetuação das estruturas. Bourdieu e Passeron falam da reprodução das classes do ponto de vista de uma analise ideológica. Neste sentido, a noção de existência de códigos lingüisticos é de central importância. Existem códigos lingüisticos que se expressam claramente na linguagem, gerando relações diferentes, constituem representações, significações próprias da cultura de grupos ou classes sociais. Frente a essa cultura fragmentada, o sistema escolar impõe uma norma lingüistica e cultural determinada, mas aproximada àquela que é parte do universo simbólico das famílias burguesas, e distanciada, em conseqüência, daquela dos setores populares. O êxito ou o fracasso das crianças na escola se explica pela distancia de sua cultura ou língua em relação à cultura e à língua escolares. Finalmente, introduziremos o ponto de vista de Poulantzas sobre o papel da escola, no qual se privilegia como eixo de analise a divisão trabalho intelectual/trabalho manual, como forma de analisar tanto a função ideológica como a de reprodução da força de trabalho anexa à mesma: Com efeito, só se pode dizer de forma totalmente análoga e aproximativa que a escola forma trabalho intelectual de um lado e trabalho manual (formação técnica) de outro. Numerosos estudos mostraram amplamente que a escola capitalista não pode, situada globalmente como está, ao lado do trabalho intelectual, formar o essencial do trabalho manual. A formação profissional operaria e essencialmente o saber técnico operário não se ensina (não pode ser ensinado) na escola capitalista, nem mesmo em suas máquinas e aparelhos do ensino técnico. O que se ensina principalmente à classe operaria é a disciplina, o respeito à autoridade, a veneração de um trabalho intelectual que se acha quase sempre fora do aparelho escolar. De maneira alguma, as coisas se apresentam da mesma forma para a nova pequena burguesia e para o trabalho intelectual, sendo sua força de trabalho, em seu lado intelectual, efetivamente formada pela escola. (POULANTZAS, 1975:288) Isto é, o que Poulantzas tenta reafirmar é que as funções da escola só podem ser analisadas em função das classes sociais às quais dirige sua ação, e não em função de instituições ou redes escolares. Isso nos permite encontrar no interior da escola uma reprodução da divisão social do trabalho e afirmar que: O principal papel da escola capitalista não é ?qualificar? diferentemente o trabalho manual e o trabalho intelectual, mas, muito mas, desqualificar o trabalho manual (sujeitá-lo), qualificando só o trabalho intelectual. Disponível em: http://www.antroposmoderno.com/antro-articulo.php?id_articulo=243. Acessado em 27 de julho de 2011.