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ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING (ESPM – SP)
GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL COM ÊNFASE EM
PUBLICIDADE E PROPAGANDA
ROBERTO FERREIRA ALVES DAX
A NASA E O CINEMA
Um estudo sobre o uso do Branded Entertainment da Agência Espacial
Americana no cinema.
SÃO PAULO
2 / 2016
ROBERTO FERREIRA ALVES DAX
A NASA E O CINEMA
Um estudo sobre o uso do Branded Entertainment da Agência Espacial Americana no
cinema
SÃO PAULO
2016
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como
requisito para obtenção de título de Bacharel em
Comunicação Social com ênfase em Publicidade e
Propaganda pela Escola Superior de Propaganda e
Marketing – ESPM.
Orientadora: Martha Terenzzo - Mestre em
Comunicação e Consumo
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, que sempre incentivaram a curiosidade e o trabalho bem feito.
Aos meus amigos e familiares, que acompanharam de perto o desenrolar dessa maluquice.
À Lu, sempre ao lado, nas partes boas e nas nem tanto.
À Martha, que acreditou neste projeto desde o começo, independente do quão absurdo fosse.
E aos que continuamente batalham para garantir um lugar para a humanidade entre as estrelas.
Que continuem assim.
I grew up being amazed by science fiction — 2001, Star Wars. But I
grew up in a time when being an astronaut was the highest ambition.
And the idea that we would keep exploring space and pushing further
and further out seemed inevitable. That has fallen out in the past couple
of decades. Technology has gone through a huge change. I think we’re
on the new cusp of a brand new era of exploration.
Christopher Nolan, diretor de Interstellar.
DAX, Roberto Ferreira Alves. A NASA e o cinema: um estudo sobre a utilização do branded
entertainment da agência espacial americana em produções cinematográficas. São Paulo,
2016. 73 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharel em Comunicação Social). Escola
Superior de Propaganda e Marketing, São Paulo, 2016.
RESUMO
Neste trabalho procuramos estudar a metodologia aplicada pela marca NASA ao longo
dos anos para se posicionar perante seus diversos públicos, com ênfase em produções
cinematográficas. Através da utilização de técnicas de branding, como o Branded
Entertainment, a NASA altera sua narrativa e dialoga com o seu público de interesse, utilizando
como veículo as produções hollywoodianas. Para entender este processo, analisaremos o
desenvolvimento do cinema como meio de comunicação e difusor de ideias, suas
transformações e relacionamento cada vez mais intrínseco com a indústria de consumo. Em
seguida, investigaremos sobre a prática e evolução do product placement e Branded
Entertainment, utilizadas para a divulgação de marcas em meios voltados ao entretenimento,
assim como a aplicação desses conceitos na marca NASA. Por fim, concluiremos com uma
análise aprofundada das três obras estudadas e conceitos trabalhados ao longo da pesquisa. Para
tal, foram escolhidos três filmes, que possuem a participação e parceria da NASA. São eles:
Marooned (1969), Apollo 13 (1995) e The Martian (2015).
Palavras-Chave: Marca. Mídia. Cinema. NASA. Branded Entertainment.
ABSTRACT
In this academic paper we seek to study the methodology applied by NASA’s brand
over the years in order to position itself before its several publics, with emphasis in movie
productions. Through the use of branding techniques, like Branded Entertainment, NASA alters
its narrative and dialogues with its target audience, using Hollywood productions as a vehicle.
In order to understand this process, we will analyze the development of cinema as a mean of
communication and diffuser of ideas, its transformations and increasingly intimate relationship
with the consumer industry. Then, we will investigate the practice and evolution of product
placement and Branded Entertainment, used in brand divulgation in channels dedicated to
entertainment, as well as the application of said concepts in NASA’s brand. Finally, we will
conclude with a profound analysis of the three works studied and the concepts labored during
the research. For such, three movies were chosen, all of them possessing communion and
partnership with NASA. They are: Marooned (1969), Apollo 13 (1995) and The Martian
(2015).
Keywords: Brand. Media. Cinema. NASA. Branded Entertainment.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................8
1.1 Contextualização...............................................................................................................8
1.2 Objeto................. ............................................................................................................10
1.3 Problema.........................................................................................................................11
1.4 Objetivo Geral ................................................................................................................12
1.5 Objetivos Específicos .....................................................................................................12
1.6 Metodologia....................................................................................................................12
1.7 Quadro Referencial Teórico ...........................................................................................14
2 CAPÍTULO 1: REFLEXÕES SOBRE O CINEMA.............................................................15
2.1 Introdução ao Capítulo ...................................................................................................15
2.2 Cinema: primórdios e atualidade....................................................................................15
2.3 A Mídia e o Cinema........................................................................................................18
2.4 Cinema como Veículo e Influência Cultural ..................................................................22
2.5 Relação Cinema - Publicidade........................................................................................25
2.6 Considerações.................................................................................................................26
3 CAPÍTULO 2: BRANDED ENTERTAINMENT ................................................................27
3.1 Introdução ao Capítulo ...................................................................................................27
3.2 A marca e suas características ........................................................................................27
3.3 Branded Entertainment ...................................................................................................29
3.4 Branded Entertainment no Cinema.................................................................................34
3.5 A marca NASA e o Branded Entertainment...................................................................38
3.6 Considerações.................................................................................................................50
4 CAPÍTULO 3: ANÁLISE DAS TRÊS OBRAS ...................................................................52
4.1 Introdução ao Capítulo ...................................................................................................52
4.2 Análise............................................................................................................................52
4.3 Conclusão..... ..................................................................................................................65
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................67
PESQUISA DOCUMENTAL..................................................................................................70
ANEXO A – ANÁLISE DAS TRÊS OBRAS.........................................................................73
8
INTRODUÇÃO
Nesta introdução procuramos contextualizar a metodologia aplicada pela marca
NASA ao longo dos anos para se posicionar perante seus diversos públicos, com ênfase em
produções cinematográficas. Para esse momento discorreremos sobre fatos de nosso objeto,
problema, objetivo geral, objetivos específicos e metodologia aplicada.
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO
O século XX foi o palco do nascimento de diversos meios de veiculação de informação
e cultura. Em somente cem anos, a humanidade revolucionou diversas vezes sua própria relação
com a comunicação, permitindo desdobramentos que são sentidos até hoje. Em seu artigo onde
analisa a importância de meios de comunicação na sociedade, em especial o cinema, a autora
Gonçalves (2008) ilustra esse conceito analisando como o surgimento de novos meios
influenciaram as mudanças na percepção e recepção, sensoriais e artísticas, na sociedade
moderna. De fato, a proliferação dos meios de comunicação permitiu inúmeras possibilidades
de diálogo, novos meios de se conectar interlocutores.
De certo, uma das áreas que mais se beneficiou de tais mudanças foi a publicidade. Ao
se adaptar aos novos entrantes midiáticos, os anunciantes agora tinham inúmeras maneiras de
alcançar seu público alvo. Entretanto, as mensagens veiculadas eram intencionadas ao grande
público, tendo pouca relação com o espectador individual. É deste período que fala Maria Rita
Kehl em seu artigo, quando afirma que a indústria cultural proposta por Adorno e Horkheimer
se utilizaria da imagem para alcançar o maior número de pessoas possível, de maneira rasa e
simples, “imagens enunciadas por ‘ninguém’ e dirigidas a ‘todos’ são hoje o principal produto
da cultura de massas” (KEHL, 2005, p. 237). Sem outra opção, o espectador era incapaz de
escolher ou interagir com o que era anunciado.
Mas eis que o aprimoramento das novas tecnologias, a principal delas sendo a internet,
permitiu mais um passo na diferenciação do consumo de conteúdos. Os autores Bezerra e
Covaleski (2013) analisam o consumidor moderno, que agora possui ferramentas para absorver
anúncios de maneira seletiva e critica. A massificação da informação e subserviência do
espectador deu lugar a “o poder de escolha e, consequentemente, a possibilidade de criar
bloqueios e propor intervenções às mensagens publicitárias” (BEZERRA; COVALESKI, 2013,
p. 127). Os novos consumidores não são mais afetados por simples comerciais, é preciso mais
para conectá-los às marcas.
9
Como a publicidade se adaptou para comportar tais mudanças? Como reestruturar-se
para atender a uma sociedade agora muito mais crítica e no comando do que quer assistir? Lehu
(2007) comenta essa transformação, tendo como ponto de vista o entretenimento. Segundo ele,
é através da interação emocional que uma marca consegue criar um elo com seu público, e o
entretenimento fornece justamente a possibilidade de tal relação. Métodos como o product
placement e o Branded Entertainment, a inserção de uma marca ou produto em um conteúdo
destinado ao lazer, não só apresentam novas formas de se atingir e interagir com o público, mas
também pelo potencial de atrelar marcas a histórias que condigam com suas características.
Silverstone (2011) e Palacios e Terenzzo (2016) comentam sobre o poder das histórias no
diálogo com o consumidor, como facilitam a identificação e conexão com a marca que as conta.
O elo emocional com o público alvo se tornou a busca das marcas modernas, agora
voltadas para criar mensagens que significam algo para seus consumidores, que gerem
envolvimento e participação por parte deles. O maior desafio agora se tornou a inserção fluida
e coesa de conteúdo publicitário em objetos de entretenimento, de forma que se encaixem com
a narrativa e não sejam percebidos de maneira negativa pelo consumidor. Donaton (2007)
comenta o poder da inserção orgânica:
As parcerias com o entretenimento não tornam apenas a publicidade mais atraente,
mas também a tornam impossível de ser evitada. Você não tem como pular a cena em
que aparece o produto sem pular, no ato, uma parte do programa (DONATON, 2007,
p. 38).
Como iremos tratar especificamente do cinema, sendo esta a mídia veículo dos objetos
de pesquisa, é necessário entender sua participação na construção simbólica, e por vezes mítica,
das vivências de seus espectadores. Covaleski (2009), em seu livro Cinema, Publicidade,
Interfaces, aborda a comunicação interligada entre os diversos componentes de um filme, indo
desde a montagem até referencias. Para ele, o espectador é envolto no apelo emocional da obra,
gerando novas sensações e experiências únicas. Como afirmado pelo autor “a linguagem
trabalhada pelo cinema induz o espectador a consumir algo intangível, porém carregado de
significados e simbolismos, os sonhos” (COVALESKI, 2009, p. 71). Pode-se ver que o cinema
se apresenta como veículo ideal para a nova estruturação da publicidade, em busca de ligações
emocionais com seus consumidores. Ao longo deste trabalho veremos como se criou a relação
entre os dois, e como tal relação foi aproveitada por marcas, inclusive a estudada.
De fato, a NASA se apresenta como um objeto interessante para análise. Uma marca
sem produto que, no entanto, permanece forte no imaginário popular, assumindo caráter quase
10
mítico, a NASA se destaca de outras grandes empresas por simplesmente ter sido parte ativa na
história mundial desde sua fundação. Como o autor Dick enfatiza, “como as facetas de uma
joia, a importância geral da NASA e da Era Espacial nos últimos 50 anos pode ser considerada
a partir de muitos pontos de vista, indo desde o geopolítico e tecnológico para o educacional e
cientifico”1
(DICK, 2008, p. 587, tradução do autor). Seu alcance midiático é enorme: desde o
programa Apollo e o pouso lunar, as Shuttles e a Estação Espacial Internacional, o mundo
testemunhou suas conquistas. Assim, veremos como foi feito o posicionamento desta grande
marca, e como se deu a relação com Hollywood.
Neste estudo, analisaremos as diferentes representações e incursões da marca NASA
em três produções cinematográficas, feitas a partir dos conceitos apresentados de branded
entertainment, da necessidade de criar elos emocionais com o público espectador, de ser
condizente e parte da narrativa do filme. Utilizando-nos dos autores citados acima, assim como
vários outros, tentaremos avaliar o posicionamento de marca da agência retratada nas produções
escolhidas, assim como o contexto histórico-cultural por trás de cada projeto, de forma a
entender a fundo a transição narrativa da NASA ao longo dos anos.
1.2 OBJETO
A autora Lima (2008), em sua obra Monografia, define o objeto de pesquisa como
uma das peças fundamentais para a base de um projeto científico. Em seu livro, descreve
diversos passos que um pesquisador deve tomar ao iniciar seu estudo, sendo a construção de
um objeto de pesquisa o primeiro deles. Será a partir dele que o pesquisador testará suas teorias,
aplicará “medições”; em termos coloquiais, o objeto é a “cobaia” do experimento.
Sendo assim, o objeto de estudo deste trabalho versa sobre a maneira como a NASA,
ao longo dos anos, se utilizou de técnicas de branding, entre elas o product placement e o
branded entertainment por meio do cinema para alterar sua percepção de marca perante o
público. Dentro do período proposto pelas três obras escolhidas, indo desde a década de 1960
até a atualidade, desenvolveremos um estudo onde se averiguará se a agência espacial alterou
a narrativa de sua marca através das produções cinematográficas em questão. Com distâncias
aproximadas de 20 anos entre si, os três filmes tiveram parcerias com a NASA em suas
1
“like the facets of a jewel, the overall importance of NASA and the Space Age over the last 50 years may be
considered from many points of view, ranging from the geopolitical and technological to the educational and
scientific.”
11
produções. Dessa forma, apresentam-se como retratos de como a marca se posicionava à época,
utilizando o cinema como veículo. Por ordem de lançamento, os filmes são:
 Marooned (1969): Lançado meses antes do quase desastre da Apollo 13, retrata uma
nave à deriva. Os três astronautas têm pouco oxigênio disponível, e devem contar com
o comando da missão para serem resgatados. Este filme está no projeto devido a
percepção da NASA como ousada e heroica. Boa parte da trama ocorre em terra, com
os engenheiros lutando contra o tempo para trazer seus homens em segurança. Foi uma
das primeiras produções que contou com apoio da agência.
 Apollo 13 (1995): Como o nome sugere, conta a história da missão que quase resultou
em uma das maiores catástrofes da história da agência. Retrata-a como responsável pelo
sucesso da viagem de volta e retoma a aura de heroísmo que havia sido parcialmente
perdida desde o fim da corrida espacial. Contou com diversos equipamentos fornecidos
pela NASA, incluindo voos de baixa gravidade, que simulam os efeitos sentidos por
astronautas no espaço.
 The Martian (2015): A representação mais atual da percepção de imagem da marca,
relata um astronauta preso em Marte, considerado morto pelo resto de sua tripulação.
Deve sobreviver em um ambiente cruel enquanto cientistas da NASA lutam contra o
tempo para resgatá-lo. Sendo o exemplo mais recente, é um filme cuja a análise será
interessante, uma vez que revelará a atual posição da marca. Foi o que mais contou com
auxílio da NASA até o presente momento.
1.3 PROBLEMA
Delimitar um problema significa apresentar uma questão não completamente
resolvida, algo que o pesquisador tenha vontade de descobrir e entender. Segundo Alves (2007,
p. 48), autora da obra Como escrever teses e monografias, “formular um problema é dizer de
maneira explicita, operacional, qual a dificuldade que existe, delimitando seu campo de
investigação e apresentando suas características”, sendo assim, um problema de pesquisa deve
conter em poucas palavras o significado real da investigação proposta. Neste trabalho, o
problema a ser respondido é: de que maneira a NASA se utilizou de técnicas de branding no
cinema para alterar sua percepção de marca perante o público?
12
1.4 OBJETIVO GERAL
Alves (2007), propõe uma maneira de se alcançar um objetivo geral em projetos
monográficos, segundo ela: “aconselha-se a formular o objetivo geral a partir do que se define
no problema” (ALVES, 2007, p. 52). Seguindo a estrutura proposta pela autora, tem-se como
objetivo geral entender de que maneira a NASA se utilizou de técnicas de branding no cinema
para alterar sua percepção de marca perante o público.
1.5 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Segundo Alves (2007, p. 52) “deve-se formular […] objetivos específicos que
definirão os fins da investigação, para nortear os passos”, de forma que sejam criados a partir
das questões apresentadas em um projeto. Neste estudo, serão abordados três objetivos, que se
complementarão:
a) analisar o meio midiático cinema, tanto como indústria cultural e de mercado, como
meio de comunicação e seu papel na contemporaneidade;
b) compreender o significado de marca, focando em especial no branding voltado para o
entretenimento (product placement e branded entertainment), de modo a entender como
a imagem da marca NASA foi construída nas três produções, além do contexto
histórico-cultural por trás;
c) analisar os três filmes (Marooned, Apollo 13 e The Martian), comparando de que
maneira a marca NASA foi representada, em busca de transformações da agência
espacial.
1.6 METODOLOGIA
Devido à variedade de assuntos a serem trabalhados neste estudo, assim como sua
natureza cinematográfica, foi necessário adotar dois métodos distintos de pesquisa:
bibliográfica e documental. De acordo com as definições apresentadas por Lima, em sua obra
Monografia, a pesquisa bibliográfica “é a atividade de localização e consulta de fontes diversas
de informação escrita orientada pelo objetivo explícito de coletar materiais mais genéricos ou
mais específicos a respeito de um tema” (LIMA, 2008, p. 48). Como já mencionado, este
trabalho aborda temas que englobam desde a história do cinema, sua indústria e mecanismos
de comunicação, passando pelos conceitos e teorias de branding, com ênfase nas estratégias
13
que visam a divulgação via entretenimento e product placement, até a história da própria
NASA, e sua passagem pelo mundo da mídia e a transformação em um ícone cultural. Todos
esses temas só serão compreendidos e estudados a fundo se for realizado uma extensa pesquisa,
debruçando-se nos autores clássicos e contemporâneos.
Já a pesquisa documental trata-se do “exame [...] de materiais que ainda não receberam
qualquer tratamento analítico” (LIMA, 2008, p. 56). Ela abrange qualquer material com
potencial de consulta, que contenha informações e registros de eventos e provas. Materiais
documentais vão desde filmes, séries, fotos, músicas, audiovisuais em geral, manuscritos,
impressos e documentos históricos. Cabe ao pesquisador absorver seu conteúdo, e organiza-lo
de maneira coerente e benéfica para seu estudo. Haverá a análise comparativa dos filmes
selecionados, procurando entender a relação entre eles sob o ponto de vista do branded
entertainment, assim como a evolução do posicionamento de marca feito pela NASA. Serão
comparadas inserções, contexto em que estão inseridas, entre outros.
Como já descrito, o primeiro capítulo tratará da indústria cinematográfica, tanto como
forma de negócio como divulgadora de ideias e cultura. Para esse aspecto, o da indústria em si,
serão estudados, via pesquisa bibliográfica, os autores Rogério Covaleski e Fernando
Mascarello. Já para a parte midiática, a pesquisa tenderá para autores clássicos, como Theodor
Adorno e Max Horkheimer, assim como estudiosos modernos, como Gabriel Cohn, Maria Rita
Kehl e Roger Silverstone.
O segundo capítulo abordará o conceito de marca e as estratégias do branding
realizado por grandes empresas, principalmente as associadas ao Branding Entertainment,
assim como suas aplicações no contexto da NASA. Por meio de uma pesquisa bibliográfica e
documental, serão estudados os autores Jean-Marc Lehu, Scott Donaton, Mark Batey, Fernando
Palacios e Martha Terenzzo, assim como especialistas da agência espacial americana, como
Linda Billings, Alotta Taylor e Bert Ulrich.
Por fim, o terceiro capítulo trará a análise documental comparativa das três obras
estudadas: Marooned (1969), Apollo 13 (1995) e The Martian (2015). Um estudo aprofundado
da inserção da marca nos filmes será feito, levando em consideração os temas pesquisados ao
longo do trabalho, de forma a apresentar um panorama confiável da atuação da NASA nos
longa-metragem em questão, assim como a utilização do branded entertainment no
posicionamento da marca ao longo dos anos.
14
1.7 QUADRO REFERENCIAL TEÓRICO
NASA
DICK, Steven J. NASA first 50 years. NASA, 2008. Disponível em:
<https://www.nasa.gov/connect/ebooks/hist_nasa50_detail.html>.
Acesso em 5 maio 2016.
TAYLOR, Alotta. Communication strategy. NASA, 2015.
Disponível em: <http://www.nasa.gov/sites/default/files/files/1-
Taylor-Communication-Strategy-NAC-ATaylor-072015_v8.pdf>.
Acesso em: 5 set. 2016.
THE CENTER FOR CULTURAL STUDIES AND ANALYSIS.
American perception of space exploration: a cultural analysis for
harmonic international and the national aeronautics and space
administration. Washington, 2004.
MÍDIA
KELLNER, Douglas. A cultura da mídia. São Paulo: EDUSC,
2001.
SILVERSTONE, Roger. Porque estudar a mídia? São Paulo:
Loyola, 2011.
INDÚSTRIA
CULTURAL
ADORNO, Theodor W. HORKHEIMER, Max. Dialética do
esclarecimento. São Paulo: Zahar, 1985.
BACCEGA, Maria Aparecida (org.). Comunicação e culturas do
consumo. São Paulo: Atlas, 2008.
CINEMA
MASCARELLO, Fernando. História do cinema mundial.
Campinas: Papirus, 2006.
COVALESKI, Rogério. Cinema, publicidade, interfaces. Curitiba:
Maxi Editora, 2009.
ENTRETENIMENTO E
PUBLICIDADE
DONATON, Scott. Publicidade+entretenimento: por que estas duas
indústrias precisam se unir para garantir a sobrevivência mútua.
Tradução de Álvaro Opermann. São Paulo: Cultrix, 2007.
LEHU, Jean-Marc. Branded entertainment: product placement &
brand strategy in the entertainment business. Kogan Page
Publishers, 2007.
PALACIOS, Fernando. TERENZZO, Martha. O guia completo do
storytelling. Rio de Janeiro: Alta Books, 2016.
MARCAS
BATEY, Mark. O significado da marca: como as marcas ganham
vida na mente dos consumidores. Tradução de Gabriel Zide Neto.
Rio de Janeiro: Best Business, 2010.
15
CAPÍTULO 1: REFLEXÕES SOBRE O CINEMA
2.1 INTRODUÇÃO AO CAPÍTULO
Neste capítulo, analisaremos o meio midiático cinema, tanto como indústria cultural e
mercado, assim como meio de comunicação e seu papel na contemporaneidade. Iniciaremos as
discussões com uma breve história do cinema, para situar-nos no atual panorama da sétima arte,
passando por seu nascimento e evolução. Seguida de uma análise sobre o poder desta como
mídia e formadora de ideias, além de sua relação com a sociedade contemporânea. Algumas
notas sobre técnicas e artifícios, utilizados e aperfeiçoados ao longo dos anos, visando o narrar
eficaz de uma história e, por fim, uma breve discussão sobre a relação entre o cinema e a
publicidade, que servirá de gancho para o próximo capítulo. Para realizar esta discussão, que
abordará frentes distintas da sétima arte, a pesquisa bibliográfica entrará em ação, contando
com historiadores do tema, como Costa (2006), Pucci (2006), Felinto (2006) e estudiosos em
geral, como Gonçalves (2008), Covaleski (2009 e 2013), Bezerra (2013) e Kehl (2005).
