1. O Jornal Económico, 10 mar. 2017 | 37
A Directiva (UE) 2015/489
do PE e do Conselho de 20 de
Maio de 2015, relativa à pre-
venção da utilização do siste-
ma financeiro para efeitos de
branqueamento de capitais
vem estabelecer uma série de
mecanismos destinados à pu-
blicidade dos beneficiários
efectivos das pessoas colecti-
vas (i.e., aqueles que têm uma
percentagem directa ou indi-
recta em sociedades comer-
ciais).
Assim sendo, foi apresen-
tado pelo Governo e Bloco
de Esquerda um Projecto de
Lei Conjunto – que resulta
da fusão de ambos os projec-
tos de lei apresentados o ano
passado – referente às acções
ao portador, mediante o qual
se proíbe a emissão de acções
ao portador. No prazo de
seis meses a contar da data da
entrada em vigor do diplo-
ma, as acções deverão ser
convertidas em nominativas,
proibindo-se a transmissão
das acções ao portador findo
esse prazo, e bem assim, sus-
pendendo-se o direito aos
lucros associados às acções
ao portador.
Daqui resultará uma mu-
dança importante de paradig-
ma nas estruturas societárias
portuguesas: as sociedades
passarão a conhecer a todo o
tempo todos os seus accionis-
tas e a transmissão das acções
estará sempre sujeita a registo
junto do emitente, sob pena
de não produzir efeitos pe-
rante a sociedade e terceiros.
Esgotados que estão os me-
canismos existentes destina-
dos à publicidade dos accio-
nistas, de facto, a proibição
da emissão de acções ao por-
tador parece ser a forma efi-
caz de acabar com o anoni-
MADALENA BARROS
RODRIGUES
Advogada Sénior, Departamento
Corporate, Espanha e Associados
mato dos accionistas e, de al-
guma forma, tendemos a
concordar, a combater o
branqueamento de capitais.
Note-se que a Directiva vai
mais longe e impõe aos Esta-
dos-Membros que assegurem
que as sociedades sejam “obri-
gadas a obter e conservar infor-
mações suficientes, exactas e ac-
tuais sobre os seus beneficiários
efectivos”. Informações essas
que deverão ser conservadas
num registo central em cada
Estado-Membro ou num re-
gisto público (quiçá o registo
comercial), e acessíveis: às au-
toridades competentes e às
Unidades de Informação Fi-
nanceira; àquelas a que a Di-
rectiva chama de “entidades
obrigadas”, nomeadamente as
instituições de crédito e insti-
tuições financeiras; e a quais-
quer pessoas ou organizações
que possam comprovar um
interesse legítimo. Não se de-
finindo o que se entende por
interesse legítimo, teremos
que nos recorrer do conceito
utilizado em direito público,
sendo o interesse legítimo
um interesse específico aten-
dível, dentro de razoáveis cri-
térios a apreciar casuistica-
mente. Portanto, critérios ra-
zoáveis… a apreciar casuisti-
camente.
… este registo estará acessí-
vel a todos. É o verdadeiro
princípio do fim do anonima-
to das sociedades anónimas.
O Projecto de Lei referido
acima não faz qualquer refe-
rência a este registo central;
teremos, assim, que aguardar
iniciativa legislativa neste
sentido, sendo certo que a Di-
rectiva impõe que os Estados-
-Membros dêem cumpri-
mento às suas disposições até
Junho de 2017. Será interessan-
te ver como os Estados-
-Membros reagirão a estas
imposições, especialmente os
que prestam serviços de fidú-
cia, sendo certo que o Reino
Unido foi já pioneiro na im-
plementação da Directiva,
abolindo as acções ao porta-
dor e obrigando as sociedades
a manter o tal registo dos
seus accionistas. ●
A autora escreve segundo
a antiga ortografia.
OPINIÃO
Angola e Moçambique
a caminho da
recuperação?
Os países de língua oficial portu-
guesa são importantes parceiros
comerciais de Portugal e as socie-
dades de advogados não ficam à
margem desta realidade. Os par-
ceiros da SRS em Angola e Mo-
çambique estiveram em Portugal e
o Jornal Económico ficou a conhe-
cer as suas perspetivas para aqueles
dos países, que já viveram tempos
mais prósperos.