2.2 CINEMA: PRIMÓRDIOS E ATUALIDADE
Seria impossível, talvez até prepotente, relatar ainda que resumida, toda a história do
cinema, suas vertentes e personagens de destaque, em um espaço tão curto. Havendo tantos
gêneros distintos, movimentos autorais sem fim, não cabe aqui esta análise. Para uma melhor
discussão e entendimento, iremos analisar trechos específicos, voltados para o tema deste
projeto. Abordaremos as origens do cinema, suas afiliações já precoces com o entretenimento,
as diferentes formas de lazer que o moldaram, e o nascimento de uma indústria, que se renovou
e renova ao longo dos anos, culminando com a adesão à tecnologia digital.
Em seu capítulo do livro História do Cinema Mundial, Costa (2006) oferece uma
reflexão sobre a natureza das origens do cinema. Sendo mais uma das inúmeras invenções que
marcaram o final do século XIX, as primeiras sessões de cinema eram vistas como curiosidades
tecnológicas. Eram utilizadas em atrações de entretenimento, como os cafés parisienses e os
famosos vaudevilles, espaços populares que apresentavam espetáculos curtos e desconexos,
composto de números teatrais, circenses, literários, entre outros. Ambos eram caracterizados
por serem espaços de reunião das classes médias, onde podiam-se ver espetáculos e
apresentações, como declamações de poesias, dramatizações, exibições de curiosidades e
sessões de lanterna mágica, um aparato ancestral aos modernos projetores de fotografias. A
16
autora ressalta o panorama inicial da sétima arte, uma mistura de diferentes formas de
entretenimento e cultura, sem um norte definido, em transformação constante. Afirma que o
cinema, "quando apareceu [...], não possuía um código próprio e estava misturado a outras
formas culturais, como os espetáculos de lanterna mágica, o teatro popular, os cartuns, as
revistas ilustradas e os cartões-postais” (COSTA, 2006, p. 17).
Dos vaudevilles e cafés, as projeções conquistaram seu próprio espaço, os
nickelodeons. Estes espaços, precários e improvisados, atraiam a classe operária, arrebatada
pela novidade e pelos baixos preços (cinco centavos, o nickel americano, como o nome indica),
sendo a responsável pela popularização do cinema, segundo Costa (2006). Atentos ao lucro
potencial a ser ganho com essa indústria, nomes como os irmãos Lumière e Thomas Edison se
tornaram conhecidos, e o sucesso e o deslumbre moveram a inovação. Por fim, ficou evidente
que o cinema poderia ser um entretenimento para todos os públicos. Os enredos se tornaram
mais densos, técnicas foram aprimoradas e as exibições improvisadas deram lugar aos grandes
salões da sétima arte. Em suma, dois períodos são delineados pela autora nesta fase (1894-
1915): o “cinema de atrações”, abrangendo desde o início no vaudeville e até as primeiras
produções ficcionais, exemplificada por Georges Meliès e os nickelodeons, e o “período de
transição”, demarcado pelo aprofundamento psicológico dos personagens e desenvolvimento
da narrativa, assim como um forte assentamento da indústria cinematográfica e a divulgação
do “cinema para todas as classes sociais”.
A partir desta época, presenciou-se o boom da sétima arte, tomando o mundo como
uma das principais forças midiáticas. O que se iniciou de maneira humilde na França e EUA se
espalhou pelo resto da Europa, chegando eventualmente à totalidade do planeta. Movimentos
regionais, como o Expressionismo Alemão e o cinema Soviético adicionaram complexidade à
arte como um todo, criando novos hubs de produção de conteúdo, como a Cinecittà e
Bollywood. No cinema americano, o ponto de virada da indústria foi a crise dos anos 60 em
Hollywood, segundo Mascarello (2006). As causas apontadas são a entrada da TV no mundo
midiático, a queda do número de filmes lançados por ano devido ao alto custo de produção, e
crises políticas internas envolvendo as salas de cinema, na época quase todas propriedades dos
estúdios. A saída da crise, segundo Mascarello, foi a “reconfiguração estética e mercadológica
do blockbuster a partir de 1975, no contexto da integração horizontal dos grandes estúdios aos
demais segmentos da indústria midiática e de entretenimento” (MASCARELLO, 2006, p. 335).
O autor afirma que a criação do modelo moldou o cinema contemporâneo, que continua até os
dias atuais, após Jaws (1975) e Star Wars (1977).
17
Após a reformulação do cinema e a adoção do blockbuster como método de negócio,
chegamos ao fim do século XX e a aplicação de novas tecnologias no âmbito artístico. O autor
Felinto (2006) em seu artigo, aponta para as mudanças geradas no cinema pela inserção digital,
e cita os autores Weibel e Shaw e seu termo expanded cinema. Esses autores descrevem um
cinema que ultrapassa as telas para a vida cotidiana, que se incorpora ao dia a dia, através de
diferentes mídias, aonde a vida se torne arte. Porém, também previam o distanciamento das
culturas de massa: “[...] ultrapassar a linguagem estereotipada e sedutora das mídias massivas
por meio da experimentação com os aparatos eletrônico-digitais” (FELINTO, 2006, p. 415), o
que não ocorreu. Pucci (2006) comenta sobre esse processo e traça uma linha entre o chamado
cinema moderno (segundo ele representado por Godard, Tarkovski, entre outros) e o pós-
moderno, alegando que a diferença seria no trato com a cultura de massas. O cinema pós-
moderno evita se distanciar ou destruir a relação com o público de massa, ao contrário do
moderno, adverso a outras mídias, condenando-as impuras. O pós-moderno as abraça, criando
uma relação intertextual e assumindo um modelo híbrido:
O filme pós-moderno opera com elementos do cinema de entretenimento, do
videoclipe e da propaganda, mas não se trata de submissão a tudo isso. O ar respeitoso
para com produtos da mídia não deve ser confundido com "homenagens", uma vez
que se empreende também sua subversão (PUCCI, 2006, p. 374).
Pucci ainda afirma que esta característica do cinema pós-moderno possui duas faces:
“é sancionada, porque não entra em choque destrutivo com os seus objetos, em geral produtos
da cultura de massa, mas é transgressiva, porque os utiliza de forma descontextualizada,
desconstruindo-os, revelando seu caráter discursivo” (PUCCI, 2006, p. 375). O cinema
contemporâneo adotou a cultura de massa em seu discurso, utilizando-se das ferramentas
digitais, integradas a fundo na indústria, seguindo algumas das ideias do expanded cinema. Ao
mencionar os efeitos especiais, discussão que abrange tanto as tecnologias digitais quanto a
cultura de massa, Felinto (2006) atenta ao impulso pelo real que o ser humano busca. São
essenciais para a construção das realidades apresentadas por Hollywood. Segundo o autor, “essa
pulsão cultural é constitutiva da experiência da imagem no Ocidente, movida continuamente
por um desejo crescente de realismo” (FELINTO, 2006, p. 416). Através dos métodos digitais,
torna-se possível a criação e fusão de gêneros, culminando com a “hibridização entre diferentes
suportes e linguagens no contexto do cinema digital” (FELINTO, 2006, p. 417), e a adequação
a necessidades impostas ao entretenimento pelo consumidor. O fenômeno da tecnologia
acoplada ao entretenimento será debatido no próximo capítulo, aprofundando o diálogo sobre
18
evolução tecnológica, simbiose com o lazer e a adaptação tanto da indústria cinematográfica
como publicitária.
Uma vez apresentada a origem do cinema, é possível perceber a relação que este possui
com o entretenimento. Adaptado em seus primórdios para apresentações em casas de shows e
curiosidades, evoluindo posteriormente para um novo modelo de negócio, ainda mais voltado
para o público e o espetáculo. A adoção da cultura de massa e a reestruturação causada pela
inserção do digital ressaltam um meio em constante mudança, visando adequação perante as
necessidades impostas pelo público. A história do cinema nos permite avaliar que se trata de
uma força midiática de peso, uma verdadeira indústria do entretenimento.
2.3 A MÍDIA E O CINEMA
Ao longo desse estudo, trataremos sobre conceitos midiáticos, tanto relacionados ao
cinema como a publicidade, televisão, internet, entre outros. Distintas abordagens dos autores
estudados, com visões únicas sobre o poder e a influências dos meios midiáticos, contribuirão
para um melhor entendimento dos temas tratados, além de consolidar uma base estável de
termos e conceitos a serem utilizados.
Ao tratar sobre mídia, devemos iniciar com talvez o mais conhecido termo entre
estudiosos de comunicação: a indústria cultural. Proposta por Adorno e Horkheimer (1985) em
seu Dialética do Esclarecimento, envolto no cenário da Segunda Grande Guerra, os autores
afrontaram o mundo em que viviam, alegando a padronização da cultura, transformada em
indústria. Como afirmam em sua obra, “a cultura contemporânea confere a tudo um ar de
semelhança. O cinema, o rádio e as revistas constituem um sistema. Cada setor é coerente em
si mesmo e todos são em conjunto” (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 99). Esse aspecto
industrial atribuído às produções culturais dialoga com o período histórico e as mudanças
culturais testemunhadas pelos autores ao se estabelecerem nos Estados Unidos, destoantes e
mais massificadas que as do continente europeu:
O cinema e o rádio não precisam mais se apresentar como arte. A verdade de que não
passam de um negócio, eles a utilizam como uma ideologia destinada a legitimar o
lixo que propositalmente produzem. Eles se definem a si mesmos como industrias, e
as cifras publicadas dos rendimentos de seus diretores gerais suprimem toda dúvida
quanto à necessidade social de seus produtos (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p.
99).
19
No entanto, ao longo dos anos, outros autores perceberam a necessidade de adaptação
de certas ideias de Adorno e Horkheimer, uma vez que o ambiente cultural e tecnológico havia
evoluído. Um autor que apresenta reformulações para os conceitos circundantes da indústria
cultural, levando em consideração as mudanças socioculturais, é Cohn (2008). Ele reconhece
a importância de se compreender o aspecto situacional, o contexto da obra, e ao comentar sobre
a origem do termo indústria cultural, afirma que veio como uma resposta a outro, a cultura de
massa. De acordo com seus elaboradores, a indústria cultural era mais apropriada para analisar
o mundo contemporâneo, uma vez que invertia a ordem proposta pela cultura de massa, de que
as massas eram as produtoras de cultura. Como vimos, Adorno e Horkheimer viam o cenário
cultural como uma automação de conteúdos antes voltados para a arte: “a indústria cultural
desenvolveu-se como o predomínio que o efeito, a performance tangível e o detalhe técnico
alcançaram sobre a obra, que era outrora o veículo da Ideia [...]” (ADORNO e HORKHEIMER,
1985, p. 103). Segundo os autores, a organização da cultura tinha poder decisivo sobre as
massas, que eram reduzidas a consumidoras de bens culturais.
Cohn (2008) afirma que a junção entre cultura e indústria não pode ser vista como algo
definitivo, a cultura se emaranhando sem saída em meio a produção industrial, que a padroniza
sem escrúpulos. Ao contrário, Cohn revela que “nenhum desses dois polos se realiza
plenamente no processo” (COHN, 2008, p. 67). A cultura perde sua capacidade de organização
e autonomia para decidir a maneira como se relaciona com o mundo, ficando a mercê da
indústria. Esta, no entanto, não pode exercer sua lógica exata em bens culturais, sendo obrigada
a levar em consideração valores intangíveis, estéticos. Dizer que a indústria criou um padrão,
em que “produtos não circulam como portadores autônomos de significados próprios, mas o
fazem na condição de mercadorias” (COHN, 2008, p. 68) é correto, mas não totalmente. A
indústria tem como meta causar efeitos específicos em seus consumidores, modelando seus
produtos para este fim: “Busca respostas a estímulos, e quanto mais padronizadas melhor”
(COHN, 2008, p. 73). O autor ainda ressalta a importância do fator humano, uma vez que a
indústria cultural, não sendo uma força todo-poderosa, deve se dispor de meios não autoritários
para exercer sua soberania. Os mecanismos sociais utilizados, segundo Cohn (2008), “chegam
a desembocar na própria psique individual”.
Tratando da mesma influência que a indústria cultural possui nos indivíduos, Kehl
(2005) traz uma abordagem distinta, utilizando o conceito da imagem. Mesmo que não
mencionando o cinema diretamente, pode-se inclui-lo na discussão da autora, por se tratar de
um meio midiático de muita importância, presente na criação e divulgação de conteúdo.
Segundo ela, estamos em um ciclo vicioso, no qual acumulamos capital (catalogado como
20
imagens em seu artigo) inadvertidamente, em nossos momentos de lazer e conforto. Não existe
liberdade de opção segundo Kehl, o indivíduo escolhe dentre uma seleção determinada pela
indústria, onde todas são efetivamente a mesma escolha. Explica com suas palavras “A
alienação, no modo de produção do capitalismo avançado que é, predominantemente, produção
de imagens, abarca a todos na medida em que as imagens convocam a todos, sem exceção”
(KEHL, 2005, p. 239), mas também cita Adorno e Horkheimer, como forma alternativa de
explicação:
O princípio impõe que todas as necessidades lhe sejam apresentadas como podendo
ser satisfeitas pela indústria cultural, mas, por outro lado, que essas necessidades
sejam de antemão organizadas de tal sorte que ele se veja nelas unicamente como um
eterno consumidor, como objeto da indústria cultural (ADORNO; HORKHEIMER,
1985, p. 133).
Segundo a autora, “Imagens enunciadas por ‘ninguém’ e dirigidas a ‘todos’ são hoje
o principal produto da cultura de massas” (KEHL, 2005, p. 237), transmitidas a toda velocidade
de forma sedutora e abrangente e seguindo os padrões da cultura de massas, proporcionando
experiências sempre novas e rentáveis para a indústria. Kehl relata a fetichização dos objetos,
muitas vezes via corpos de seres humanos célebres, os ídolos de massa, que atuam como
contraponto da mediocridade e banalidade da vida do indivíduo comum, mostrando todo o luxo
e esplendor que a indústria cultural os oferece. A sociedade é obcecada pela fama, “o espetáculo
promove a afirmação da vida humana como visibilidade: existir hoje é ‘estar na imagem’”
(KEHL, 2005, p. 242).
Bezerra e Covaleski (2013) dão continuidade as ideias apresentadas, agora com foco
na atualidade. Comentam sobre os consumidores contemporâneos, que segundo eles se
distanciaram da comunicação em massa praticada décadas antes, para algo mais refinado. Estes
mesmos “não são passivos às mensagens que recebem e não absorvem produtos ou ideias sem
uma recepção crítica” (BEZERRA; COVALESKI, 2013, p. 124). Essa visão atual do papel do
expectador no consumo de conteúdo leva em consideração os avanços feitos na área digital,
permitindo uma maior escolha por parte do receptor:
O consumidor contemporâneo – em sua maioria – não é passivo, deixou para trás a
identidade da submissão; é agora, sim, ativo, projeta-se à participação e à colaboração.
Domina e faz questão de usar os mecanismos de interação; produz e dissemina seu
próprio conteúdo; é o dono da sua liberdade para o consumo e influencia o de seus
pares (BEZERRA; COVALESKI, 2013, p. 122).
21
Assim como Bezerra e Covaleski, uma leva de autores analisa o poder do consumidor,
agora capaz de escolher o conteúdo e rejeitar o que não lhe interessa. Kellner (2001), por
exemplo, renega a ideia de uma mídia todo-poderosa, manipuladora do ser humano. Para ele,
existiria um equilíbrio entre as forças, diferente do que se propõe na Escola de Frankfurt. Sobre
esta, afirma que devem ser revisitadas, uma vez que a evolução da sociedade e a introdução dos
meios digitais contribuíram para a reestruturação da mídia como um todo. De maneira similar,
opõe-se aos pensadores de Frankfurt, que abstraem a imagem veiculada pela mídia de seu
conteúdo ideológico, evidenciando a destruição da simbologia e significado de ditas imagens.
Ao contrário, o autor enaltece a importância dos significados e valores das imagens da cultura
da mídia, assim como o processo de construção das mesmas. Entende que um texto não está
contido em sua forma física, mas que está inserido em um sistema ideológico e, portanto, é
necessária uma análise aprofundada, afim de entender sua construção intertextual.
Como visto, a discussão sobre a indústria cultural, sua relação com o consumidor e a
retomada da influência deste no processo de consumo leva a visões distintas de como analisar
esse fenômeno. Há um claro embate entre os que veem a mídia como geradora de mensagens
altamente genéricas ou específicas. Analisando a relação do cinema com esses pensamentos, a
autora Gonçalves (2008) relata o caráter inevitável da reprodução industrial no meio
cinematográfico, uma vez que se trata do cerne dos negócios desta forma de arte. Abordando
em seu artigo conceitos de Walter Benjamin relacionados a obras de arte no mundo
contemporâneo, menciona como a reprodutibilidade em grande escala retirou o caráter único
da obra de arte, a chamada aura. Como causas, afirma que Benjamin acusa a necessidade da
proximidade e humanização do conteúdo e a preferência da reprodução ao único. Com o
surgimento de novos meios, a reprodução artística impossibilitou o aspecto único e tradicional,
dando lugar a um envolvimento mais íntimo com a política e o capital. E isso não foi diferente
com o cinema, segundo Benjamin possuindo características únicas que tornam esse processo
inevitável:
A reprodutibilidade técnica do filme tem seu fundamento imediato na técnica de
reprodução. Esta não apenas permite de forma mais imediata a difusão em massa da
obra cinematográfica, como a torna obrigatória (BENJAMIN, 1987 apud
GONÇALVES, 2008, p. 2).
Sendo um processo árduo e caro, a criação de um longa-metragem requer difusão em
grande escala para gerar lucro, de forma que o cinema foi atrelado aos interesses políticos e
econômicos, já mencionado no tópico anterior, e a indústria cultural. Gonçalves (2008) cita um
22
exemplo que demonstra a necessidade da alta veiculação como forma de lucro: a criação do
cinema falado, que se provou inicialmente um retrocesso, pois limitava o alcance devido a
barreiras linguísticas. A expansão veloz da nova mídia, atrelada ao alto número de pessoas
impactadas, faz do cinema uma força cultural, que requer essa expansão para manter-se.
Em suma, a mídia, incluindo o cinema, passou por diversas interpretações a respeito
de sua natureza ao longo dos anos. Os conceitos de comunicação midiática são reavaliados e
retrabalhados ad eternum, adaptando-se a novos entrantes no cenário. Há os que acreditam no
caráter industrial e genérico da indústria, enquanto outros reconhecem a individualização e
especificação dos conteúdos. Alguns dos autores citados escreveram seus artigos antes do boom
da internet, sem entrar em contato com meios de veiculação de conteúdo como Youtube e
Netflix, que certamente revolucionaram a maneira de se consumir produtos midiáticos. Deve-
se entender a progressão feita, e adequar-se de acordo, aceitando visões distintas para compor
um panorama geral da mídia. Uma vez endereçado o aspecto midiático, é hora de tratar do
cinema em específico, de sua influência e veiculação.
2.4 CINEMA COMO VEÍCULO E INFLUÊNCIA CULTURAL
Covaleski (2009), em poucas palavras, define o impacto que o cinema causou e ainda
causa na sociedade, cultural e psicologicamente: “O cinema é claramente uma das expressões
artísticas mais consumidas e cultuadas, alimentando o imaginário coletivo de pessoas ao redor
do mundo, a mais de um século” (COVALESKI, 2009, p. 17). Por mais que não aparente ser
um tema de relevância para este trabalho, o impacto da mídia afeta de maneira direta e clara na
produção de conteúdo. Como o próprio autor cita em seu livro Cinema, Publicidade, Interfaces,
tanto o cinema como a publicidade se relacionam de maneira simbiótica na troca de
informações, tendências, entre outros. Portanto, neste tópico iremos abordar os aspectos da
sétima arte referentes à mecanismos utilizados na veiculação das ideias, assim como as ideias
em si, a gama de influências geradas por esse meio. E como a atuação dos dois moldou o
ambiente a nossa volta, incluindo as obras escolhidas para análise nesta pesquisa.
Retomamos Gonçalves (2008) que aborda conceitos de Walter Benjamin. Este adota
uma postura ambígua ao julgar o cinema, uma vez que considera que seus benefícios e
malefícios são provenientes de uma era que já estava sendo organizada, com novas maneiras
de se comunicar, de criar arte e de se expressar. Segundo Benjamin, o cinema providenciou um
aprofundamento da percepção humana, com imagens que contém inúmeros significados, assim
como o aumento da capacidade onírica do indivíduo. No entanto, o receptor absorve toda a
23
informação de maneira tátil, ou seja, tudo que possui caráter sensível o atinge. Para evitar uma
possível sobrecarga, o cinema se utiliza da distração ou como vamos ver posteriormente, o
entretenimento. Estas assumem a forma de fragmentos de informação, as cenas, que servem
para quebrar o fluxo de ideias do espectador. Por sua vez, estes amortecimentos de choques
criaram uma sociedade habituada a este tipo de percepção, resultando em relações “mutiladas”
e um público capaz de se distrair e ao mesmo tempo examinar o que passa na tela, uma espécie
de “crítico distraído”. Apoiando-se em Freud, Benjamin (1997 apud GONÇALVES, 2008, p.
5) conclui “quanto mais corrente se tornar o registro desses choques no consciente, tanto menos
se deverá esperar deles um efeito traumático”, desse modo transformando a experiência em
vivência.
Sob uma nova ótica, vimos que outros autores reconhecem o poder da narrativa como
construtor, independente ela qual seja, como é o caso de Silverstone (2011) que introduz
mecanismos componentes do engajamento textual, a relação mensagem-receptor, sendo eles a
retórica e a poética. A primeira pode ser explorada como um aspecto da mídia e uma ferramenta
de análise. A linguagem midiática tem o objetivo de influenciar e cativar, e, portanto, deve se
basear na diferença e na liberdade (seria ilógico tentar convencer alguém que não tem escolha).
Para uma comunicação mais eficiente, a retorica implica um certo grau de identidade entre o
orador e o receptor, podendo se utilizar dos “lugares comuns”, conceitos e ideias que são
compartilhados por uma comunidade e dados como senso comum.
Já a poética, de forma similar, se utiliza de seu público e sua necessidade de
participação. Silverstone afirma que nós, como audiência ou oradores, convertemos tanto
experiências como imaginação em histórias. Ao consumir uma história, estamos essencialmente
analisando a capacidade de articulação desta dentro da nossa cultura comum. Como afirmado
pelo autor: “Procuramos compreender os ritmos de sua narrativa, sua caraterização, suas
maneiras de representar um mundo reconhecível” (SILVERSTONE, 2011). Suas ideias
contrastam as de Walter Benjamin, que lamenta o declínio da história na modernidade, sendo
soterrada pelo excesso de informação proveniente da mídia. Silverstone acredita no potencial
da mídia como proliferadora de histórias, que o consumidor pode se relacionar estes produtos
com a experiência. Com diversas mídias impulsionando, a história se tornou uma mercadoria
no mundo, como veremos ao tratar de storytelling no próximo capítulo.
Covaleski (2009), por fim, apresenta uma visão menos fatalista da influência do
cinema em nossas vidas. Nos lembra da dualidade deste, ao mesmo tempo realista e artística.
Segundo ele, se trata de um meio em constante evolução, construindo, aperfeiçoando e se
adaptando novos procedimentos e narrativas. Ao abordar conceitos como repertórios e criação
24
de informações, de forma semelhante à Benjamin, afirma que o conjunto de ideias oriundas da
vivencia individual constitui o imaginário único, que distingue uma pessoa de outra. Nas
palavras de Costa (2002):
O conhecimento é o resultado de processos mentais que vão modificando a imagem –
síntese da relação que mantemos com dado fenômeno – até transforma-la em uma
ideia que, além dos dados dos sentidos, envolve valores, afetividade e a relação da
nova experiência com imagens anteriores armazenadas em nossa memória (COSTA,
2002, p. 86).
Estas ideias se relacionam com a reprodução mecanizada do cinema, mas também com
o surgimento de novos mecanismos, tanto de comunicação como artísticos, que permitiram
novas abordagens e olhares. Este meio providencia ao público experiências sensoriais, atrelada
à aura mítica providenciada pela mídia, gerando emoções e tendências consumistas.
Continuando com abordagens similares a autores já citados, agora tratando da
linguagem cinematográfica, algo semelhante as distrações de Benjamin, Covaleski (2009)
remete aos primeiros estudiosos do tema, que visavam entender os efeitos gerados pelos longas-
metragens, assim como entender quais efeitos contidos em ditas obras acarretariam reações
favoráveis do público. Como afirma, “a linguagem trabalhada pelo cinema induz o espectador
a consumir algo intangível, porém carregado de significados e simbolismos, os sonhos”
(COVALESKI, 2009, p. 71). Estes sonhos, por sua vez, seriam transformados em bens de
consumo, tudo podendo ser oferecido ao espectador mediante a ilusão do cinema. Covaleski
também escreve sobre o repertório cinematográfico, afirmando:
A recepção que cada público da à mensagem a que está exposto gera uma construção
de significação própria em cada indivíduo, a partir da atividade cognitiva que todo
receptor possui. Essa atividade atua sobre uma base de índices e códigos que são
identificados na mensagem. Mas além de eventuais operações de ordem cognitiva, há
também traços de referencias culturais e sociais com os quais o indivíduo tenha se
relacionado (COVALESKI, 2009, p. 86).
De maneira semelhante, Kellner (2001), como Silverstone, analisa os textos
transmitidos pela mídia, e como estes influenciam na construção de identidade e
comportamento. Preocupa-se com a influência do excesso de informação na sociedade, algo
que veremos posteriormente com Lehu (2007), mas afirma que os indivíduos têm o poder de
aceitar ou rejeitar possíveis estímulos formadores de identidade. Percebe-se que, assim como
na mídia, a influência cinematográfica na construção de referenciais e imagens é um tema não
totalmente homogêneo, com vertentes afirmando conclusões distintas, baseadas na capacidade
de escolha e influência que nós, como receptores, possuímos perante ela. A seguir veremos
25
como os conceitos estudados se aplicam ao comparar o mundo cinematográfico com o da
publicidade.
2.5 RELAÇÃO CINEMA - PUBLICIDADE
Desde sua criação, o cinema apresenta traços cada vez mais firmes com a publicidade.
Costa (2006) menciona uma estratégia desenvolvida pelos irmãos Lumière, onde “ofereciam
um esquema de marketing muito interessante para os vaudevilles, seu alvo predileto no
mercado. Eles forneciam os projetores, o suprimento de filmes e os operadores das máquinas,
e se encaixavam nas programações locais” (COSTA, 2006, p. 20). Houve também a competição
das salas de cinema pela preferência do espectador. Antes da crise que afetou a chamada “era
de ouro” do cinema americano, a maioria das salas de cinema do país eram propriedade dos
próprios estúdios cinematográficos, que disputavam entre si pela atenção do público, seus
produtos e diferenciais mercadológicos sendo os próprios filmes.
De maneira similar ao cinema, a publicidade evoluiu ao longo dos anos. Adaptou-se
conforme novas mídias eram introduzidas ao mercado, como rádio e televisão, e a chegada da
internet fez com que o mercado tivesse novamente que se reinventar. A publicidade
inicialmente era utilizada para comunicar o maior número de pessoas possível, de maneira
massificada e pouco complexa, como nos diz Bezerra e Covaleski (2013). Com o passar dos
anos, não só os meios de comunicação evoluíram, mas também o consumidor.
Como vimos anteriormente, o consumidor sofreu alterações na maneira como interage
com o mundo. Antes mais próximo do modelo apresentado por Benjamin e Kehl, sem grande
poder de escolha e discernimento, consumindo “imagens enunciadas por ‘ninguém’ e dirigidas
a ‘todos’” (KEHL, 2005, p. 237), transitando para algo mais próximo de Kellner, Silverstone e
Covaleski, um indivíduo capaz de escolher e rejeitar aproximações midiáticas que não lhe
interessem, tendo “o poder de escolha e, consequentemente, a possibilidade de criar bloqueios
e propor intervenções às mensagens publicitárias” (BEZERRA; COVALESKI, 2013, p. 127).
Isso significa dizer que a publicidade, assim como outros meios, teve que adaptar as mudanças,
criando novos métodos de interação com o público alvo. Se distanciando da enorme quantidade
de conteúdo disponível, ruído que dificilmente alcança seu interlocutor, o marketing apostou
no entretenimento como novo meio de comunicar-se com o consumidor.
Eventualmente, as duas mídias se aproximariam ainda mais, em parte pela hibridização
das comunicações, juntamente com o desenvolvimento da tecnologia digital. Nesse momento,
o cinema aprofundou uma característica que vinha sendo anunciada há anos: sua relação com a
26
cultura de massa. Retomamos Pucci (2006), e seu debate entre o cinema moderno e o pós-
moderno, a diferença sendo o trato com a cultura de massas. Ele ainda ressalta, como já vimos,
que se tratando do cinema, essa relação nunca foi submissa:
O filme pós-moderno opera com elementos do cinema de entretenimento, do
videoclipe e da propaganda, mas não se trata de submissão a tudo isso. O ar respeitoso
para com produtos da mídia não deve ser confundido com "homenagens", uma vez
que se empreende também sua subversão (PUCCI, 2006, p. 374).
Com as novas tecnologias apontado para um futuro cada vez mais integrado e
vinculado ao entretenimento, o desafio dessa nova reorganização da publicidade está em sua
inserção orgânica nesses meios. Em uma era onde a tecnologia e a variedade de formatos
permitem que o consumidor possa simplesmente pular ou ignorar seu anúncio, se tornou vital
a simbiose com o conteúdo, sem que o anúncio se torne efusivo demais e desequilibre essa
delicada relação. Uma inserção bem colocada, o chamado branded entertainment, faz o
consumidor “refém”, incapaz de ignorar a publicidade. “Você não tem como pular a cena em
que aparece o produto sem pular, no ato, uma parte do programa” (DONATON, 2007, p. 38).
Veremos a seguir como a reestruturação da publicidade permitiu uma nova era de anúncios em
veículos já consolidados.
2.6 CONSIDERAÇÕES
Neste capítulo foram apresentadas as origens do cinema, sua evolução e relação com
a tecnologia, influência midiática, assim como a afinidade com o entretenimento e a
publicidade. Pôde-se perceber que o modo de se fazer entretenimento e de se consumir foi se
alterando, de acordo com a entrada de novas tecnologias, assim como a evolução na sociedade.
Como a relação entre essas duas forças se manteve após a chegada da internet e a reformulação
dos meios de comunicação com o consumidor? Depois de estudar a mídia repercutida no
cinema, assim como o papel deste como veículo e influência cultural, percebe-se o poder desse
meio na divulgação de ideias via entretenimento. Como departamentos de marketing se
apropriam desse aspecto para divulgar seus produtos? Estes temas serão analisados no próximo
capítulo quando abordaremos detalhes desta relação.
27
CAPÍTULO 2: BRANDED ENTERTAINMENT
3.1 INTRODUÇÃO AO CAPÍTULO
Neste capítulo analisaremos o significado de Branded Entertainment e suas aplicações
na publicidade e sistema de comunicação de marcas.
Inicialmente, abordaremos o conceito de marca, através de Batey (2010), para melhor
sedimentar as discussões que se seguirão. Depois, analisaremos a transformação do mundo
midiático, com a pulverização de conteúdo, e como isso evoluiu para novos métodos de se
comunicar a marca ao consumidor. Discorreremos sobre o entretenimento como poder cultural
e a marca aplicada a esse contexto, por meio de Lehu (2007), Donaton (2007) e Palacios e
Terenzzo (2016). Por fim, traremos a marca NASA para os conceitos estudados, uma vez
compreendidas as relações da marca com o entretenimento, analisaremos sua atuação no
cinema.
3.2 A MARCA E SUAS CARACTERÍSTICAS
Sendo o objetivo deste trabalho compreender a transformação da marca NASA através
do Branded Entertainment, iniciamos uma análise sobre o conceito de marca. Em sua obra O
Significado da Marca, Batey (2010) apresenta uma abordagem contemporânea sobre a natureza
destas, defendendo a importância dos significados que retém com seu público. Segundo ele, é
“a percepção do consumidor e sua interpretação de um agrupamento de atributos, benefícios e
valores associados a ela. [...] Uma marca é um agrupamento de significados” (BATEY, 2010,
p. 31).
Marcas são objetos simbólicos, que legitimam a identidade do consumidor. Por sua
vez, identidades são construídas através da satisfação de necessidades oriundas dos próprios
consumidores, e possuem grande valor para uma empresa, pois são chave no processo de
tomada de decisão. Tratam-se de exigências biológicas e psicológicas, com diferentes níveis de
complexidade, desde um caráter utilitário e racional até aspectos simbólicos, como senso de
experiência e legitimação de identidade. Batey afirma que necessidades podem se sobrepor e
se transformar, de acordo com o contexto do indivíduo e o espaço de tempo dado, como que
num fluxo constante de adaptação e afirma:
28
O ponto interessante a se notar em relação ao significado de uma marca é que, uma
vez que as necessidades básicas tenham sido materialmente satisfeitas, os aspectos
mais importantes culturalmente começam a se impor, e as pessoas se preocupam mais
com o significado simbólico dos bens do que com seu uso funcional (BATEY, 2010,
p. 40).
Entendida a fluidez com que as necessidades se criam e se modificam, deve-se
mencionar que, assim como um consumidor pode possuir diversas necessidades, uma marca
pode e deve satisfazer diversas necessidades simultaneamente. Segundo Batey, um consumidor
tem necessidades concomitantes, funcionais, emocionais e outras ao mesmo tempo, como uma
pasta de dentes que “combate cáries e dá hálito fresco e atraente”.
Sobre a relação marca-consumidor, o autor comenta sobre a mudança de escopo na
comunicação das marcas. Em comparação com táticas antigas de marketing, que dialogavam
apenas pelo âmbito funcional e prático, o autor afirma que atualmente se presta especial atenção
ao aspecto emocional, para atrair e conquistar definitivamente o consumidor. Cita Gordon, que
de maneira semelhante afirma:
As marcas são codificadas na memória de uma base cognitiva (pensada, analisada,
considerada) e emocional (somática). Esses dois elementos da codificação de uma
marca são umbilicalmente ligados e determinam se as pessoas prestam ou não atenção
aos estímulos vindos da marca (GORDON, 2002 apud BATEY, 2010, p. 194).
O significado de uma marca provém de uma associação entre os fatores citados.
Ambos em uso garantem um maior alcance e capacidade de atenção e retenção do consumidor.
Batey completa: “O significado de uma marca é estabelecido a partir de como ela é percebida
pelo público em nível consciente e de como ela age dentro dele no nível semi ou subconsciente”
(BATEY, 2010, p. 189).
O autor faz menção às ideias de Keller (1998 apud BATEY, 2010, p. 198), que
comenta sobre ditas associações, denominadas associações somáticas de marcas. Mecanismos,
segundo ele, que conectam experiências e sensações à produtos ou empresas, sendo dividas em
3 grupos: atributos, que podem ou não estar relacionados à marca. Os relacionados constituem
os significados concretos de uma marca (função, contexto de uso), enquanto os não
relacionados os significados simbólicos (percepção da marca, imagem do usuário); benefícios,
que ditam a maneira como uma marca pode resolver um problema ou facilitar a vida do
consumidor, com facetas distintas (Funcionais, sensoriais, expressivos e emocionais); atitudes,
que se referem a ao quanto é desejável que uma marca possua os atributos e benefícios que
possui, podendo ser entendido como respostas afetivas dos consumidores para com a marca.
Sobre essas associações, Keller (1998 apud BATEY, 2010, p. 208) propõe uma estrutura onde
29
“a marca forte se diferencia, em primeiro lugar, pela relativa força de suas conexões, depois
pelo grau com que elas são avaliadas como sendo desejáveis pelos consumidores e, finalmente,
pela característica única dessas associações”.
Batey (2010) propõe que o significado principal de uma marca se constitui das
principais associações feitas, da maneira como o consumidor define a marca, seus atributos e
imagem. Entender sua natureza é essencial para uma marca manter sua comunicação focada.
Não raro, a percepção que uma marca tem de si mesma pode ser destoante da percepção de seus
consumidores. A comunicação deficiente, segundo o autor, pode gerar decisões equivocadas.
A marca deve estar atenta à sua identidade, uma vez que esta tem papel central na percepção
do consumidor. Batey (2010) afirma que as marcas possuem um papel de destaque na
construção da identidade deste. O consumidor “não é mais que um ator em busca de uma
identidade [...] O homem pós-moderno se constrói ao redor da imagem que ele projeta para os
outros na cultura do consumo” (LEARY; KOWALSKI, 1990 apud BATEY, 2010, p. 70). As
que apelam para experiências, motivações e arquétipos criam relações emocionais fortes com
seus consumidores. Batey (2010) corrobora esse pensamento ao afirmar que ao abordar
arquétipos, uma marca se comunica com a ancestralidade, simbologias que são comuns a todos
e, portanto, se conecta mais profundamente com seus consumidores.
3.3 BRANDED ENTERTAINMENT
Uma vez entendida as características da marca e a necessidade de interação com o
consumidor, proveniente de diferentes ângulos, deve-se compreender que esse fato isolado não
garante o sucesso de uma empresa. Deve-se também entender as mudanças no ambiente
midiático e saber como melhor posicionar-se diante destas. Assim como visto em Kellner
(2001), autores como Lehu (2007) e Palacios e Terenzzo (2016) discutem a evolução do cenário
em questão e apontam para a saturação completa de todos os meios de comunicação, em todo
o mundo. Comparado com décadas anteriores, a contemporaneidade conta com a pulverização
de tanto marcas quando canais. Sobre isso, Lehu diz: “Existem centenas de estações de rádio e
canais de televisão [...], milhares de jornais diários ou revistas, dezenas de milhões de sites na
internet [...], de modo que uma vida inteira nesse planeta não seria longa o bastante para lê-los
todos”2
(LEHU, 2007, p. 26, tradução do autor). O advento da internet de banda larga acelerou
2
“There are hundreds of radio stations and television channels [...], thousands of daily newspaper or
magazine media, tens of millions of internet sites [...], so that an entire lifetime on this earth would not be long
enough to read them all.”
30
vertiginosamente o processo, de forma que nem todos estão totalmente adaptados a esse novo
panorama.
Para Lehu (2007) a linearidade e estabilidade dos modelos de comunicação não
existem mais, a explosão de conteúdos fragmentou a audiência. Segundo o autor, isso significa
entender e abraçar a metamorfose sofrida pela sociedade, criando novos mecanismos adequados
para o novo panorama midiático: “Essa conclusão convida a uma contemplação mais atenta do
conteúdo – de forma a tentar reter a atenção de alguns poucos consumidores – e das
possibilidades de colocar a marca em uma boa posição”3
(LEHU, 2007, p. 28, tradução do
autor). Em meio a inúmeras marcas disputando a atenção do consumidor, tornou-se mais
relevante buscar um público correto, que se relaciona com a marca, do que simplesmente
procurar o canal com enormes audiências. A marca deve ir ao consumidor, e não o contrário.
A quebra de antigos modelos, como horários de trabalho, momentos de lazer e a própria
estrutura familiar fez com que a mobilidade e praticidade se tornassem um padrão na vida
moderna.
Analisando o cenário contemporâneo e ainda ressaltando a saturação vivida pelos
meios de comunicação, Lehu (2007) aponta para o problema da televisão, que perde cada vez
mais espaço para filmes e séries no modelo stream. Neste, o espectador não pode ser exposto a
comerciais, uma vez que podem ser puladas ou mesmo suprimidas antes de sua
disponibilização, fazendo com o investimento no famoso modelo “30 segundos” perca parte de
seu atrativo. Como visto em Covaleski, Silverstone e Kellner, o consumidor agora se tornou
mais crítico quanto ao conteúdo que recebe, uma vez que os avanços tecnológicos permitem a
escolha do que consumir.
Lehu (2007) também evidencia o crescimento dos videogames, que “raptam” por
grandes períodos de tempo possíveis espectadores, em horários considerados “chave” na
perspectiva do advertising. Trata-se de um meio invejável do ponto de vista dos anunciantes,
pois “não só os jogadores são frequentemente leais a seus videogames, como também estão
concentrados em suas telas, uma combinação bastante desejada por anunciantes”4
(LEHU,
2007, p. 27, tradução do autor). O autor ainda relata que a nova geração, os chamados millenials,
que cresceram com a internet, passam mais tempo nesta do que na TV. Um comportamento que
dificulta a comunicação efetiva dos anunciantes tradicionais com seu público.
3
“This conclusion invites more attentive contemplation of the content – in order to attempt to retain the attention
of a few consumers – and of the possibilities of placing the brand in a good position there.”
4
“not only are the players often loyal to their videogames, but they are also concentrated on their screens, a
combination much sought-after by advertisers.”
31
Atento aos novos formatos midiáticos que surgiram, Lehu (2007) evidencia a procura
das marcas para colocarem-se em locais inusitados, com alta visualização que possa
surpreender e sensibilizar o espectador desejado. A atenção do marketing volta-se para a
internet, com suas múltiplas formas de comunicação, cada vez mais consolidada omnisciência
e custos relativamente baixos. Com o seu auxílio, ações digitais, promovendo interação marca-
consumidor estão se fixando no mercado. Esse movimento promove o afunilamento do público-
alvo para um maior e melhor impacto e coloca inserções em situações cotidianas, próximas ao
consumidor. Novos meios de comunicação surgem com frequência, oferecendo novas
possibilidades de inserções para as marcas. Para melhor aproveita-los, deve-se haver coerência
na estratégia de comunicação por parte das empresas, nesta expansão para novos meios,
levando-se em consideração os atributos e personalidade de cada empresa. O autor
complementa:
Para existir, uma marca deve ser conhecida: não necessariamente por todos, mas a
todo momento por aqueles que provavelmente comprarão seus produtos. Para que isso
ocorra, ela deve ser posicionada em todos os lugares estratégicos que a permitirão se
conectar com esta audiência em potencial 5
(LEHU, 2007, p. 18, tradução do autor).
Dessa forma, tornou-se necessário para marcas diversificarem suas inserções no
ambiente midiático, de forma a melhor impactar o consumidor. Lehu (2007) apresenta o
product placement como modo de garantir a visibilidade no meio audiovisual. A marca é
inserida dentro de uma obra, fazendo parte do cenário e podendo até interagir com os
personagens. Sabendo que o conteúdo disponibilizado na internet, muitas vezes pelas próprias
emissoras (HBO, Amazon, Netflix, entre outras), dispensa blocos comerciais, o product
placement se torna uma opção que contorna essa tendência. Desse modo, “a vantagem do
product placement é que, até hoje, não pode ser evitado”6
(LEHU, 2007, p. 33, tradução do
autor). Ainda que exista a possibilidade de borrar a marca em uma transmissão esportiva, por
exemplo, esse recurso atualmente não existe em larga escala.
Ainda que resolva parcialmente o dilema da exposição da marca, o product placement
não oferece, pelo menos não a princípio, a já mencionada e necessária conexão emocional entre
marca e consumidor. Lehu (2007) aponta para a necessidade de marcas possuírem um elo
5
“In order to exist, a brand must be known: not necessarily by everyone, but in every event by those who are likely
to buy its products. For this to occur, it must be placed in all the strategic locations that will enable it to connect
with this potential audience.”
6
“the advantage of product placement is that, to date, it cannot be avoided.”
32
emocional com seu público: “O poder do depoimento feito por um amigo ou familiar a favor
de uma marca não tem nada em comum com o aspecto randômico de um argumento publicitário
apresentado em cerca de 30 segundos durante uma pausa comercial na televisão”7
(LEHU,
2007, p. 224, tradução do autor). No passado, muitas empresas não levavam em consideração,
ou simplesmente ignoravam, o fato de suas marcas possuírem personalidades e identidades. É
preciso entender que uma marca “viva” não é propriedade exclusiva de seus donos, mas também
de seus consumidores. Para viver, elas devem compartilhar emoções, criar desejos e
necessidades, fazerem parte do cotidiano e emocional de seus usuários.
É nesse contexto mercadológico e midiático que surge o Branded Entertainment.
Adaptado do product placement, apresenta um grau mais elevado de sofisticação no sistema de
comunicação com o consumidor, sendo uma resposta a falta de atenção do espectador
contemporâneo. Mais do que simplesmente estar inserida no cenário, a marca se coloca no
contexto narrativo relevante para a história. Sua presença no roteiro é orgânica, longe de ser um
placement tradicional, demasiado óbvio. Dessa maneira, uma marca pode interagir
profundamente com o público, estando inserida em situações emocionais genuínas, permitindo
uma melhor conexão marca-consumidor. Segundo Lehu (2007), não se deve ver o Branded
Entertainment como mais um vetor de comunicação, e sim, um veículo que possibilita a
oportunidade de criar laços emocionais entre marca e espectador: “[branded entertainment]
contribui para o awareness da marca a curto prazo, mas também para sua imagem e todos os
seus elementos constituintes no médio a longo prazo” 8
(LEHU, 2007, p. 244, tradução do
autor).