O ex-vice-presidente da Ordem
dos Advogados de Moçambique
Momede Popat está otimista de
que no segundo semestre o para-
digma atual se altere. “No mercado
já sentimos este positivismo. Con-
seguimos ver que algumas empre-
sas ligadas a grandes projetos que
tinham desacelerado as operações
voltaram”, garante o parceiro local
da SRS. Algo que se nota também
em termos políticos, na opinião do
‘partner’ da B&P Advogados, Nazir
Bhikha, que reforça a vontade
crescente da Frelimo e da Renamo
em terminar o conflito.
Confiante está também o Fundo
Monetário Internacional (FMI),
que exigiu uma auditoria financei-
ra às dívidas do governo moçam-
bicano e prevê que a economia
possa crescer 24% a partir de 2021,
resultante da produção de gás na-
tural. De acordo com José Moreira
da Silva, sócio da SRS responsável
por Moçambique, os projetos no
setor já “têm todos os contratos,
quer com o Governo quer entre os
vários parceiros” e “esperam ape-
nas luz verde do FMI para pode-
rem anunciar as suas decisões fi-
nais de investimento”.
A banca moçambicana, funda-
mentalmente detida por capitais
portugueses, também se tem res-
sentido com o cenário do setor em
Portugal, sendo que a maior se-
quela foi a do banco Moza, sujeito
a intervenção estatal depois da re-
solução do Banco Espírito Santo.
O advogado de Direito Público e
Ambiente afirma ainda que o Ban-
co Comercial e de Investimentos
tem aumentado a sua quota de
mercado com a abertura de mais
agências.
Angola e a crise do dólar
Na costa ocidental africana, a ins-
tabilidade económica em Angola
tem levado uma série de firmas a
abrandar investimentos. Entre
2015 e 2016, cerca de 20 mil em-
presas deixaram de exportar para o
país, o que, segundo o sócio res-
ponsável da SRS pela jurisdição
angolana, Octávio Castelo Paulo,
explica-se pelo medo das empresas
de não serem pagas e pelo risco de
“dar crédito a importadoras”.
O responsável pela área de M&A
da sociedade esclarece que se trata
de um sistema em que os dólares
disponíveis que são alocados em
função de setores prioritários e,
caso a empresa exportadora não se
insira neste grupo, o importador
vai demorar mais tempo a encon-
trar a verba de que precisa. Nuno
Prata é um dos sócios portugueses
que mensalmente viaja uma sema-
na ou quinze dias para Luanda
para apoiar as empresas portugue-
sas com presença em Angola, con-
tando desde 2014 com a parceria
local da LML Advogados.
A seu ver, existe ainda um pro-
blema com a regularização do pa-
gamento dos salários aos expa-
triados que implica o envio de di-
visas para o exterior por parte dos
bancos comerciais que estão em
Angola.
O responsável da SRS por An-
gola, Octávio Castelo Paulo, acres-
centa que um bom exemplo dessa
quebra nos investimentos é o das
companhias aéreas. “Houve algu-
mas que deixaram de voar para
Angola, como a Ibéria. A AirFran-
ce ou a British Airways reduziram
o número de voos porque vendem
bilhetes em Angola mas depois
não conseguem receber o preço
em dólares”, argumenta.
O sócio angolano Luís Martinho
Lunga, da LML, assegura que se a
curto prazo o petróleo não sofrer
subidas substanciais no mercado
internacional e se o governo ango-
lano não for capaz de criar outras
fontes de financiamento para dar
vasão à sua atividade “é mais do
que certo que esta situação ainda
vai perdurar”. ●
Os parceiros locais da SRS Advogados estiveram em Portugal e revelaram as
suas perspetivas para a recuperação económica nos dois países lusófonos.
MARIANA BANDEIRA
mbandeira@jornaleconomico.pt
ENTREVISTA SRS ADVOGADOS
Será o fim do
anonimato das
sociedades anónimas?
CristinaBernardo