Esse modo distinto de se divulgar uma marca, atrelando-a ao aspecto emocional do
consumidor, é analisado por Palacios e Terenzzo (2016), sob a ótica do storytelling. Segundo
os autores, é através de histórias relacionadas ou protagonizadas por uma marca que o
consumidor se conecta, criando um posicionamento de mercado único através do viés
emocional. Quando genuínas, essas conexões geram confiança, sendo impossíveis de serem
copiadas. Esse aspecto se relaciona com o que afirma Silverstone (2011) e a relação
consumidor-produto através da história. Os autores comentam sobre os benefícios de tal
conexão:
Uma marca envolvente pode proporcionar inúmeros benefícios para um negócio. A
primeira é que permite preços maiores pois o consumidor enxerga maior valor quando
7
“The power of testimonial by a friend or family member in favour of a brand has nothing in common with the
random aspect of an advertising argument presented over 30 seconds during a commercial break on television.”
8
“(branded entertainment) contributes to short-term awareness of the brand, but also to its image and all its
constitutive elements in the medium to long term.”
33
o produto ou serviço vem acompanhado de uma marca com uma boa história
(PALACIOS; TERENZZO, 2016, p. 267).
Por meio do branded entertainment e do storytelling, uma marca com alto valor
emocional agregado remete em seu consumidor uma expectativa pré-estabelecida, provenientes
de experiências anteriores. Escolhas são feitas baseadas nesse aspecto, e podem ter maior força
no momento da compra do que concorrentes com produtos tecnicamente “melhores”. Marcas
desse tipo atraem seguidores, fãs que a idolatrarão e perdoarão eventuais deslizes. Segundo os
autores: “Na mente do consumidor, as histórias facilitam a gestão das expectativas da marca”
(PALACIOS; TERENZZO, 2016, p. 268). E mais, uma vez alcançado esse patamar, torna-se
mais fácil para uma marca manter esse status como afirmam os autores:
A partir do momento que temos uma base de pensamento, as novas informações
devem ser imputadas para reforçar aquela percepção inicial. Sempre que você
simpatiza, admira ou até idolatra alguma marca, você assimila novas informações para
que esse sentimento continue sendo verdadeiro (PALACIOS; TERENZZO, 2016, p.
61).
Esses fatores foram testados de forma pioneira no case da BMW, “The Hire”.
Concebido em 2001, em uma época onde os conceitos de branded entertainment e storytelling
ainda não eram amplamente divulgados e praticados pelo mercado, a BMW se propôs a inovar,
como o autor Donaton (2007) comenta. Produzidos ao longo de dois anos, a série de comerciais
contou com diretores hollywoodianos e superproduções cinematográficas. A marca viu-se
apostando em formatos que não possuíam garantia de sucesso. Deu liberdade criativa quase
total aos diretores, abrindo caminho para a narrativa e insights destes. Mais, tanto a marca como
os carros da BMW mal têm destaque nas peças, e são colocados em situações bastante adversas.
A divulgação das peças não foi feita via televisão, como era o padrão até então, mas sim via
internet. Em uma era pré-Youtube, as pessoas eram incentivadas a baixarem os vídeos no site
oficial da marca.
Ao contrário do que se imaginava, a campanha foi um sucesso retumbante. As vendas
cresceram 12,5% nos três anos consecutivos, e a imagem da marca foi fortalecida para o público
jovem, usuário de internet e o principal impactado pela campanha, até então fora do escopo da
BMW. Donaton (2007) afirma que o sucesso provou a capacidade de interação do consumidor
via um novo veículo, focado na relação emocional com seu público. Os curtas vendiam não
produtos, mas a identidade da marca. Estes se tornaram um estudo de caso de sucesso sobre a
veiculação de uma marca via entretenimento.
34
Uma vez entendido o panorama midiático contemporâneo, assim como as diversas
saídas que marcas tem encontrado para se comunicarem com seu público de modo a gerar
conexões duradouras, chegamos ao branded entertainment. Uma solução refinada e
comprovadamente bem-sucedida, que combina inserção em meios de grande visualização, mas
com foco na relação emocional com o consumidor. A seguir, analisaremos a aplicação desse
modelo na mídia estudada neste estudo: o cinema.
3.4 BRANDED ENTERTAINMENT NO CINEMA
Pode-se imaginar que a estratégia de inserção de marcas em meios de entretenimento
é uma prática recente. Entretanto, como afirma Lehu (2007), isso já é realizado desde o fim do
século XIX, em uma época onde atores de teatro e cabarés eram usados como garotos-
propaganda para diversos produtos, e onde pôsteres de peças contavam com o nome da marca
patrocinadora quase tão grande quanto o nome do próprio espetáculo. O advento do cinema
apresentou-se como um enorme potencial, tanto para o entretenimento como para alcance de
público, e foi rapidamente percebido como um bom investimento para marcas. Por se tratar de
um meio altamente criativo, os anunciantes tinham liberdades maiores com a forma de expor
seus produtos, indo desde elementos de narrativa, atributos de personagens e a própria
disposição do cenário.
Da mesma forma como as marcas abraçaram o cinema, este também entendeu as
vantagens dessa nova associação. No início, se tratava mais da exposição dos produtos do que
a marca propriamente, através de acordos pelos quais eram fornecidos materiais, serviços e
acessórios e como consequência, estes apareceriam no filme. Lehu (2007) comenta que o
placement surgiu inicialmente para reduzir custos de produção, principalmente se tratando de
objetos de cena e possíveis locações exóticas, como aviões, carros de luxo, entre outros. Um
bom contrato com uma marca poderia significar milhares ou milhões de dólares a menos dos
gastos da produção de um filme. Da mesma forma, “financiamento também pode significar não
ter que pagar por produtos ou serviços utilizados”9
(LEHU, 2007, p. 38, tradução do autor).
Conforme a indústria cinematográfica foi se aperfeiçoando, a competição foi se
acirrando, e logo os padrões do mercado se tornaram elevados. Donaton (2007) comenta sobre
a expansão do número de salas de cinema, assim como a evolução nos meios de comunicação,
e como isso possibilitou maiores arrecadações e estreias mundiais, ao invés de locais. O papel
9
“funding can also come from not having to pay for the products or services used.”
35
do marketing passou de secundário para protagonista nessa transição, ditando os lançamentos
de trailers e o público alvo da obra. Para garantir o sucesso de arrecadação, as verbas de
marketing também subiram, uma vez que se torna necessário instigar o público ao máximo para
assistir ao filme, em especial no fim de semana da estreia. Sobre esse fenômeno, Donaton
comenta:
O contexto atual faz com que o negócio do cinema seja em si mesmo extremamente
arriscado. Apesar de os estúdios gastarem dez a vinte vezes mais em marketing do
que as gravadoras e os selos musicais, eles precisam de cada vez mais apoio do
marketing para alcançar o público e conter os custos (DONATON, 2007, p. 92).
Com o custo crescente para a realização de um longa-metragem, devido à concorrência
acirrada, maior demanda por efeitos especiais de qualidade e grandes estrelas no elenco, é de
esperar um valor de produção na casa dos milhões de dólares. Financiar estes projetos tornou-
se uma tarefa árdua, sendo possível em grande parte graças a atuação das marcas e seus acordos
de inserção. Lehu comenta: “o orçamento de um filme nunca foi garantia de sucesso, mas
paradoxalmente seu tamanho tranquiliza potenciais investidores. Daí o papel fundamental (as
vezes indispensável) de contratos de placement, que podem contribuir para o financiamento do
projeto”10
(LEHU, 2007, p. 39, tradução do autor).
No entanto, a inserção de uma marca no contexto do filme deve ser feita de maneira
correta. Como já visto no começo deste capítulo com Batey (2010), cada marca possui
características e personalidades únicas. Assim, torna-se indispensável encaixar esses fatores na
temática do filme que servirá de veículo: “um placement pode dizer muito sobre o target visado
por parte dos anunciantes, ou por parte do diretor, a coerência que ele ou ela quer invocar”11
(LEHU, 2007, p. 45, tradução do autor). O cinema possui a vantagem de ser um meio
multigênero, permitindo um escopo enorme de públicos-alvo, o que condiz com a atualidade
pulverizada descrita por Lehu (2007) e Palacios e Terenzzo (2016). Marcas devem entender
bem o filme que irão fazer parte, uma vez que cada obra atrai um público distinto, e uma decisão
equivocada pode gerar grandes prejuízos. Desse modo, empresas já estão se envolvendo nos
estágios iniciais de concepção do filme, como Donaton comenta:
Os departamentos de marketing estão se envolvendo com antecedência cada vez
maior no desenvolvimento do roteiro dos filmes a fim de controlar a maneira como
10
“A film’s budget has never been a guarantee of success, but paradoxically, its breadth reassures potential
investors. Hence the fundamental (sometimes indispensable) role of placements contracts, which can thus
contribute to the financing of the project.”
11
“A placement can say a great deal about the intended target on the part of the advertisers, or on the director’s
part, the coherence of what he or she wishes to invoke.”
36
seus produtos são apresentados e de criar oportunidades de exposição vantajosas para
eles (DONATON, 2007, p. 97).
E dessa maneira, o branded entertainment entra em cena como o modelo que pode
garantir o sucesso da comunicação marca-consumidor. Estabelecendo-se dentro do contexto da
narrativa de acordo com os desejos da marca, as inserções são feitas de maneira precisa e
orgânicas. Como veículo midiático, o cinema possui caráter altamente simbólico, suprindo
necessidades emocionais e sociais como analisamos anteriormente. Sabe-se que o consumidor
deseja esse tipo de interação, e que o branded entertainment é capaz de cria-las, se usado em
conjunto com a narrativa e o storytelling. É natural identificar o cinema como um meio ideal
para esse tipo de estratégia porque através dele, as marcas podem ser incorporadas ao roteiro,
tornando-se parte indivisível da história.
O storytelling é intrínseco ao cinema. Através dele, um relato ganha profundidade,
transmite sua mensagem com maior impacto, além de cativar o público. Os autores Palacios e
Terenzzo (2016) afirmam que não se trata de uma ferramenta, de “contar uma historinha” ou
ainda a antiga contação de fábulas para crianças. No cenário atual, o storytelling foi incorporado
aos sistemas mais sofisticados de comunicação para gerar mais atenção do espectador.
Em uma definição usada pelos autores afirma “storytelling significa ter a habilidade
de encontrar ou criar histórias fortes, com propósito estratégico, narradas com excelência”
(TERENZZO; PALACIOS, 2016, p. 62). Em seus estudos, os autores regridem às origens das
histórias, e concordam que estas surgem quando um evento se sobressai da normalidade,
instigando as pessoas a contarem e repassarem o relato. Isso se aplica ao mundo
cinematográfico: não interessa algo que não saia do lugar comum, que já tenha sido visto.
Uma história tem o poder de conectar interlocutores. Por meio delas, pode-se
introduzir novos conceitos e emoções. Palacios e Terenzzo (2016) comprovam esse aspecto
quando analisam histórias antigas, lendas primordiais da civilização, como a Odisseia e os feitos
de Gilgamesh. Nelas, são tratados temas humanos, relacionáveis a qualquer pessoa de qualquer
época. Citando como exemplo um trecho de uma lenda suméria, onde um filho prepara uma
festa para seu pai, e durante a narrativa, realiza todas as etapas da fabricação de cerveja, os
autores ressaltam o poder do storytelling: transmitir uma informação útil, de maneira
interessante e através de uma história. A efetividade da informação se dá justamente pela sua
simbiose com a narrativa. Não existem interrupções para explicações, e sim um fluxo natural.
Sobre isso, os autores comentam:
Toda narrativa é transformada por linhas que se cruzam: as vidas dos personagens
37
correm em paralelo e depois se cruzam e voltam a se separar. No meio desse enredo
é preciso costurar os ensinamentos vitais. Por mais tentador que seja, não adianta
interromper o andamento da história para aproveitar a atenção da audiência e assim
tentar forçar a mensagem (TERENZZO; PALACIOS, 2016, p. 61).
Dessa forma, uma marca deve entender que sua inserção na narrativa deve ocorrer da
forma mais orgânica possível. A organização, o fluxo da história é essencial para seu sucesso.
Através de exemplos, cenários, situações e personagens, alcança-se um melhor resultado do
que simplesmente explicar de maneira invasiva. O storytelling no cinema se apresenta como
uma porta de entrada de grande oportunidade para o marketing, através do branded
entertainment. Encontrado o angulo correto, todo produto possui potencial para grandes
histórias.
Os exemplos são diversos. Donaton (2007) menciona a brilhante inserção da marca
BMW no filme The Italian Job (2003). Os protagonistas do filme precisariam executar um
roubo envolvendo carros pequenos e com alta capacidade de manobras. O Mini, produto da
empresa, foi utilizado pela produção e se destacou por participar do desenrolar da narrativa de
maneira não invasiva. A marca se aproveitou dessa comunicação eficiente e promoveu eventos
paralelos, como encontros de entusiastas do Mini. Outro exemplo mencionado por Lehu (2007)
é da colaboração contínua que o exército dos Estados Unidos tem com Hollywood. Através do
empréstimo de materiais (armas, helicópteros, aviões), locações (bases militares) e logística
para cenas e personagens, o órgão ganha um espaço de destaque para se promover e comunicar
com o público. Escolhendo filmes favoráveis à sua imagem, os resultados dessa comunicação
podem ser bastante positivos. Como Lehu explica, “em 1986, a marinha dos Estados Unidos
ajudou a financiar o filme Top Gun, de Tony Scott, que a permitiu lucrar com um aumento
apreciável em recrutamentos”12
(LEHU, 2007, p. 52, tradução do autor).
Existem marcas que já se integraram no modelo do branded entertainment no cinema,
percebendo seu potencial nas vendas de produtos. Um destes casos é a marca de vinhos Clos
du Val, que se estabeleceu em Hollywood por meio de parcerias em troca de tempo em cena.
De acordo com Lehu (2007) a empresa envia cerca de 240 garrafas anualmente para grandes
estúdios e departamentos de objetos, fazendo com que a marca permaneça relevante no meio.
Dessa forma, o vinho se faz presente no mundo do audiovisual, estando em produções como
The Terminal (2004), The Sopranos (HBO), Two and a Half Men (Warner), entre outros. Como
12
“In 1986, the US Navy helped to finance the Tony Scott film Top Gun, which allowed them to profit from an
appreciable rise in recruitment.”
38
prova de seu sucesso, a Clos du Val faturou em 2004 aproximadamente 36 mil dólares por cada
garrafa dada gratuitamente.
Apesar de exemplos de sucesso serem abundantes, diversas empresas se mantém
receosas em usar o branded entertainment como modelo de marketing. Mesmo com os
benefícios oferecidos, a principal questão está na dificuldade em se mensurar os resultados das
inserções, como aponta Lehu (2007) quando compara estas com os tradicionais comerciais de
30 segundos. Donaton (2007) afirma que devem ser estabelecidos métodos de medição para o
retorno desse tipo de anúncio. Uma falta de padrão impede o desenvolvimento do meio e a
aplicação de preços fixos. Muitas empresas, segundo o autor, poderiam entrar no jogo do
entretenimento, mas sua verba limitada requer números convidativos para uma aposta tão alta.
O branded entertainment, como visto, se apresenta como uma possível solução para
problemas latentes da sociedade contemporânea. Entretanto, não se trata de uma simples
variação do product placement, algo que pode ser aplicado de maneira inconsequente. Segundo
Lehu (2007), trata-se de um processo delicado, necessitando entender a marca como um todo
para aplica-la de forma orgânica em plataformas de entretenimento. Uma empresa que pula essa
etapa e se lança sem uma reflexão prévia sobre sua própria natureza, está perdendo dinheiro. O
cenário atual gerou consumidores questionadores, que repensam sua relação com marcas, de
modo maduro e sofisticado. Através de laços emocionais entre marca e consumidor, pode-se
criar uma relação duradoura. Como Lehu afirma: “é simplesmente o caso de respeitar a
audiência desejada e consequentemente potenciais consumidores”13
(LEHU, 2007, p. 246,
tradução do autor).
3.5 A MARCA NASA E O BRANDED ENTERTAINMENT
Como vimos ao longo deste capítulo, vivemos em um período onde marcas estão cada
vez mais entranhadas no cotidiano do consumidor. Neste cenário, descrito por Lehu como “um
mundo consumidor de marcas”14
(LEHU, 2007, p. 47, tradução do autor), abre-se espaço para
que marcas, inicialmente voltadas para outros propósitos, se tornem símbolos, satisfaçam
necessidades e influenciem na criação da identidade de consumidores. A NASA, como veremos
a seguir, se encaixa nessas características.
13
“It is simply a case of respecting the target audience and consequently potential consumers.”
14
“a brand-consumerist world.”
39
Fundada em um dos períodos mais conturbados da Guerra Fria, com o propósito de
fazer frente à União Soviética na recém-inaugurada corrida espacial, a NASA é um órgão do
governo americano com foco no desenvolvimento científico, aeroespacial e exploração humana
do cosmos, visando também a evolução na qualidade de vida da humanidade como produto de
suas conquistas. Sua visão, segundo seu site oficial15
, é: “nós buscamos novas alturas e
revelamos o desconhecido para o benefício da humanidade”16
(tradução do autor). Dada a sua
natureza, seu modelo de negócios diverge do comum. Apesar da venda de produtos
relacionados às missões históricas, não há uma relação de compra e venda tradicional com seus
consumidores. Suas ações e esforços são voltados primariamente para a exploração espacial. E
mais: dada a sua natureza governamental, a NASA é utilizada como um símbolo de poder dos
Estados Unidos. Sendo assim, o órgão pode ser considerado uma marca?
O estudo denominado “Percepção Americana da Exploração Espacial”17
(tradução do
autor) feito em 2004 pelo instituto de pesquisa “Center for Cultural Studies and Analysis”, em
parceria com o governo dos Estados Unidos, analisou a NASA sob o aspecto de marca. O estudo
aponta o órgão como uma das marcas mais fortes e reconhecidas mundialmente, ao lado de
grandes empresas como Coca-Cola e Disney. Seus principais stakeholders são o povo
americano e o Congresso Nacional, já que, se tratando de um órgão governamental, são através
deles que a marca capta recursos para o financiamento de suas missões. Logo, deve estabelecer
conexões duradouras e satisfazer as necessidades de seu público requer, um comportamento
característico de uma marca.
Retomando o que foi visto no início do capítulo com Batey (2010), assim como
qualquer outra marca, a NASA é um objeto simbólico, que legitima as identidades de seus
consumidores e supre suas necessidades. Como o autor menciona, é esperado que uma marca
satisfaça diferentes tipos de necessidades, que se entrelaçam e se sobrepõem. Com públicos
bastante distintos, a NASA satisfaz tanto aspectos simbólicos, como o sentimento de
descoberta, inovação e principalmente patriotismo, quanto funcionais, como demandas por
aprimoramentos tecnológicos e científicos. Ambos são requisitados, em maior ou menor grau,
por seus stakeholders, e para satisfazê-los, a marca deve contar com um planejamento de
comunicação diversificado e coeso, como veremos a seguir.
15
NASA. What does NASA do? 2015c. Disponível em:
<https://www.nasa.gov/about/highlights/what_does_nasa_do.html>. Acesso em: 2 ago. 2016.
16
“We reach for new heights and reveal the unknown for the benefit of humankind.”
17
“American Perception of Space Exploration.”
40
No livro “NASA First 50 Years” (2008) a autora Billings comenta sobre a relação da
agência espacial com seu público. Desde sua criação, a NASA mantém uma política de
transparência. Uma lógica proveniente da Guerra Fria, a disponibilização de informações a
todos os interessados era a maneira do órgão, e por consequência, o governo dos Estados
Unidos, se afirmarem contra o programa espacial da União Soviética, que era mantido em
sigilo. Usariam a verdade para combater a mentira soviética, como a autora coloca. O fato de o
programa espacial ser comandado por civis, e não militares, ajudou na construção de identidade
da marca, em prol do avanço científico e humano, empenhada na divulgação clara e verdadeira
de informações sobre suas descobertas.
No entanto, ao se atrelar à Guerra Fria, a NASA comprometeu sua própria existência.
Billings (2008) comenta sobre a motivação do governo dos Estados Unidos para financiar a
agência, que se baseava no prestígio nacional e poder provenientes da corrida espacial. Uma
vez terminado esse período, com a vitória americana sobre os soviéticos, o órgão perdeu força,
e muitos passaram a questionar sua utilidade. O governo americano cortou financiamentos
progressivamente18
, de modo que a agência chegou ao século XXI com apenas uma fração do
que recebia nas décadas de 1960 e 1970.
Paralelo a isso, tanto Billings (2008) como o estudo “Percepção Americana da
Exploração Espacial”19
(tradução do autor) apontam falhas na comunicação da agência. Ambas
as fontes demonstram que o público tem interesse pelo órgão e suas atividades, porém não
consegue conectar as informações que recebe à marca, por não possuírem conhecimentos
específicos sobre os assuntos tratados. Apesar de possuir imagem e valores percebidos pelo
público como fortes, a NASA possui um conhecimento de marca precário, descrito por Billings
como “uma milha de largura e uma polegada de profundidade”20
(BILLINGS, 2008, p. 161,
tradução do autor). O povo americano possui uma percepção de marca positiva, porém não a
considera uma prioridade nos gastos governamentais. Junto a isso há a segmentação do público.
Billings (2008) menciona um estudo demográfico feito para a marca que revela o pouco
envolvimento das gerações mais jovens. Seu principal segmento são homens, de 45 a 65 anos,
muitos deles testemunhas da corrida espacial. Por outro lado, a NASA é vista como algo pouco
interessante e confuso para jovens e adultos de 15 a 35 anos. Este grupo possui uma relação
fraca com a marca, com pouca participação e interatividade com seu conteúdo.
18
NASA. Budget documents, strategic plans and performance reports. NASA, 2016. Disponível em:
<http://www.nasa.gov/news/budget/index.html>. Acesso em: 15 out. 2016.
19
“American Perception of Space Exploration.”
20
“a mile wide and an inch deep.”
41
Como visto, as falhas apontadas traduzem-se como ameaças para a NASA. Com um
impacto fraco de seu conteúdo, a marca falhou em angariar novos segmentos, e assim renovar
e expandir o público consumidor. A falta de conhecimento e de percepção das gerações mais
novas é particularmente problemática posto que este grupo começa a ocupar cargos de
importância no governo dos Estados Unidos. Sabendo da dependência da NASA com o
congresso americano e a Casa Branca para o financiamento de suas missões, se tornou vital que
a marca se renovasse para garantir seu futuro. Sua estratégia de comunicação foi redesenhada,
visando a adequação aos novos meios e a melhor utilização da já reduzida verba anual.
A doutora Alotta Taylor (2015), diretora da Divisão de Integração Estratégica e
Management da NASA, enfatiza a necessidade de mudar a percepção do público sobre a marca,
ainda em grande parte voltada para a corrida espacial e os programas Apollo e Shuttle. A marca,
para se manter atual e relevante, deve propagar suas novas conquistas ao consumidor,
reafirmando sua posição no espaço. Assim sendo, Taylor comenta sobre a reformulação da
comunicação e seus três objetivos: aumentar o awareness do público e do Congresso
Americano sobre o valor da exploração espacial, como forma de garantir sua renda para futuras
missões; expor as maravilhas alcançadas via exploração espacial, e como a NASA contribui
para o desenvolvimento humano no espaço; aumentar o envolvimento do público com suas
missões, de forma a engaja-los nas conquistas da marca. A empresa está angariando fãs e os
transformando em embaixadores, colaboradores, criadores e defensores da marca.
Taylor (2015) enfatiza o poder das redes sociais para se comunicar em larga escala e
em especial com as novas gerações. Com mais de 490 contas em mídias sociais e perfis com
milhões de inscritos, a empresa se dedica na expansão de seu conteúdo, criando canais que
veiculem novidades relacionadas à exploração espacial, mas ao mesmo tempo construindo um
nicho para entusiastas e novos entrantes. Essa estratégia digital condiz com o que Lehu (2007)
afirma: no mundo pulverizado em que vivemos hoje, a marca deve ir ao consumidor, se
inserindo em seu cotidiano de forma não intrusiva.
Da mesma forma, a NASA entendeu que precisava cativar seu público. Ao invés de
simplesmente expor informações, as transformaria em entretenimento. E de certa forma, já o
vinha fazendo, desde seus primórdios. Ao colocar uma câmera a bordo da Apollo 11 e transmitir
os primeiros passos para o mundo todo, a NASA demonstrou que sabia criar um espetáculo
cativante21
. Seguindo esse modelo, a agência passou a utilizar os princípios do storytelling,
21
HAYES, Adam. NASA: the first content marketers? Wyzowl [blog], 2015. Disponível em:
<http://blog.wyzowl.com/nasa-the-first-content-marketers>. Acesso em: 10 ago. 2016.
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NASA no cinema: branded entertainment espacial

  • 1. ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING (ESPM – SP) GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL COM ÊNFASE EM PUBLICIDADE E PROPAGANDA ROBERTO FERREIRA ALVES DAX A NASA E O CINEMA Um estudo sobre o uso do Branded Entertainment da Agência Espacial Americana no cinema. SÃO PAULO 2 / 2016
  • 2. ROBERTO FERREIRA ALVES DAX A NASA E O CINEMA Um estudo sobre o uso do Branded Entertainment da Agência Espacial Americana no cinema SÃO PAULO 2016 Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito para obtenção de título de Bacharel em Comunicação Social com ênfase em Publicidade e Propaganda pela Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM. Orientadora: Martha Terenzzo - Mestre em Comunicação e Consumo
  • 3.
  • 4. AGRADECIMENTOS Aos meus pais, que sempre incentivaram a curiosidade e o trabalho bem feito. Aos meus amigos e familiares, que acompanharam de perto o desenrolar dessa maluquice. À Lu, sempre ao lado, nas partes boas e nas nem tanto. À Martha, que acreditou neste projeto desde o começo, independente do quão absurdo fosse. E aos que continuamente batalham para garantir um lugar para a humanidade entre as estrelas. Que continuem assim.
  • 5. I grew up being amazed by science fiction — 2001, Star Wars. But I grew up in a time when being an astronaut was the highest ambition. And the idea that we would keep exploring space and pushing further and further out seemed inevitable. That has fallen out in the past couple of decades. Technology has gone through a huge change. I think we’re on the new cusp of a brand new era of exploration. Christopher Nolan, diretor de Interstellar.
  • 6. DAX, Roberto Ferreira Alves. A NASA e o cinema: um estudo sobre a utilização do branded entertainment da agência espacial americana em produções cinematográficas. São Paulo, 2016. 73 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharel em Comunicação Social). Escola Superior de Propaganda e Marketing, São Paulo, 2016. RESUMO Neste trabalho procuramos estudar a metodologia aplicada pela marca NASA ao longo dos anos para se posicionar perante seus diversos públicos, com ênfase em produções cinematográficas. Através da utilização de técnicas de branding, como o Branded Entertainment, a NASA altera sua narrativa e dialoga com o seu público de interesse, utilizando como veículo as produções hollywoodianas. Para entender este processo, analisaremos o desenvolvimento do cinema como meio de comunicação e difusor de ideias, suas transformações e relacionamento cada vez mais intrínseco com a indústria de consumo. Em seguida, investigaremos sobre a prática e evolução do product placement e Branded Entertainment, utilizadas para a divulgação de marcas em meios voltados ao entretenimento, assim como a aplicação desses conceitos na marca NASA. Por fim, concluiremos com uma análise aprofundada das três obras estudadas e conceitos trabalhados ao longo da pesquisa. Para tal, foram escolhidos três filmes, que possuem a participação e parceria da NASA. São eles: Marooned (1969), Apollo 13 (1995) e The Martian (2015). Palavras-Chave: Marca. Mídia. Cinema. NASA. Branded Entertainment.
  • 7. ABSTRACT In this academic paper we seek to study the methodology applied by NASA’s brand over the years in order to position itself before its several publics, with emphasis in movie productions. Through the use of branding techniques, like Branded Entertainment, NASA alters its narrative and dialogues with its target audience, using Hollywood productions as a vehicle. In order to understand this process, we will analyze the development of cinema as a mean of communication and diffuser of ideas, its transformations and increasingly intimate relationship with the consumer industry. Then, we will investigate the practice and evolution of product placement and Branded Entertainment, used in brand divulgation in channels dedicated to entertainment, as well as the application of said concepts in NASA’s brand. Finally, we will conclude with a profound analysis of the three works studied and the concepts labored during the research. For such, three movies were chosen, all of them possessing communion and partnership with NASA. They are: Marooned (1969), Apollo 13 (1995) and The Martian (2015). Keywords: Brand. Media. Cinema. NASA. Branded Entertainment.
  • 8. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................8 1.1 Contextualização...............................................................................................................8 1.2 Objeto................. ............................................................................................................10 1.3 Problema.........................................................................................................................11 1.4 Objetivo Geral ................................................................................................................12 1.5 Objetivos Específicos .....................................................................................................12 1.6 Metodologia....................................................................................................................12 1.7 Quadro Referencial Teórico ...........................................................................................14 2 CAPÍTULO 1: REFLEXÕES SOBRE O CINEMA.............................................................15 2.1 Introdução ao Capítulo ...................................................................................................15 2.2 Cinema: primórdios e atualidade....................................................................................15 2.3 A Mídia e o Cinema........................................................................................................18 2.4 Cinema como Veículo e Influência Cultural ..................................................................22 2.5 Relação Cinema - Publicidade........................................................................................25 2.6 Considerações.................................................................................................................26 3 CAPÍTULO 2: BRANDED ENTERTAINMENT ................................................................27 3.1 Introdução ao Capítulo ...................................................................................................27 3.2 A marca e suas características ........................................................................................27 3.3 Branded Entertainment ...................................................................................................29 3.4 Branded Entertainment no Cinema.................................................................................34 3.5 A marca NASA e o Branded Entertainment...................................................................38 3.6 Considerações.................................................................................................................50 4 CAPÍTULO 3: ANÁLISE DAS TRÊS OBRAS ...................................................................52 4.1 Introdução ao Capítulo ...................................................................................................52 4.2 Análise............................................................................................................................52 4.3 Conclusão..... ..................................................................................................................65 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................67 PESQUISA DOCUMENTAL..................................................................................................70 ANEXO A – ANÁLISE DAS TRÊS OBRAS.........................................................................73
  • 9. 8 INTRODUÇÃO Nesta introdução procuramos contextualizar a metodologia aplicada pela marca NASA ao longo dos anos para se posicionar perante seus diversos públicos, com ênfase em produções cinematográficas. Para esse momento discorreremos sobre fatos de nosso objeto, problema, objetivo geral, objetivos específicos e metodologia aplicada. 1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO O século XX foi o palco do nascimento de diversos meios de veiculação de informação e cultura. Em somente cem anos, a humanidade revolucionou diversas vezes sua própria relação com a comunicação, permitindo desdobramentos que são sentidos até hoje. Em seu artigo onde analisa a importância de meios de comunicação na sociedade, em especial o cinema, a autora Gonçalves (2008) ilustra esse conceito analisando como o surgimento de novos meios influenciaram as mudanças na percepção e recepção, sensoriais e artísticas, na sociedade moderna. De fato, a proliferação dos meios de comunicação permitiu inúmeras possibilidades de diálogo, novos meios de se conectar interlocutores. De certo, uma das áreas que mais se beneficiou de tais mudanças foi a publicidade. Ao se adaptar aos novos entrantes midiáticos, os anunciantes agora tinham inúmeras maneiras de alcançar seu público alvo. Entretanto, as mensagens veiculadas eram intencionadas ao grande público, tendo pouca relação com o espectador individual. É deste período que fala Maria Rita Kehl em seu artigo, quando afirma que a indústria cultural proposta por Adorno e Horkheimer se utilizaria da imagem para alcançar o maior número de pessoas possível, de maneira rasa e simples, “imagens enunciadas por ‘ninguém’ e dirigidas a ‘todos’ são hoje o principal produto da cultura de massas” (KEHL, 2005, p. 237). Sem outra opção, o espectador era incapaz de escolher ou interagir com o que era anunciado. Mas eis que o aprimoramento das novas tecnologias, a principal delas sendo a internet, permitiu mais um passo na diferenciação do consumo de conteúdos. Os autores Bezerra e Covaleski (2013) analisam o consumidor moderno, que agora possui ferramentas para absorver anúncios de maneira seletiva e critica. A massificação da informação e subserviência do espectador deu lugar a “o poder de escolha e, consequentemente, a possibilidade de criar bloqueios e propor intervenções às mensagens publicitárias” (BEZERRA; COVALESKI, 2013, p. 127). Os novos consumidores não são mais afetados por simples comerciais, é preciso mais para conectá-los às marcas.
  • 10. 9 Como a publicidade se adaptou para comportar tais mudanças? Como reestruturar-se para atender a uma sociedade agora muito mais crítica e no comando do que quer assistir? Lehu (2007) comenta essa transformação, tendo como ponto de vista o entretenimento. Segundo ele, é através da interação emocional que uma marca consegue criar um elo com seu público, e o entretenimento fornece justamente a possibilidade de tal relação. Métodos como o product placement e o Branded Entertainment, a inserção de uma marca ou produto em um conteúdo destinado ao lazer, não só apresentam novas formas de se atingir e interagir com o público, mas também pelo potencial de atrelar marcas a histórias que condigam com suas características. Silverstone (2011) e Palacios e Terenzzo (2016) comentam sobre o poder das histórias no diálogo com o consumidor, como facilitam a identificação e conexão com a marca que as conta. O elo emocional com o público alvo se tornou a busca das marcas modernas, agora voltadas para criar mensagens que significam algo para seus consumidores, que gerem envolvimento e participação por parte deles. O maior desafio agora se tornou a inserção fluida e coesa de conteúdo publicitário em objetos de entretenimento, de forma que se encaixem com a narrativa e não sejam percebidos de maneira negativa pelo consumidor. Donaton (2007) comenta o poder da inserção orgânica: As parcerias com o entretenimento não tornam apenas a publicidade mais atraente, mas também a tornam impossível de ser evitada. Você não tem como pular a cena em que aparece o produto sem pular, no ato, uma parte do programa (DONATON, 2007, p. 38). Como iremos tratar especificamente do cinema, sendo esta a mídia veículo dos objetos de pesquisa, é necessário entender sua participação na construção simbólica, e por vezes mítica, das vivências de seus espectadores. Covaleski (2009), em seu livro Cinema, Publicidade, Interfaces, aborda a comunicação interligada entre os diversos componentes de um filme, indo desde a montagem até referencias. Para ele, o espectador é envolto no apelo emocional da obra, gerando novas sensações e experiências únicas. Como afirmado pelo autor “a linguagem trabalhada pelo cinema induz o espectador a consumir algo intangível, porém carregado de significados e simbolismos, os sonhos” (COVALESKI, 2009, p. 71). Pode-se ver que o cinema se apresenta como veículo ideal para a nova estruturação da publicidade, em busca de ligações emocionais com seus consumidores. Ao longo deste trabalho veremos como se criou a relação entre os dois, e como tal relação foi aproveitada por marcas, inclusive a estudada. De fato, a NASA se apresenta como um objeto interessante para análise. Uma marca sem produto que, no entanto, permanece forte no imaginário popular, assumindo caráter quase
  • 11. 10 mítico, a NASA se destaca de outras grandes empresas por simplesmente ter sido parte ativa na história mundial desde sua fundação. Como o autor Dick enfatiza, “como as facetas de uma joia, a importância geral da NASA e da Era Espacial nos últimos 50 anos pode ser considerada a partir de muitos pontos de vista, indo desde o geopolítico e tecnológico para o educacional e cientifico”1 (DICK, 2008, p. 587, tradução do autor). Seu alcance midiático é enorme: desde o programa Apollo e o pouso lunar, as Shuttles e a Estação Espacial Internacional, o mundo testemunhou suas conquistas. Assim, veremos como foi feito o posicionamento desta grande marca, e como se deu a relação com Hollywood. Neste estudo, analisaremos as diferentes representações e incursões da marca NASA em três produções cinematográficas, feitas a partir dos conceitos apresentados de branded entertainment, da necessidade de criar elos emocionais com o público espectador, de ser condizente e parte da narrativa do filme. Utilizando-nos dos autores citados acima, assim como vários outros, tentaremos avaliar o posicionamento de marca da agência retratada nas produções escolhidas, assim como o contexto histórico-cultural por trás de cada projeto, de forma a entender a fundo a transição narrativa da NASA ao longo dos anos. 1.2 OBJETO A autora Lima (2008), em sua obra Monografia, define o objeto de pesquisa como uma das peças fundamentais para a base de um projeto científico. Em seu livro, descreve diversos passos que um pesquisador deve tomar ao iniciar seu estudo, sendo a construção de um objeto de pesquisa o primeiro deles. Será a partir dele que o pesquisador testará suas teorias, aplicará “medições”; em termos coloquiais, o objeto é a “cobaia” do experimento. Sendo assim, o objeto de estudo deste trabalho versa sobre a maneira como a NASA, ao longo dos anos, se utilizou de técnicas de branding, entre elas o product placement e o branded entertainment por meio do cinema para alterar sua percepção de marca perante o público. Dentro do período proposto pelas três obras escolhidas, indo desde a década de 1960 até a atualidade, desenvolveremos um estudo onde se averiguará se a agência espacial alterou a narrativa de sua marca através das produções cinematográficas em questão. Com distâncias aproximadas de 20 anos entre si, os três filmes tiveram parcerias com a NASA em suas 1 “like the facets of a jewel, the overall importance of NASA and the Space Age over the last 50 years may be considered from many points of view, ranging from the geopolitical and technological to the educational and scientific.”
  • 12. 11 produções. Dessa forma, apresentam-se como retratos de como a marca se posicionava à época, utilizando o cinema como veículo. Por ordem de lançamento, os filmes são:  Marooned (1969): Lançado meses antes do quase desastre da Apollo 13, retrata uma nave à deriva. Os três astronautas têm pouco oxigênio disponível, e devem contar com o comando da missão para serem resgatados. Este filme está no projeto devido a percepção da NASA como ousada e heroica. Boa parte da trama ocorre em terra, com os engenheiros lutando contra o tempo para trazer seus homens em segurança. Foi uma das primeiras produções que contou com apoio da agência.  Apollo 13 (1995): Como o nome sugere, conta a história da missão que quase resultou em uma das maiores catástrofes da história da agência. Retrata-a como responsável pelo sucesso da viagem de volta e retoma a aura de heroísmo que havia sido parcialmente perdida desde o fim da corrida espacial. Contou com diversos equipamentos fornecidos pela NASA, incluindo voos de baixa gravidade, que simulam os efeitos sentidos por astronautas no espaço.  The Martian (2015): A representação mais atual da percepção de imagem da marca, relata um astronauta preso em Marte, considerado morto pelo resto de sua tripulação. Deve sobreviver em um ambiente cruel enquanto cientistas da NASA lutam contra o tempo para resgatá-lo. Sendo o exemplo mais recente, é um filme cuja a análise será interessante, uma vez que revelará a atual posição da marca. Foi o que mais contou com auxílio da NASA até o presente momento. 1.3 PROBLEMA Delimitar um problema significa apresentar uma questão não completamente resolvida, algo que o pesquisador tenha vontade de descobrir e entender. Segundo Alves (2007, p. 48), autora da obra Como escrever teses e monografias, “formular um problema é dizer de maneira explicita, operacional, qual a dificuldade que existe, delimitando seu campo de investigação e apresentando suas características”, sendo assim, um problema de pesquisa deve conter em poucas palavras o significado real da investigação proposta. Neste trabalho, o problema a ser respondido é: de que maneira a NASA se utilizou de técnicas de branding no cinema para alterar sua percepção de marca perante o público?
  • 13. 12 1.4 OBJETIVO GERAL Alves (2007), propõe uma maneira de se alcançar um objetivo geral em projetos monográficos, segundo ela: “aconselha-se a formular o objetivo geral a partir do que se define no problema” (ALVES, 2007, p. 52). Seguindo a estrutura proposta pela autora, tem-se como objetivo geral entender de que maneira a NASA se utilizou de técnicas de branding no cinema para alterar sua percepção de marca perante o público. 1.5 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Segundo Alves (2007, p. 52) “deve-se formular […] objetivos específicos que definirão os fins da investigação, para nortear os passos”, de forma que sejam criados a partir das questões apresentadas em um projeto. Neste estudo, serão abordados três objetivos, que se complementarão: a) analisar o meio midiático cinema, tanto como indústria cultural e de mercado, como meio de comunicação e seu papel na contemporaneidade; b) compreender o significado de marca, focando em especial no branding voltado para o entretenimento (product placement e branded entertainment), de modo a entender como a imagem da marca NASA foi construída nas três produções, além do contexto histórico-cultural por trás; c) analisar os três filmes (Marooned, Apollo 13 e The Martian), comparando de que maneira a marca NASA foi representada, em busca de transformações da agência espacial. 1.6 METODOLOGIA Devido à variedade de assuntos a serem trabalhados neste estudo, assim como sua natureza cinematográfica, foi necessário adotar dois métodos distintos de pesquisa: bibliográfica e documental. De acordo com as definições apresentadas por Lima, em sua obra Monografia, a pesquisa bibliográfica “é a atividade de localização e consulta de fontes diversas de informação escrita orientada pelo objetivo explícito de coletar materiais mais genéricos ou mais específicos a respeito de um tema” (LIMA, 2008, p. 48). Como já mencionado, este trabalho aborda temas que englobam desde a história do cinema, sua indústria e mecanismos de comunicação, passando pelos conceitos e teorias de branding, com ênfase nas estratégias
  • 14. 13 que visam a divulgação via entretenimento e product placement, até a história da própria NASA, e sua passagem pelo mundo da mídia e a transformação em um ícone cultural. Todos esses temas só serão compreendidos e estudados a fundo se for realizado uma extensa pesquisa, debruçando-se nos autores clássicos e contemporâneos. Já a pesquisa documental trata-se do “exame [...] de materiais que ainda não receberam qualquer tratamento analítico” (LIMA, 2008, p. 56). Ela abrange qualquer material com potencial de consulta, que contenha informações e registros de eventos e provas. Materiais documentais vão desde filmes, séries, fotos, músicas, audiovisuais em geral, manuscritos, impressos e documentos históricos. Cabe ao pesquisador absorver seu conteúdo, e organiza-lo de maneira coerente e benéfica para seu estudo. Haverá a análise comparativa dos filmes selecionados, procurando entender a relação entre eles sob o ponto de vista do branded entertainment, assim como a evolução do posicionamento de marca feito pela NASA. Serão comparadas inserções, contexto em que estão inseridas, entre outros. Como já descrito, o primeiro capítulo tratará da indústria cinematográfica, tanto como forma de negócio como divulgadora de ideias e cultura. Para esse aspecto, o da indústria em si, serão estudados, via pesquisa bibliográfica, os autores Rogério Covaleski e Fernando Mascarello. Já para a parte midiática, a pesquisa tenderá para autores clássicos, como Theodor Adorno e Max Horkheimer, assim como estudiosos modernos, como Gabriel Cohn, Maria Rita Kehl e Roger Silverstone. O segundo capítulo abordará o conceito de marca e as estratégias do branding realizado por grandes empresas, principalmente as associadas ao Branding Entertainment, assim como suas aplicações no contexto da NASA. Por meio de uma pesquisa bibliográfica e documental, serão estudados os autores Jean-Marc Lehu, Scott Donaton, Mark Batey, Fernando Palacios e Martha Terenzzo, assim como especialistas da agência espacial americana, como Linda Billings, Alotta Taylor e Bert Ulrich. Por fim, o terceiro capítulo trará a análise documental comparativa das três obras estudadas: Marooned (1969), Apollo 13 (1995) e The Martian (2015). Um estudo aprofundado da inserção da marca nos filmes será feito, levando em consideração os temas pesquisados ao longo do trabalho, de forma a apresentar um panorama confiável da atuação da NASA nos longa-metragem em questão, assim como a utilização do branded entertainment no posicionamento da marca ao longo dos anos.
  • 15. 14 1.7 QUADRO REFERENCIAL TEÓRICO NASA DICK, Steven J. NASA first 50 years. NASA, 2008. Disponível em: <https://www.nasa.gov/connect/ebooks/hist_nasa50_detail.html>. Acesso em 5 maio 2016. TAYLOR, Alotta. Communication strategy. NASA, 2015. Disponível em: <http://www.nasa.gov/sites/default/files/files/1- Taylor-Communication-Strategy-NAC-ATaylor-072015_v8.pdf>. Acesso em: 5 set. 2016. THE CENTER FOR CULTURAL STUDIES AND ANALYSIS. American perception of space exploration: a cultural analysis for harmonic international and the national aeronautics and space administration. Washington, 2004. MÍDIA KELLNER, Douglas. A cultura da mídia. São Paulo: EDUSC, 2001. SILVERSTONE, Roger. Porque estudar a mídia? São Paulo: Loyola, 2011. INDÚSTRIA CULTURAL ADORNO, Theodor W. HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento. São Paulo: Zahar, 1985. BACCEGA, Maria Aparecida (org.). Comunicação e culturas do consumo. São Paulo: Atlas, 2008. CINEMA MASCARELLO, Fernando. História do cinema mundial. Campinas: Papirus, 2006. COVALESKI, Rogério. Cinema, publicidade, interfaces. Curitiba: Maxi Editora, 2009. ENTRETENIMENTO E PUBLICIDADE DONATON, Scott. Publicidade+entretenimento: por que estas duas indústrias precisam se unir para garantir a sobrevivência mútua. Tradução de Álvaro Opermann. São Paulo: Cultrix, 2007. LEHU, Jean-Marc. Branded entertainment: product placement & brand strategy in the entertainment business. Kogan Page Publishers, 2007. PALACIOS, Fernando. TERENZZO, Martha. O guia completo do storytelling. Rio de Janeiro: Alta Books, 2016. MARCAS BATEY, Mark. O significado da marca: como as marcas ganham vida na mente dos consumidores. Tradução de Gabriel Zide Neto. Rio de Janeiro: Best Business, 2010.
  • 16. 15 CAPÍTULO 1: REFLEXÕES SOBRE O CINEMA 2.1 INTRODUÇÃO AO CAPÍTULO Neste capítulo, analisaremos o meio midiático cinema, tanto como indústria cultural e mercado, assim como meio de comunicação e seu papel na contemporaneidade. Iniciaremos as discussões com uma breve história do cinema, para situar-nos no atual panorama da sétima arte, passando por seu nascimento e evolução. Seguida de uma análise sobre o poder desta como mídia e formadora de ideias, além de sua relação com a sociedade contemporânea. Algumas notas sobre técnicas e artifícios, utilizados e aperfeiçoados ao longo dos anos, visando o narrar eficaz de uma história e, por fim, uma breve discussão sobre a relação entre o cinema e a publicidade, que servirá de gancho para o próximo capítulo. Para realizar esta discussão, que abordará frentes distintas da sétima arte, a pesquisa bibliográfica entrará em ação, contando com historiadores do tema, como Costa (2006), Pucci (2006), Felinto (2006) e estudiosos em geral, como Gonçalves (2008), Covaleski (2009 e 2013), Bezerra (2013) e Kehl (2005). 2.2 CINEMA: PRIMÓRDIOS E ATUALIDADE Seria impossível, talvez até prepotente, relatar ainda que resumida, toda a história do cinema, suas vertentes e personagens de destaque, em um espaço tão curto. Havendo tantos gêneros distintos, movimentos autorais sem fim, não cabe aqui esta análise. Para uma melhor discussão e entendimento, iremos analisar trechos específicos, voltados para o tema deste projeto. Abordaremos as origens do cinema, suas afiliações já precoces com o entretenimento, as diferentes formas de lazer que o moldaram, e o nascimento de uma indústria, que se renovou e renova ao longo dos anos, culminando com a adesão à tecnologia digital. Em seu capítulo do livro História do Cinema Mundial, Costa (2006) oferece uma reflexão sobre a natureza das origens do cinema. Sendo mais uma das inúmeras invenções que marcaram o final do século XIX, as primeiras sessões de cinema eram vistas como curiosidades tecnológicas. Eram utilizadas em atrações de entretenimento, como os cafés parisienses e os famosos vaudevilles, espaços populares que apresentavam espetáculos curtos e desconexos, composto de números teatrais, circenses, literários, entre outros. Ambos eram caracterizados por serem espaços de reunião das classes médias, onde podiam-se ver espetáculos e apresentações, como declamações de poesias, dramatizações, exibições de curiosidades e sessões de lanterna mágica, um aparato ancestral aos modernos projetores de fotografias. A
  • 17. 16 autora ressalta o panorama inicial da sétima arte, uma mistura de diferentes formas de entretenimento e cultura, sem um norte definido, em transformação constante. Afirma que o cinema, "quando apareceu [...], não possuía um código próprio e estava misturado a outras formas culturais, como os espetáculos de lanterna mágica, o teatro popular, os cartuns, as revistas ilustradas e os cartões-postais” (COSTA, 2006, p. 17). Dos vaudevilles e cafés, as projeções conquistaram seu próprio espaço, os nickelodeons. Estes espaços, precários e improvisados, atraiam a classe operária, arrebatada pela novidade e pelos baixos preços (cinco centavos, o nickel americano, como o nome indica), sendo a responsável pela popularização do cinema, segundo Costa (2006). Atentos ao lucro potencial a ser ganho com essa indústria, nomes como os irmãos Lumière e Thomas Edison se tornaram conhecidos, e o sucesso e o deslumbre moveram a inovação. Por fim, ficou evidente que o cinema poderia ser um entretenimento para todos os públicos. Os enredos se tornaram mais densos, técnicas foram aprimoradas e as exibições improvisadas deram lugar aos grandes salões da sétima arte. Em suma, dois períodos são delineados pela autora nesta fase (1894- 1915): o “cinema de atrações”, abrangendo desde o início no vaudeville e até as primeiras produções ficcionais, exemplificada por Georges Meliès e os nickelodeons, e o “período de transição”, demarcado pelo aprofundamento psicológico dos personagens e desenvolvimento da narrativa, assim como um forte assentamento da indústria cinematográfica e a divulgação do “cinema para todas as classes sociais”. A partir desta época, presenciou-se o boom da sétima arte, tomando o mundo como uma das principais forças midiáticas. O que se iniciou de maneira humilde na França e EUA se espalhou pelo resto da Europa, chegando eventualmente à totalidade do planeta. Movimentos regionais, como o Expressionismo Alemão e o cinema Soviético adicionaram complexidade à arte como um todo, criando novos hubs de produção de conteúdo, como a Cinecittà e Bollywood. No cinema americano, o ponto de virada da indústria foi a crise dos anos 60 em Hollywood, segundo Mascarello (2006). As causas apontadas são a entrada da TV no mundo midiático, a queda do número de filmes lançados por ano devido ao alto custo de produção, e crises políticas internas envolvendo as salas de cinema, na época quase todas propriedades dos estúdios. A saída da crise, segundo Mascarello, foi a “reconfiguração estética e mercadológica do blockbuster a partir de 1975, no contexto da integração horizontal dos grandes estúdios aos demais segmentos da indústria midiática e de entretenimento” (MASCARELLO, 2006, p. 335). O autor afirma que a criação do modelo moldou o cinema contemporâneo, que continua até os dias atuais, após Jaws (1975) e Star Wars (1977).
  • 18. 17 Após a reformulação do cinema e a adoção do blockbuster como método de negócio, chegamos ao fim do século XX e a aplicação de novas tecnologias no âmbito artístico. O autor Felinto (2006) em seu artigo, aponta para as mudanças geradas no cinema pela inserção digital, e cita os autores Weibel e Shaw e seu termo expanded cinema. Esses autores descrevem um cinema que ultrapassa as telas para a vida cotidiana, que se incorpora ao dia a dia, através de diferentes mídias, aonde a vida se torne arte. Porém, também previam o distanciamento das culturas de massa: “[...] ultrapassar a linguagem estereotipada e sedutora das mídias massivas por meio da experimentação com os aparatos eletrônico-digitais” (FELINTO, 2006, p. 415), o que não ocorreu. Pucci (2006) comenta sobre esse processo e traça uma linha entre o chamado cinema moderno (segundo ele representado por Godard, Tarkovski, entre outros) e o pós- moderno, alegando que a diferença seria no trato com a cultura de massas. O cinema pós- moderno evita se distanciar ou destruir a relação com o público de massa, ao contrário do moderno, adverso a outras mídias, condenando-as impuras. O pós-moderno as abraça, criando uma relação intertextual e assumindo um modelo híbrido: O filme pós-moderno opera com elementos do cinema de entretenimento, do videoclipe e da propaganda, mas não se trata de submissão a tudo isso. O ar respeitoso para com produtos da mídia não deve ser confundido com "homenagens", uma vez que se empreende também sua subversão (PUCCI, 2006, p. 374). Pucci ainda afirma que esta característica do cinema pós-moderno possui duas faces: “é sancionada, porque não entra em choque destrutivo com os seus objetos, em geral produtos da cultura de massa, mas é transgressiva, porque os utiliza de forma descontextualizada, desconstruindo-os, revelando seu caráter discursivo” (PUCCI, 2006, p. 375). O cinema contemporâneo adotou a cultura de massa em seu discurso, utilizando-se das ferramentas digitais, integradas a fundo na indústria, seguindo algumas das ideias do expanded cinema. Ao mencionar os efeitos especiais, discussão que abrange tanto as tecnologias digitais quanto a cultura de massa, Felinto (2006) atenta ao impulso pelo real que o ser humano busca. São essenciais para a construção das realidades apresentadas por Hollywood. Segundo o autor, “essa pulsão cultural é constitutiva da experiência da imagem no Ocidente, movida continuamente por um desejo crescente de realismo” (FELINTO, 2006, p. 416). Através dos métodos digitais, torna-se possível a criação e fusão de gêneros, culminando com a “hibridização entre diferentes suportes e linguagens no contexto do cinema digital” (FELINTO, 2006, p. 417), e a adequação a necessidades impostas ao entretenimento pelo consumidor. O fenômeno da tecnologia acoplada ao entretenimento será debatido no próximo capítulo, aprofundando o diálogo sobre
  • 19. 18 evolução tecnológica, simbiose com o lazer e a adaptação tanto da indústria cinematográfica como publicitária. Uma vez apresentada a origem do cinema, é possível perceber a relação que este possui com o entretenimento. Adaptado em seus primórdios para apresentações em casas de shows e curiosidades, evoluindo posteriormente para um novo modelo de negócio, ainda mais voltado para o público e o espetáculo. A adoção da cultura de massa e a reestruturação causada pela inserção do digital ressaltam um meio em constante mudança, visando adequação perante as necessidades impostas pelo público. A história do cinema nos permite avaliar que se trata de uma força midiática de peso, uma verdadeira indústria do entretenimento. 2.3 A MÍDIA E O CINEMA Ao longo desse estudo, trataremos sobre conceitos midiáticos, tanto relacionados ao cinema como a publicidade, televisão, internet, entre outros. Distintas abordagens dos autores estudados, com visões únicas sobre o poder e a influências dos meios midiáticos, contribuirão para um melhor entendimento dos temas tratados, além de consolidar uma base estável de termos e conceitos a serem utilizados. Ao tratar sobre mídia, devemos iniciar com talvez o mais conhecido termo entre estudiosos de comunicação: a indústria cultural. Proposta por Adorno e Horkheimer (1985) em seu Dialética do Esclarecimento, envolto no cenário da Segunda Grande Guerra, os autores afrontaram o mundo em que viviam, alegando a padronização da cultura, transformada em indústria. Como afirmam em sua obra, “a cultura contemporânea confere a tudo um ar de semelhança. O cinema, o rádio e as revistas constituem um sistema. Cada setor é coerente em si mesmo e todos são em conjunto” (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 99). Esse aspecto industrial atribuído às produções culturais dialoga com o período histórico e as mudanças culturais testemunhadas pelos autores ao se estabelecerem nos Estados Unidos, destoantes e mais massificadas que as do continente europeu: O cinema e o rádio não precisam mais se apresentar como arte. A verdade de que não passam de um negócio, eles a utilizam como uma ideologia destinada a legitimar o lixo que propositalmente produzem. Eles se definem a si mesmos como industrias, e as cifras publicadas dos rendimentos de seus diretores gerais suprimem toda dúvida quanto à necessidade social de seus produtos (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 99).
  • 20. 19 No entanto, ao longo dos anos, outros autores perceberam a necessidade de adaptação de certas ideias de Adorno e Horkheimer, uma vez que o ambiente cultural e tecnológico havia evoluído. Um autor que apresenta reformulações para os conceitos circundantes da indústria cultural, levando em consideração as mudanças socioculturais, é Cohn (2008). Ele reconhece a importância de se compreender o aspecto situacional, o contexto da obra, e ao comentar sobre a origem do termo indústria cultural, afirma que veio como uma resposta a outro, a cultura de massa. De acordo com seus elaboradores, a indústria cultural era mais apropriada para analisar o mundo contemporâneo, uma vez que invertia a ordem proposta pela cultura de massa, de que as massas eram as produtoras de cultura. Como vimos, Adorno e Horkheimer viam o cenário cultural como uma automação de conteúdos antes voltados para a arte: “a indústria cultural desenvolveu-se como o predomínio que o efeito, a performance tangível e o detalhe técnico alcançaram sobre a obra, que era outrora o veículo da Ideia [...]” (ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 103). Segundo os autores, a organização da cultura tinha poder decisivo sobre as massas, que eram reduzidas a consumidoras de bens culturais. Cohn (2008) afirma que a junção entre cultura e indústria não pode ser vista como algo definitivo, a cultura se emaranhando sem saída em meio a produção industrial, que a padroniza sem escrúpulos. Ao contrário, Cohn revela que “nenhum desses dois polos se realiza plenamente no processo” (COHN, 2008, p. 67). A cultura perde sua capacidade de organização e autonomia para decidir a maneira como se relaciona com o mundo, ficando a mercê da indústria. Esta, no entanto, não pode exercer sua lógica exata em bens culturais, sendo obrigada a levar em consideração valores intangíveis, estéticos. Dizer que a indústria criou um padrão, em que “produtos não circulam como portadores autônomos de significados próprios, mas o fazem na condição de mercadorias” (COHN, 2008, p. 68) é correto, mas não totalmente. A indústria tem como meta causar efeitos específicos em seus consumidores, modelando seus produtos para este fim: “Busca respostas a estímulos, e quanto mais padronizadas melhor” (COHN, 2008, p. 73). O autor ainda ressalta a importância do fator humano, uma vez que a indústria cultural, não sendo uma força todo-poderosa, deve se dispor de meios não autoritários para exercer sua soberania. Os mecanismos sociais utilizados, segundo Cohn (2008), “chegam a desembocar na própria psique individual”. Tratando da mesma influência que a indústria cultural possui nos indivíduos, Kehl (2005) traz uma abordagem distinta, utilizando o conceito da imagem. Mesmo que não mencionando o cinema diretamente, pode-se inclui-lo na discussão da autora, por se tratar de um meio midiático de muita importância, presente na criação e divulgação de conteúdo. Segundo ela, estamos em um ciclo vicioso, no qual acumulamos capital (catalogado como
  • 21. 20 imagens em seu artigo) inadvertidamente, em nossos momentos de lazer e conforto. Não existe liberdade de opção segundo Kehl, o indivíduo escolhe dentre uma seleção determinada pela indústria, onde todas são efetivamente a mesma escolha. Explica com suas palavras “A alienação, no modo de produção do capitalismo avançado que é, predominantemente, produção de imagens, abarca a todos na medida em que as imagens convocam a todos, sem exceção” (KEHL, 2005, p. 239), mas também cita Adorno e Horkheimer, como forma alternativa de explicação: O princípio impõe que todas as necessidades lhe sejam apresentadas como podendo ser satisfeitas pela indústria cultural, mas, por outro lado, que essas necessidades sejam de antemão organizadas de tal sorte que ele se veja nelas unicamente como um eterno consumidor, como objeto da indústria cultural (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 133). Segundo a autora, “Imagens enunciadas por ‘ninguém’ e dirigidas a ‘todos’ são hoje o principal produto da cultura de massas” (KEHL, 2005, p. 237), transmitidas a toda velocidade de forma sedutora e abrangente e seguindo os padrões da cultura de massas, proporcionando experiências sempre novas e rentáveis para a indústria. Kehl relata a fetichização dos objetos, muitas vezes via corpos de seres humanos célebres, os ídolos de massa, que atuam como contraponto da mediocridade e banalidade da vida do indivíduo comum, mostrando todo o luxo e esplendor que a indústria cultural os oferece. A sociedade é obcecada pela fama, “o espetáculo promove a afirmação da vida humana como visibilidade: existir hoje é ‘estar na imagem’” (KEHL, 2005, p. 242). Bezerra e Covaleski (2013) dão continuidade as ideias apresentadas, agora com foco na atualidade. Comentam sobre os consumidores contemporâneos, que segundo eles se distanciaram da comunicação em massa praticada décadas antes, para algo mais refinado. Estes mesmos “não são passivos às mensagens que recebem e não absorvem produtos ou ideias sem uma recepção crítica” (BEZERRA; COVALESKI, 2013, p. 124). Essa visão atual do papel do expectador no consumo de conteúdo leva em consideração os avanços feitos na área digital, permitindo uma maior escolha por parte do receptor: O consumidor contemporâneo – em sua maioria – não é passivo, deixou para trás a identidade da submissão; é agora, sim, ativo, projeta-se à participação e à colaboração. Domina e faz questão de usar os mecanismos de interação; produz e dissemina seu próprio conteúdo; é o dono da sua liberdade para o consumo e influencia o de seus pares (BEZERRA; COVALESKI, 2013, p. 122).
  • 22. 21 Assim como Bezerra e Covaleski, uma leva de autores analisa o poder do consumidor, agora capaz de escolher o conteúdo e rejeitar o que não lhe interessa. Kellner (2001), por exemplo, renega a ideia de uma mídia todo-poderosa, manipuladora do ser humano. Para ele, existiria um equilíbrio entre as forças, diferente do que se propõe na Escola de Frankfurt. Sobre esta, afirma que devem ser revisitadas, uma vez que a evolução da sociedade e a introdução dos meios digitais contribuíram para a reestruturação da mídia como um todo. De maneira similar, opõe-se aos pensadores de Frankfurt, que abstraem a imagem veiculada pela mídia de seu conteúdo ideológico, evidenciando a destruição da simbologia e significado de ditas imagens. Ao contrário, o autor enaltece a importância dos significados e valores das imagens da cultura da mídia, assim como o processo de construção das mesmas. Entende que um texto não está contido em sua forma física, mas que está inserido em um sistema ideológico e, portanto, é necessária uma análise aprofundada, afim de entender sua construção intertextual. Como visto, a discussão sobre a indústria cultural, sua relação com o consumidor e a retomada da influência deste no processo de consumo leva a visões distintas de como analisar esse fenômeno. Há um claro embate entre os que veem a mídia como geradora de mensagens altamente genéricas ou específicas. Analisando a relação do cinema com esses pensamentos, a autora Gonçalves (2008) relata o caráter inevitável da reprodução industrial no meio cinematográfico, uma vez que se trata do cerne dos negócios desta forma de arte. Abordando em seu artigo conceitos de Walter Benjamin relacionados a obras de arte no mundo contemporâneo, menciona como a reprodutibilidade em grande escala retirou o caráter único da obra de arte, a chamada aura. Como causas, afirma que Benjamin acusa a necessidade da proximidade e humanização do conteúdo e a preferência da reprodução ao único. Com o surgimento de novos meios, a reprodução artística impossibilitou o aspecto único e tradicional, dando lugar a um envolvimento mais íntimo com a política e o capital. E isso não foi diferente com o cinema, segundo Benjamin possuindo características únicas que tornam esse processo inevitável: A reprodutibilidade técnica do filme tem seu fundamento imediato na técnica de reprodução. Esta não apenas permite de forma mais imediata a difusão em massa da obra cinematográfica, como a torna obrigatória (BENJAMIN, 1987 apud GONÇALVES, 2008, p. 2). Sendo um processo árduo e caro, a criação de um longa-metragem requer difusão em grande escala para gerar lucro, de forma que o cinema foi atrelado aos interesses políticos e econômicos, já mencionado no tópico anterior, e a indústria cultural. Gonçalves (2008) cita um
  • 23. 22 exemplo que demonstra a necessidade da alta veiculação como forma de lucro: a criação do cinema falado, que se provou inicialmente um retrocesso, pois limitava o alcance devido a barreiras linguísticas. A expansão veloz da nova mídia, atrelada ao alto número de pessoas impactadas, faz do cinema uma força cultural, que requer essa expansão para manter-se. Em suma, a mídia, incluindo o cinema, passou por diversas interpretações a respeito de sua natureza ao longo dos anos. Os conceitos de comunicação midiática são reavaliados e retrabalhados ad eternum, adaptando-se a novos entrantes no cenário. Há os que acreditam no caráter industrial e genérico da indústria, enquanto outros reconhecem a individualização e especificação dos conteúdos. Alguns dos autores citados escreveram seus artigos antes do boom da internet, sem entrar em contato com meios de veiculação de conteúdo como Youtube e Netflix, que certamente revolucionaram a maneira de se consumir produtos midiáticos. Deve- se entender a progressão feita, e adequar-se de acordo, aceitando visões distintas para compor um panorama geral da mídia. Uma vez endereçado o aspecto midiático, é hora de tratar do cinema em específico, de sua influência e veiculação. 2.4 CINEMA COMO VEÍCULO E INFLUÊNCIA CULTURAL Covaleski (2009), em poucas palavras, define o impacto que o cinema causou e ainda causa na sociedade, cultural e psicologicamente: “O cinema é claramente uma das expressões artísticas mais consumidas e cultuadas, alimentando o imaginário coletivo de pessoas ao redor do mundo, a mais de um século” (COVALESKI, 2009, p. 17). Por mais que não aparente ser um tema de relevância para este trabalho, o impacto da mídia afeta de maneira direta e clara na produção de conteúdo. Como o próprio autor cita em seu livro Cinema, Publicidade, Interfaces, tanto o cinema como a publicidade se relacionam de maneira simbiótica na troca de informações, tendências, entre outros. Portanto, neste tópico iremos abordar os aspectos da sétima arte referentes à mecanismos utilizados na veiculação das ideias, assim como as ideias em si, a gama de influências geradas por esse meio. E como a atuação dos dois moldou o ambiente a nossa volta, incluindo as obras escolhidas para análise nesta pesquisa. Retomamos Gonçalves (2008) que aborda conceitos de Walter Benjamin. Este adota uma postura ambígua ao julgar o cinema, uma vez que considera que seus benefícios e malefícios são provenientes de uma era que já estava sendo organizada, com novas maneiras de se comunicar, de criar arte e de se expressar. Segundo Benjamin, o cinema providenciou um aprofundamento da percepção humana, com imagens que contém inúmeros significados, assim como o aumento da capacidade onírica do indivíduo. No entanto, o receptor absorve toda a
  • 24. 23 informação de maneira tátil, ou seja, tudo que possui caráter sensível o atinge. Para evitar uma possível sobrecarga, o cinema se utiliza da distração ou como vamos ver posteriormente, o entretenimento. Estas assumem a forma de fragmentos de informação, as cenas, que servem para quebrar o fluxo de ideias do espectador. Por sua vez, estes amortecimentos de choques criaram uma sociedade habituada a este tipo de percepção, resultando em relações “mutiladas” e um público capaz de se distrair e ao mesmo tempo examinar o que passa na tela, uma espécie de “crítico distraído”. Apoiando-se em Freud, Benjamin (1997 apud GONÇALVES, 2008, p. 5) conclui “quanto mais corrente se tornar o registro desses choques no consciente, tanto menos se deverá esperar deles um efeito traumático”, desse modo transformando a experiência em vivência. Sob uma nova ótica, vimos que outros autores reconhecem o poder da narrativa como construtor, independente ela qual seja, como é o caso de Silverstone (2011) que introduz mecanismos componentes do engajamento textual, a relação mensagem-receptor, sendo eles a retórica e a poética. A primeira pode ser explorada como um aspecto da mídia e uma ferramenta de análise. A linguagem midiática tem o objetivo de influenciar e cativar, e, portanto, deve se basear na diferença e na liberdade (seria ilógico tentar convencer alguém que não tem escolha). Para uma comunicação mais eficiente, a retorica implica um certo grau de identidade entre o orador e o receptor, podendo se utilizar dos “lugares comuns”, conceitos e ideias que são compartilhados por uma comunidade e dados como senso comum. Já a poética, de forma similar, se utiliza de seu público e sua necessidade de participação. Silverstone afirma que nós, como audiência ou oradores, convertemos tanto experiências como imaginação em histórias. Ao consumir uma história, estamos essencialmente analisando a capacidade de articulação desta dentro da nossa cultura comum. Como afirmado pelo autor: “Procuramos compreender os ritmos de sua narrativa, sua caraterização, suas maneiras de representar um mundo reconhecível” (SILVERSTONE, 2011). Suas ideias contrastam as de Walter Benjamin, que lamenta o declínio da história na modernidade, sendo soterrada pelo excesso de informação proveniente da mídia. Silverstone acredita no potencial da mídia como proliferadora de histórias, que o consumidor pode se relacionar estes produtos com a experiência. Com diversas mídias impulsionando, a história se tornou uma mercadoria no mundo, como veremos ao tratar de storytelling no próximo capítulo. Covaleski (2009), por fim, apresenta uma visão menos fatalista da influência do cinema em nossas vidas. Nos lembra da dualidade deste, ao mesmo tempo realista e artística. Segundo ele, se trata de um meio em constante evolução, construindo, aperfeiçoando e se adaptando novos procedimentos e narrativas. Ao abordar conceitos como repertórios e criação
  • 25. 24 de informações, de forma semelhante à Benjamin, afirma que o conjunto de ideias oriundas da vivencia individual constitui o imaginário único, que distingue uma pessoa de outra. Nas palavras de Costa (2002): O conhecimento é o resultado de processos mentais que vão modificando a imagem – síntese da relação que mantemos com dado fenômeno – até transforma-la em uma ideia que, além dos dados dos sentidos, envolve valores, afetividade e a relação da nova experiência com imagens anteriores armazenadas em nossa memória (COSTA, 2002, p. 86). Estas ideias se relacionam com a reprodução mecanizada do cinema, mas também com o surgimento de novos mecanismos, tanto de comunicação como artísticos, que permitiram novas abordagens e olhares. Este meio providencia ao público experiências sensoriais, atrelada à aura mítica providenciada pela mídia, gerando emoções e tendências consumistas. Continuando com abordagens similares a autores já citados, agora tratando da linguagem cinematográfica, algo semelhante as distrações de Benjamin, Covaleski (2009) remete aos primeiros estudiosos do tema, que visavam entender os efeitos gerados pelos longas- metragens, assim como entender quais efeitos contidos em ditas obras acarretariam reações favoráveis do público. Como afirma, “a linguagem trabalhada pelo cinema induz o espectador a consumir algo intangível, porém carregado de significados e simbolismos, os sonhos” (COVALESKI, 2009, p. 71). Estes sonhos, por sua vez, seriam transformados em bens de consumo, tudo podendo ser oferecido ao espectador mediante a ilusão do cinema. Covaleski também escreve sobre o repertório cinematográfico, afirmando: A recepção que cada público da à mensagem a que está exposto gera uma construção de significação própria em cada indivíduo, a partir da atividade cognitiva que todo receptor possui. Essa atividade atua sobre uma base de índices e códigos que são identificados na mensagem. Mas além de eventuais operações de ordem cognitiva, há também traços de referencias culturais e sociais com os quais o indivíduo tenha se relacionado (COVALESKI, 2009, p. 86). De maneira semelhante, Kellner (2001), como Silverstone, analisa os textos transmitidos pela mídia, e como estes influenciam na construção de identidade e comportamento. Preocupa-se com a influência do excesso de informação na sociedade, algo que veremos posteriormente com Lehu (2007), mas afirma que os indivíduos têm o poder de aceitar ou rejeitar possíveis estímulos formadores de identidade. Percebe-se que, assim como na mídia, a influência cinematográfica na construção de referenciais e imagens é um tema não totalmente homogêneo, com vertentes afirmando conclusões distintas, baseadas na capacidade de escolha e influência que nós, como receptores, possuímos perante ela. A seguir veremos
  • 26. 25 como os conceitos estudados se aplicam ao comparar o mundo cinematográfico com o da publicidade. 2.5 RELAÇÃO CINEMA - PUBLICIDADE Desde sua criação, o cinema apresenta traços cada vez mais firmes com a publicidade. Costa (2006) menciona uma estratégia desenvolvida pelos irmãos Lumière, onde “ofereciam um esquema de marketing muito interessante para os vaudevilles, seu alvo predileto no mercado. Eles forneciam os projetores, o suprimento de filmes e os operadores das máquinas, e se encaixavam nas programações locais” (COSTA, 2006, p. 20). Houve também a competição das salas de cinema pela preferência do espectador. Antes da crise que afetou a chamada “era de ouro” do cinema americano, a maioria das salas de cinema do país eram propriedade dos próprios estúdios cinematográficos, que disputavam entre si pela atenção do público, seus produtos e diferenciais mercadológicos sendo os próprios filmes. De maneira similar ao cinema, a publicidade evoluiu ao longo dos anos. Adaptou-se conforme novas mídias eram introduzidas ao mercado, como rádio e televisão, e a chegada da internet fez com que o mercado tivesse novamente que se reinventar. A publicidade inicialmente era utilizada para comunicar o maior número de pessoas possível, de maneira massificada e pouco complexa, como nos diz Bezerra e Covaleski (2013). Com o passar dos anos, não só os meios de comunicação evoluíram, mas também o consumidor. Como vimos anteriormente, o consumidor sofreu alterações na maneira como interage com o mundo. Antes mais próximo do modelo apresentado por Benjamin e Kehl, sem grande poder de escolha e discernimento, consumindo “imagens enunciadas por ‘ninguém’ e dirigidas a ‘todos’” (KEHL, 2005, p. 237), transitando para algo mais próximo de Kellner, Silverstone e Covaleski, um indivíduo capaz de escolher e rejeitar aproximações midiáticas que não lhe interessem, tendo “o poder de escolha e, consequentemente, a possibilidade de criar bloqueios e propor intervenções às mensagens publicitárias” (BEZERRA; COVALESKI, 2013, p. 127). Isso significa dizer que a publicidade, assim como outros meios, teve que adaptar as mudanças, criando novos métodos de interação com o público alvo. Se distanciando da enorme quantidade de conteúdo disponível, ruído que dificilmente alcança seu interlocutor, o marketing apostou no entretenimento como novo meio de comunicar-se com o consumidor. Eventualmente, as duas mídias se aproximariam ainda mais, em parte pela hibridização das comunicações, juntamente com o desenvolvimento da tecnologia digital. Nesse momento, o cinema aprofundou uma característica que vinha sendo anunciada há anos: sua relação com a
  • 27. 26 cultura de massa. Retomamos Pucci (2006), e seu debate entre o cinema moderno e o pós- moderno, a diferença sendo o trato com a cultura de massas. Ele ainda ressalta, como já vimos, que se tratando do cinema, essa relação nunca foi submissa: O filme pós-moderno opera com elementos do cinema de entretenimento, do videoclipe e da propaganda, mas não se trata de submissão a tudo isso. O ar respeitoso para com produtos da mídia não deve ser confundido com "homenagens", uma vez que se empreende também sua subversão (PUCCI, 2006, p. 374). Com as novas tecnologias apontado para um futuro cada vez mais integrado e vinculado ao entretenimento, o desafio dessa nova reorganização da publicidade está em sua inserção orgânica nesses meios. Em uma era onde a tecnologia e a variedade de formatos permitem que o consumidor possa simplesmente pular ou ignorar seu anúncio, se tornou vital a simbiose com o conteúdo, sem que o anúncio se torne efusivo demais e desequilibre essa delicada relação. Uma inserção bem colocada, o chamado branded entertainment, faz o consumidor “refém”, incapaz de ignorar a publicidade. “Você não tem como pular a cena em que aparece o produto sem pular, no ato, uma parte do programa” (DONATON, 2007, p. 38). Veremos a seguir como a reestruturação da publicidade permitiu uma nova era de anúncios em veículos já consolidados. 2.6 CONSIDERAÇÕES Neste capítulo foram apresentadas as origens do cinema, sua evolução e relação com a tecnologia, influência midiática, assim como a afinidade com o entretenimento e a publicidade. Pôde-se perceber que o modo de se fazer entretenimento e de se consumir foi se alterando, de acordo com a entrada de novas tecnologias, assim como a evolução na sociedade. Como a relação entre essas duas forças se manteve após a chegada da internet e a reformulação dos meios de comunicação com o consumidor? Depois de estudar a mídia repercutida no cinema, assim como o papel deste como veículo e influência cultural, percebe-se o poder desse meio na divulgação de ideias via entretenimento. Como departamentos de marketing se apropriam desse aspecto para divulgar seus produtos? Estes temas serão analisados no próximo capítulo quando abordaremos detalhes desta relação.
  • 28. 27 CAPÍTULO 2: BRANDED ENTERTAINMENT 3.1 INTRODUÇÃO AO CAPÍTULO Neste capítulo analisaremos o significado de Branded Entertainment e suas aplicações na publicidade e sistema de comunicação de marcas. Inicialmente, abordaremos o conceito de marca, através de Batey (2010), para melhor sedimentar as discussões que se seguirão. Depois, analisaremos a transformação do mundo midiático, com a pulverização de conteúdo, e como isso evoluiu para novos métodos de se comunicar a marca ao consumidor. Discorreremos sobre o entretenimento como poder cultural e a marca aplicada a esse contexto, por meio de Lehu (2007), Donaton (2007) e Palacios e Terenzzo (2016). Por fim, traremos a marca NASA para os conceitos estudados, uma vez compreendidas as relações da marca com o entretenimento, analisaremos sua atuação no cinema. 3.2 A MARCA E SUAS CARACTERÍSTICAS Sendo o objetivo deste trabalho compreender a transformação da marca NASA através do Branded Entertainment, iniciamos uma análise sobre o conceito de marca. Em sua obra O Significado da Marca, Batey (2010) apresenta uma abordagem contemporânea sobre a natureza destas, defendendo a importância dos significados que retém com seu público. Segundo ele, é “a percepção do consumidor e sua interpretação de um agrupamento de atributos, benefícios e valores associados a ela. [...] Uma marca é um agrupamento de significados” (BATEY, 2010, p. 31). Marcas são objetos simbólicos, que legitimam a identidade do consumidor. Por sua vez, identidades são construídas através da satisfação de necessidades oriundas dos próprios consumidores, e possuem grande valor para uma empresa, pois são chave no processo de tomada de decisão. Tratam-se de exigências biológicas e psicológicas, com diferentes níveis de complexidade, desde um caráter utilitário e racional até aspectos simbólicos, como senso de experiência e legitimação de identidade. Batey afirma que necessidades podem se sobrepor e se transformar, de acordo com o contexto do indivíduo e o espaço de tempo dado, como que num fluxo constante de adaptação e afirma:
  • 29. 28 O ponto interessante a se notar em relação ao significado de uma marca é que, uma vez que as necessidades básicas tenham sido materialmente satisfeitas, os aspectos mais importantes culturalmente começam a se impor, e as pessoas se preocupam mais com o significado simbólico dos bens do que com seu uso funcional (BATEY, 2010, p. 40). Entendida a fluidez com que as necessidades se criam e se modificam, deve-se mencionar que, assim como um consumidor pode possuir diversas necessidades, uma marca pode e deve satisfazer diversas necessidades simultaneamente. Segundo Batey, um consumidor tem necessidades concomitantes, funcionais, emocionais e outras ao mesmo tempo, como uma pasta de dentes que “combate cáries e dá hálito fresco e atraente”. Sobre a relação marca-consumidor, o autor comenta sobre a mudança de escopo na comunicação das marcas. Em comparação com táticas antigas de marketing, que dialogavam apenas pelo âmbito funcional e prático, o autor afirma que atualmente se presta especial atenção ao aspecto emocional, para atrair e conquistar definitivamente o consumidor. Cita Gordon, que de maneira semelhante afirma: As marcas são codificadas na memória de uma base cognitiva (pensada, analisada, considerada) e emocional (somática). Esses dois elementos da codificação de uma marca são umbilicalmente ligados e determinam se as pessoas prestam ou não atenção aos estímulos vindos da marca (GORDON, 2002 apud BATEY, 2010, p. 194). O significado de uma marca provém de uma associação entre os fatores citados. Ambos em uso garantem um maior alcance e capacidade de atenção e retenção do consumidor. Batey completa: “O significado de uma marca é estabelecido a partir de como ela é percebida pelo público em nível consciente e de como ela age dentro dele no nível semi ou subconsciente” (BATEY, 2010, p. 189). O autor faz menção às ideias de Keller (1998 apud BATEY, 2010, p. 198), que comenta sobre ditas associações, denominadas associações somáticas de marcas. Mecanismos, segundo ele, que conectam experiências e sensações à produtos ou empresas, sendo dividas em 3 grupos: atributos, que podem ou não estar relacionados à marca. Os relacionados constituem os significados concretos de uma marca (função, contexto de uso), enquanto os não relacionados os significados simbólicos (percepção da marca, imagem do usuário); benefícios, que ditam a maneira como uma marca pode resolver um problema ou facilitar a vida do consumidor, com facetas distintas (Funcionais, sensoriais, expressivos e emocionais); atitudes, que se referem a ao quanto é desejável que uma marca possua os atributos e benefícios que possui, podendo ser entendido como respostas afetivas dos consumidores para com a marca. Sobre essas associações, Keller (1998 apud BATEY, 2010, p. 208) propõe uma estrutura onde
  • 30. 29 “a marca forte se diferencia, em primeiro lugar, pela relativa força de suas conexões, depois pelo grau com que elas são avaliadas como sendo desejáveis pelos consumidores e, finalmente, pela característica única dessas associações”. Batey (2010) propõe que o significado principal de uma marca se constitui das principais associações feitas, da maneira como o consumidor define a marca, seus atributos e imagem. Entender sua natureza é essencial para uma marca manter sua comunicação focada. Não raro, a percepção que uma marca tem de si mesma pode ser destoante da percepção de seus consumidores. A comunicação deficiente, segundo o autor, pode gerar decisões equivocadas. A marca deve estar atenta à sua identidade, uma vez que esta tem papel central na percepção do consumidor. Batey (2010) afirma que as marcas possuem um papel de destaque na construção da identidade deste. O consumidor “não é mais que um ator em busca de uma identidade [...] O homem pós-moderno se constrói ao redor da imagem que ele projeta para os outros na cultura do consumo” (LEARY; KOWALSKI, 1990 apud BATEY, 2010, p. 70). As que apelam para experiências, motivações e arquétipos criam relações emocionais fortes com seus consumidores. Batey (2010) corrobora esse pensamento ao afirmar que ao abordar arquétipos, uma marca se comunica com a ancestralidade, simbologias que são comuns a todos e, portanto, se conecta mais profundamente com seus consumidores. 3.3 BRANDED ENTERTAINMENT Uma vez entendida as características da marca e a necessidade de interação com o consumidor, proveniente de diferentes ângulos, deve-se compreender que esse fato isolado não garante o sucesso de uma empresa. Deve-se também entender as mudanças no ambiente midiático e saber como melhor posicionar-se diante destas. Assim como visto em Kellner (2001), autores como Lehu (2007) e Palacios e Terenzzo (2016) discutem a evolução do cenário em questão e apontam para a saturação completa de todos os meios de comunicação, em todo o mundo. Comparado com décadas anteriores, a contemporaneidade conta com a pulverização de tanto marcas quando canais. Sobre isso, Lehu diz: “Existem centenas de estações de rádio e canais de televisão [...], milhares de jornais diários ou revistas, dezenas de milhões de sites na internet [...], de modo que uma vida inteira nesse planeta não seria longa o bastante para lê-los todos”2 (LEHU, 2007, p. 26, tradução do autor). O advento da internet de banda larga acelerou 2 “There are hundreds of radio stations and television channels [...], thousands of daily newspaper or magazine media, tens of millions of internet sites [...], so that an entire lifetime on this earth would not be long enough to read them all.”
  • 31. 30 vertiginosamente o processo, de forma que nem todos estão totalmente adaptados a esse novo panorama. Para Lehu (2007) a linearidade e estabilidade dos modelos de comunicação não existem mais, a explosão de conteúdos fragmentou a audiência. Segundo o autor, isso significa entender e abraçar a metamorfose sofrida pela sociedade, criando novos mecanismos adequados para o novo panorama midiático: “Essa conclusão convida a uma contemplação mais atenta do conteúdo – de forma a tentar reter a atenção de alguns poucos consumidores – e das possibilidades de colocar a marca em uma boa posição”3 (LEHU, 2007, p. 28, tradução do autor). Em meio a inúmeras marcas disputando a atenção do consumidor, tornou-se mais relevante buscar um público correto, que se relaciona com a marca, do que simplesmente procurar o canal com enormes audiências. A marca deve ir ao consumidor, e não o contrário. A quebra de antigos modelos, como horários de trabalho, momentos de lazer e a própria estrutura familiar fez com que a mobilidade e praticidade se tornassem um padrão na vida moderna. Analisando o cenário contemporâneo e ainda ressaltando a saturação vivida pelos meios de comunicação, Lehu (2007) aponta para o problema da televisão, que perde cada vez mais espaço para filmes e séries no modelo stream. Neste, o espectador não pode ser exposto a comerciais, uma vez que podem ser puladas ou mesmo suprimidas antes de sua disponibilização, fazendo com o investimento no famoso modelo “30 segundos” perca parte de seu atrativo. Como visto em Covaleski, Silverstone e Kellner, o consumidor agora se tornou mais crítico quanto ao conteúdo que recebe, uma vez que os avanços tecnológicos permitem a escolha do que consumir. Lehu (2007) também evidencia o crescimento dos videogames, que “raptam” por grandes períodos de tempo possíveis espectadores, em horários considerados “chave” na perspectiva do advertising. Trata-se de um meio invejável do ponto de vista dos anunciantes, pois “não só os jogadores são frequentemente leais a seus videogames, como também estão concentrados em suas telas, uma combinação bastante desejada por anunciantes”4 (LEHU, 2007, p. 27, tradução do autor). O autor ainda relata que a nova geração, os chamados millenials, que cresceram com a internet, passam mais tempo nesta do que na TV. Um comportamento que dificulta a comunicação efetiva dos anunciantes tradicionais com seu público. 3 “This conclusion invites more attentive contemplation of the content – in order to attempt to retain the attention of a few consumers – and of the possibilities of placing the brand in a good position there.” 4 “not only are the players often loyal to their videogames, but they are also concentrated on their screens, a combination much sought-after by advertisers.”
  • 32. 31 Atento aos novos formatos midiáticos que surgiram, Lehu (2007) evidencia a procura das marcas para colocarem-se em locais inusitados, com alta visualização que possa surpreender e sensibilizar o espectador desejado. A atenção do marketing volta-se para a internet, com suas múltiplas formas de comunicação, cada vez mais consolidada omnisciência e custos relativamente baixos. Com o seu auxílio, ações digitais, promovendo interação marca- consumidor estão se fixando no mercado. Esse movimento promove o afunilamento do público- alvo para um maior e melhor impacto e coloca inserções em situações cotidianas, próximas ao consumidor. Novos meios de comunicação surgem com frequência, oferecendo novas possibilidades de inserções para as marcas. Para melhor aproveita-los, deve-se haver coerência na estratégia de comunicação por parte das empresas, nesta expansão para novos meios, levando-se em consideração os atributos e personalidade de cada empresa. O autor complementa: Para existir, uma marca deve ser conhecida: não necessariamente por todos, mas a todo momento por aqueles que provavelmente comprarão seus produtos. Para que isso ocorra, ela deve ser posicionada em todos os lugares estratégicos que a permitirão se conectar com esta audiência em potencial 5 (LEHU, 2007, p. 18, tradução do autor). Dessa forma, tornou-se necessário para marcas diversificarem suas inserções no ambiente midiático, de forma a melhor impactar o consumidor. Lehu (2007) apresenta o product placement como modo de garantir a visibilidade no meio audiovisual. A marca é inserida dentro de uma obra, fazendo parte do cenário e podendo até interagir com os personagens. Sabendo que o conteúdo disponibilizado na internet, muitas vezes pelas próprias emissoras (HBO, Amazon, Netflix, entre outras), dispensa blocos comerciais, o product placement se torna uma opção que contorna essa tendência. Desse modo, “a vantagem do product placement é que, até hoje, não pode ser evitado”6 (LEHU, 2007, p. 33, tradução do autor). Ainda que exista a possibilidade de borrar a marca em uma transmissão esportiva, por exemplo, esse recurso atualmente não existe em larga escala. Ainda que resolva parcialmente o dilema da exposição da marca, o product placement não oferece, pelo menos não a princípio, a já mencionada e necessária conexão emocional entre marca e consumidor. Lehu (2007) aponta para a necessidade de marcas possuírem um elo 5 “In order to exist, a brand must be known: not necessarily by everyone, but in every event by those who are likely to buy its products. For this to occur, it must be placed in all the strategic locations that will enable it to connect with this potential audience.” 6 “the advantage of product placement is that, to date, it cannot be avoided.”
  • 33. 32 emocional com seu público: “O poder do depoimento feito por um amigo ou familiar a favor de uma marca não tem nada em comum com o aspecto randômico de um argumento publicitário apresentado em cerca de 30 segundos durante uma pausa comercial na televisão”7 (LEHU, 2007, p. 224, tradução do autor). No passado, muitas empresas não levavam em consideração, ou simplesmente ignoravam, o fato de suas marcas possuírem personalidades e identidades. É preciso entender que uma marca “viva” não é propriedade exclusiva de seus donos, mas também de seus consumidores. Para viver, elas devem compartilhar emoções, criar desejos e necessidades, fazerem parte do cotidiano e emocional de seus usuários. É nesse contexto mercadológico e midiático que surge o Branded Entertainment. Adaptado do product placement, apresenta um grau mais elevado de sofisticação no sistema de comunicação com o consumidor, sendo uma resposta a falta de atenção do espectador contemporâneo. Mais do que simplesmente estar inserida no cenário, a marca se coloca no contexto narrativo relevante para a história. Sua presença no roteiro é orgânica, longe de ser um placement tradicional, demasiado óbvio. Dessa maneira, uma marca pode interagir profundamente com o público, estando inserida em situações emocionais genuínas, permitindo uma melhor conexão marca-consumidor. Segundo Lehu (2007), não se deve ver o Branded Entertainment como mais um vetor de comunicação, e sim, um veículo que possibilita a oportunidade de criar laços emocionais entre marca e espectador: “[branded entertainment] contribui para o awareness da marca a curto prazo, mas também para sua imagem e todos os seus elementos constituintes no médio a longo prazo” 8 (LEHU, 2007, p. 244, tradução do autor). Esse modo distinto de se divulgar uma marca, atrelando-a ao aspecto emocional do consumidor, é analisado por Palacios e Terenzzo (2016), sob a ótica do storytelling. Segundo os autores, é através de histórias relacionadas ou protagonizadas por uma marca que o consumidor se conecta, criando um posicionamento de mercado único através do viés emocional. Quando genuínas, essas conexões geram confiança, sendo impossíveis de serem copiadas. Esse aspecto se relaciona com o que afirma Silverstone (2011) e a relação consumidor-produto através da história. Os autores comentam sobre os benefícios de tal conexão: Uma marca envolvente pode proporcionar inúmeros benefícios para um negócio. A primeira é que permite preços maiores pois o consumidor enxerga maior valor quando 7 “The power of testimonial by a friend or family member in favour of a brand has nothing in common with the random aspect of an advertising argument presented over 30 seconds during a commercial break on television.” 8 “(branded entertainment) contributes to short-term awareness of the brand, but also to its image and all its constitutive elements in the medium to long term.”
  • 34. 33 o produto ou serviço vem acompanhado de uma marca com uma boa história (PALACIOS; TERENZZO, 2016, p. 267). Por meio do branded entertainment e do storytelling, uma marca com alto valor emocional agregado remete em seu consumidor uma expectativa pré-estabelecida, provenientes de experiências anteriores. Escolhas são feitas baseadas nesse aspecto, e podem ter maior força no momento da compra do que concorrentes com produtos tecnicamente “melhores”. Marcas desse tipo atraem seguidores, fãs que a idolatrarão e perdoarão eventuais deslizes. Segundo os autores: “Na mente do consumidor, as histórias facilitam a gestão das expectativas da marca” (PALACIOS; TERENZZO, 2016, p. 268). E mais, uma vez alcançado esse patamar, torna-se mais fácil para uma marca manter esse status como afirmam os autores: A partir do momento que temos uma base de pensamento, as novas informações devem ser imputadas para reforçar aquela percepção inicial. Sempre que você simpatiza, admira ou até idolatra alguma marca, você assimila novas informações para que esse sentimento continue sendo verdadeiro (PALACIOS; TERENZZO, 2016, p. 61). Esses fatores foram testados de forma pioneira no case da BMW, “The Hire”. Concebido em 2001, em uma época onde os conceitos de branded entertainment e storytelling ainda não eram amplamente divulgados e praticados pelo mercado, a BMW se propôs a inovar, como o autor Donaton (2007) comenta. Produzidos ao longo de dois anos, a série de comerciais contou com diretores hollywoodianos e superproduções cinematográficas. A marca viu-se apostando em formatos que não possuíam garantia de sucesso. Deu liberdade criativa quase total aos diretores, abrindo caminho para a narrativa e insights destes. Mais, tanto a marca como os carros da BMW mal têm destaque nas peças, e são colocados em situações bastante adversas. A divulgação das peças não foi feita via televisão, como era o padrão até então, mas sim via internet. Em uma era pré-Youtube, as pessoas eram incentivadas a baixarem os vídeos no site oficial da marca. Ao contrário do que se imaginava, a campanha foi um sucesso retumbante. As vendas cresceram 12,5% nos três anos consecutivos, e a imagem da marca foi fortalecida para o público jovem, usuário de internet e o principal impactado pela campanha, até então fora do escopo da BMW. Donaton (2007) afirma que o sucesso provou a capacidade de interação do consumidor via um novo veículo, focado na relação emocional com seu público. Os curtas vendiam não produtos, mas a identidade da marca. Estes se tornaram um estudo de caso de sucesso sobre a veiculação de uma marca via entretenimento.
  • 35. 34 Uma vez entendido o panorama midiático contemporâneo, assim como as diversas saídas que marcas tem encontrado para se comunicarem com seu público de modo a gerar conexões duradouras, chegamos ao branded entertainment. Uma solução refinada e comprovadamente bem-sucedida, que combina inserção em meios de grande visualização, mas com foco na relação emocional com o consumidor. A seguir, analisaremos a aplicação desse modelo na mídia estudada neste estudo: o cinema. 3.4 BRANDED ENTERTAINMENT NO CINEMA Pode-se imaginar que a estratégia de inserção de marcas em meios de entretenimento é uma prática recente. Entretanto, como afirma Lehu (2007), isso já é realizado desde o fim do século XIX, em uma época onde atores de teatro e cabarés eram usados como garotos- propaganda para diversos produtos, e onde pôsteres de peças contavam com o nome da marca patrocinadora quase tão grande quanto o nome do próprio espetáculo. O advento do cinema apresentou-se como um enorme potencial, tanto para o entretenimento como para alcance de público, e foi rapidamente percebido como um bom investimento para marcas. Por se tratar de um meio altamente criativo, os anunciantes tinham liberdades maiores com a forma de expor seus produtos, indo desde elementos de narrativa, atributos de personagens e a própria disposição do cenário. Da mesma forma como as marcas abraçaram o cinema, este também entendeu as vantagens dessa nova associação. No início, se tratava mais da exposição dos produtos do que a marca propriamente, através de acordos pelos quais eram fornecidos materiais, serviços e acessórios e como consequência, estes apareceriam no filme. Lehu (2007) comenta que o placement surgiu inicialmente para reduzir custos de produção, principalmente se tratando de objetos de cena e possíveis locações exóticas, como aviões, carros de luxo, entre outros. Um bom contrato com uma marca poderia significar milhares ou milhões de dólares a menos dos gastos da produção de um filme. Da mesma forma, “financiamento também pode significar não ter que pagar por produtos ou serviços utilizados”9 (LEHU, 2007, p. 38, tradução do autor). Conforme a indústria cinematográfica foi se aperfeiçoando, a competição foi se acirrando, e logo os padrões do mercado se tornaram elevados. Donaton (2007) comenta sobre a expansão do número de salas de cinema, assim como a evolução nos meios de comunicação, e como isso possibilitou maiores arrecadações e estreias mundiais, ao invés de locais. O papel 9 “funding can also come from not having to pay for the products or services used.”
  • 36. 35 do marketing passou de secundário para protagonista nessa transição, ditando os lançamentos de trailers e o público alvo da obra. Para garantir o sucesso de arrecadação, as verbas de marketing também subiram, uma vez que se torna necessário instigar o público ao máximo para assistir ao filme, em especial no fim de semana da estreia. Sobre esse fenômeno, Donaton comenta: O contexto atual faz com que o negócio do cinema seja em si mesmo extremamente arriscado. Apesar de os estúdios gastarem dez a vinte vezes mais em marketing do que as gravadoras e os selos musicais, eles precisam de cada vez mais apoio do marketing para alcançar o público e conter os custos (DONATON, 2007, p. 92). Com o custo crescente para a realização de um longa-metragem, devido à concorrência acirrada, maior demanda por efeitos especiais de qualidade e grandes estrelas no elenco, é de esperar um valor de produção na casa dos milhões de dólares. Financiar estes projetos tornou- se uma tarefa árdua, sendo possível em grande parte graças a atuação das marcas e seus acordos de inserção. Lehu comenta: “o orçamento de um filme nunca foi garantia de sucesso, mas paradoxalmente seu tamanho tranquiliza potenciais investidores. Daí o papel fundamental (as vezes indispensável) de contratos de placement, que podem contribuir para o financiamento do projeto”10 (LEHU, 2007, p. 39, tradução do autor). No entanto, a inserção de uma marca no contexto do filme deve ser feita de maneira correta. Como já visto no começo deste capítulo com Batey (2010), cada marca possui características e personalidades únicas. Assim, torna-se indispensável encaixar esses fatores na temática do filme que servirá de veículo: “um placement pode dizer muito sobre o target visado por parte dos anunciantes, ou por parte do diretor, a coerência que ele ou ela quer invocar”11 (LEHU, 2007, p. 45, tradução do autor). O cinema possui a vantagem de ser um meio multigênero, permitindo um escopo enorme de públicos-alvo, o que condiz com a atualidade pulverizada descrita por Lehu (2007) e Palacios e Terenzzo (2016). Marcas devem entender bem o filme que irão fazer parte, uma vez que cada obra atrai um público distinto, e uma decisão equivocada pode gerar grandes prejuízos. Desse modo, empresas já estão se envolvendo nos estágios iniciais de concepção do filme, como Donaton comenta: Os departamentos de marketing estão se envolvendo com antecedência cada vez maior no desenvolvimento do roteiro dos filmes a fim de controlar a maneira como 10 “A film’s budget has never been a guarantee of success, but paradoxically, its breadth reassures potential investors. Hence the fundamental (sometimes indispensable) role of placements contracts, which can thus contribute to the financing of the project.” 11 “A placement can say a great deal about the intended target on the part of the advertisers, or on the director’s part, the coherence of what he or she wishes to invoke.”
  • 37. 36 seus produtos são apresentados e de criar oportunidades de exposição vantajosas para eles (DONATON, 2007, p. 97). E dessa maneira, o branded entertainment entra em cena como o modelo que pode garantir o sucesso da comunicação marca-consumidor. Estabelecendo-se dentro do contexto da narrativa de acordo com os desejos da marca, as inserções são feitas de maneira precisa e orgânicas. Como veículo midiático, o cinema possui caráter altamente simbólico, suprindo necessidades emocionais e sociais como analisamos anteriormente. Sabe-se que o consumidor deseja esse tipo de interação, e que o branded entertainment é capaz de cria-las, se usado em conjunto com a narrativa e o storytelling. É natural identificar o cinema como um meio ideal para esse tipo de estratégia porque através dele, as marcas podem ser incorporadas ao roteiro, tornando-se parte indivisível da história. O storytelling é intrínseco ao cinema. Através dele, um relato ganha profundidade, transmite sua mensagem com maior impacto, além de cativar o público. Os autores Palacios e Terenzzo (2016) afirmam que não se trata de uma ferramenta, de “contar uma historinha” ou ainda a antiga contação de fábulas para crianças. No cenário atual, o storytelling foi incorporado aos sistemas mais sofisticados de comunicação para gerar mais atenção do espectador. Em uma definição usada pelos autores afirma “storytelling significa ter a habilidade de encontrar ou criar histórias fortes, com propósito estratégico, narradas com excelência” (TERENZZO; PALACIOS, 2016, p. 62). Em seus estudos, os autores regridem às origens das histórias, e concordam que estas surgem quando um evento se sobressai da normalidade, instigando as pessoas a contarem e repassarem o relato. Isso se aplica ao mundo cinematográfico: não interessa algo que não saia do lugar comum, que já tenha sido visto. Uma história tem o poder de conectar interlocutores. Por meio delas, pode-se introduzir novos conceitos e emoções. Palacios e Terenzzo (2016) comprovam esse aspecto quando analisam histórias antigas, lendas primordiais da civilização, como a Odisseia e os feitos de Gilgamesh. Nelas, são tratados temas humanos, relacionáveis a qualquer pessoa de qualquer época. Citando como exemplo um trecho de uma lenda suméria, onde um filho prepara uma festa para seu pai, e durante a narrativa, realiza todas as etapas da fabricação de cerveja, os autores ressaltam o poder do storytelling: transmitir uma informação útil, de maneira interessante e através de uma história. A efetividade da informação se dá justamente pela sua simbiose com a narrativa. Não existem interrupções para explicações, e sim um fluxo natural. Sobre isso, os autores comentam: Toda narrativa é transformada por linhas que se cruzam: as vidas dos personagens
  • 38. 37 correm em paralelo e depois se cruzam e voltam a se separar. No meio desse enredo é preciso costurar os ensinamentos vitais. Por mais tentador que seja, não adianta interromper o andamento da história para aproveitar a atenção da audiência e assim tentar forçar a mensagem (TERENZZO; PALACIOS, 2016, p. 61). Dessa forma, uma marca deve entender que sua inserção na narrativa deve ocorrer da forma mais orgânica possível. A organização, o fluxo da história é essencial para seu sucesso. Através de exemplos, cenários, situações e personagens, alcança-se um melhor resultado do que simplesmente explicar de maneira invasiva. O storytelling no cinema se apresenta como uma porta de entrada de grande oportunidade para o marketing, através do branded entertainment. Encontrado o angulo correto, todo produto possui potencial para grandes histórias. Os exemplos são diversos. Donaton (2007) menciona a brilhante inserção da marca BMW no filme The Italian Job (2003). Os protagonistas do filme precisariam executar um roubo envolvendo carros pequenos e com alta capacidade de manobras. O Mini, produto da empresa, foi utilizado pela produção e se destacou por participar do desenrolar da narrativa de maneira não invasiva. A marca se aproveitou dessa comunicação eficiente e promoveu eventos paralelos, como encontros de entusiastas do Mini. Outro exemplo mencionado por Lehu (2007) é da colaboração contínua que o exército dos Estados Unidos tem com Hollywood. Através do empréstimo de materiais (armas, helicópteros, aviões), locações (bases militares) e logística para cenas e personagens, o órgão ganha um espaço de destaque para se promover e comunicar com o público. Escolhendo filmes favoráveis à sua imagem, os resultados dessa comunicação podem ser bastante positivos. Como Lehu explica, “em 1986, a marinha dos Estados Unidos ajudou a financiar o filme Top Gun, de Tony Scott, que a permitiu lucrar com um aumento apreciável em recrutamentos”12 (LEHU, 2007, p. 52, tradução do autor). Existem marcas que já se integraram no modelo do branded entertainment no cinema, percebendo seu potencial nas vendas de produtos. Um destes casos é a marca de vinhos Clos du Val, que se estabeleceu em Hollywood por meio de parcerias em troca de tempo em cena. De acordo com Lehu (2007) a empresa envia cerca de 240 garrafas anualmente para grandes estúdios e departamentos de objetos, fazendo com que a marca permaneça relevante no meio. Dessa forma, o vinho se faz presente no mundo do audiovisual, estando em produções como The Terminal (2004), The Sopranos (HBO), Two and a Half Men (Warner), entre outros. Como 12 “In 1986, the US Navy helped to finance the Tony Scott film Top Gun, which allowed them to profit from an appreciable rise in recruitment.”
  • 39. 38 prova de seu sucesso, a Clos du Val faturou em 2004 aproximadamente 36 mil dólares por cada garrafa dada gratuitamente. Apesar de exemplos de sucesso serem abundantes, diversas empresas se mantém receosas em usar o branded entertainment como modelo de marketing. Mesmo com os benefícios oferecidos, a principal questão está na dificuldade em se mensurar os resultados das inserções, como aponta Lehu (2007) quando compara estas com os tradicionais comerciais de 30 segundos. Donaton (2007) afirma que devem ser estabelecidos métodos de medição para o retorno desse tipo de anúncio. Uma falta de padrão impede o desenvolvimento do meio e a aplicação de preços fixos. Muitas empresas, segundo o autor, poderiam entrar no jogo do entretenimento, mas sua verba limitada requer números convidativos para uma aposta tão alta. O branded entertainment, como visto, se apresenta como uma possível solução para problemas latentes da sociedade contemporânea. Entretanto, não se trata de uma simples variação do product placement, algo que pode ser aplicado de maneira inconsequente. Segundo Lehu (2007), trata-se de um processo delicado, necessitando entender a marca como um todo para aplica-la de forma orgânica em plataformas de entretenimento. Uma empresa que pula essa etapa e se lança sem uma reflexão prévia sobre sua própria natureza, está perdendo dinheiro. O cenário atual gerou consumidores questionadores, que repensam sua relação com marcas, de modo maduro e sofisticado. Através de laços emocionais entre marca e consumidor, pode-se criar uma relação duradoura. Como Lehu afirma: “é simplesmente o caso de respeitar a audiência desejada e consequentemente potenciais consumidores”13 (LEHU, 2007, p. 246, tradução do autor). 3.5 A MARCA NASA E O BRANDED ENTERTAINMENT Como vimos ao longo deste capítulo, vivemos em um período onde marcas estão cada vez mais entranhadas no cotidiano do consumidor. Neste cenário, descrito por Lehu como “um mundo consumidor de marcas”14 (LEHU, 2007, p. 47, tradução do autor), abre-se espaço para que marcas, inicialmente voltadas para outros propósitos, se tornem símbolos, satisfaçam necessidades e influenciem na criação da identidade de consumidores. A NASA, como veremos a seguir, se encaixa nessas características. 13 “It is simply a case of respecting the target audience and consequently potential consumers.” 14 “a brand-consumerist world.”
  • 40. 39 Fundada em um dos períodos mais conturbados da Guerra Fria, com o propósito de fazer frente à União Soviética na recém-inaugurada corrida espacial, a NASA é um órgão do governo americano com foco no desenvolvimento científico, aeroespacial e exploração humana do cosmos, visando também a evolução na qualidade de vida da humanidade como produto de suas conquistas. Sua visão, segundo seu site oficial15 , é: “nós buscamos novas alturas e revelamos o desconhecido para o benefício da humanidade”16 (tradução do autor). Dada a sua natureza, seu modelo de negócios diverge do comum. Apesar da venda de produtos relacionados às missões históricas, não há uma relação de compra e venda tradicional com seus consumidores. Suas ações e esforços são voltados primariamente para a exploração espacial. E mais: dada a sua natureza governamental, a NASA é utilizada como um símbolo de poder dos Estados Unidos. Sendo assim, o órgão pode ser considerado uma marca? O estudo denominado “Percepção Americana da Exploração Espacial”17 (tradução do autor) feito em 2004 pelo instituto de pesquisa “Center for Cultural Studies and Analysis”, em parceria com o governo dos Estados Unidos, analisou a NASA sob o aspecto de marca. O estudo aponta o órgão como uma das marcas mais fortes e reconhecidas mundialmente, ao lado de grandes empresas como Coca-Cola e Disney. Seus principais stakeholders são o povo americano e o Congresso Nacional, já que, se tratando de um órgão governamental, são através deles que a marca capta recursos para o financiamento de suas missões. Logo, deve estabelecer conexões duradouras e satisfazer as necessidades de seu público requer, um comportamento característico de uma marca. Retomando o que foi visto no início do capítulo com Batey (2010), assim como qualquer outra marca, a NASA é um objeto simbólico, que legitima as identidades de seus consumidores e supre suas necessidades. Como o autor menciona, é esperado que uma marca satisfaça diferentes tipos de necessidades, que se entrelaçam e se sobrepõem. Com públicos bastante distintos, a NASA satisfaz tanto aspectos simbólicos, como o sentimento de descoberta, inovação e principalmente patriotismo, quanto funcionais, como demandas por aprimoramentos tecnológicos e científicos. Ambos são requisitados, em maior ou menor grau, por seus stakeholders, e para satisfazê-los, a marca deve contar com um planejamento de comunicação diversificado e coeso, como veremos a seguir. 15 NASA. What does NASA do? 2015c. Disponível em: <https://www.nasa.gov/about/highlights/what_does_nasa_do.html>. Acesso em: 2 ago. 2016. 16 “We reach for new heights and reveal the unknown for the benefit of humankind.” 17 “American Perception of Space Exploration.”
  • 41. 40 No livro “NASA First 50 Years” (2008) a autora Billings comenta sobre a relação da agência espacial com seu público. Desde sua criação, a NASA mantém uma política de transparência. Uma lógica proveniente da Guerra Fria, a disponibilização de informações a todos os interessados era a maneira do órgão, e por consequência, o governo dos Estados Unidos, se afirmarem contra o programa espacial da União Soviética, que era mantido em sigilo. Usariam a verdade para combater a mentira soviética, como a autora coloca. O fato de o programa espacial ser comandado por civis, e não militares, ajudou na construção de identidade da marca, em prol do avanço científico e humano, empenhada na divulgação clara e verdadeira de informações sobre suas descobertas. No entanto, ao se atrelar à Guerra Fria, a NASA comprometeu sua própria existência. Billings (2008) comenta sobre a motivação do governo dos Estados Unidos para financiar a agência, que se baseava no prestígio nacional e poder provenientes da corrida espacial. Uma vez terminado esse período, com a vitória americana sobre os soviéticos, o órgão perdeu força, e muitos passaram a questionar sua utilidade. O governo americano cortou financiamentos progressivamente18 , de modo que a agência chegou ao século XXI com apenas uma fração do que recebia nas décadas de 1960 e 1970. Paralelo a isso, tanto Billings (2008) como o estudo “Percepção Americana da Exploração Espacial”19 (tradução do autor) apontam falhas na comunicação da agência. Ambas as fontes demonstram que o público tem interesse pelo órgão e suas atividades, porém não consegue conectar as informações que recebe à marca, por não possuírem conhecimentos específicos sobre os assuntos tratados. Apesar de possuir imagem e valores percebidos pelo público como fortes, a NASA possui um conhecimento de marca precário, descrito por Billings como “uma milha de largura e uma polegada de profundidade”20 (BILLINGS, 2008, p. 161, tradução do autor). O povo americano possui uma percepção de marca positiva, porém não a considera uma prioridade nos gastos governamentais. Junto a isso há a segmentação do público. Billings (2008) menciona um estudo demográfico feito para a marca que revela o pouco envolvimento das gerações mais jovens. Seu principal segmento são homens, de 45 a 65 anos, muitos deles testemunhas da corrida espacial. Por outro lado, a NASA é vista como algo pouco interessante e confuso para jovens e adultos de 15 a 35 anos. Este grupo possui uma relação fraca com a marca, com pouca participação e interatividade com seu conteúdo. 18 NASA. Budget documents, strategic plans and performance reports. NASA, 2016. Disponível em: <http://www.nasa.gov/news/budget/index.html>. Acesso em: 15 out. 2016. 19 “American Perception of Space Exploration.” 20 “a mile wide and an inch deep.”
  • 42. 41 Como visto, as falhas apontadas traduzem-se como ameaças para a NASA. Com um impacto fraco de seu conteúdo, a marca falhou em angariar novos segmentos, e assim renovar e expandir o público consumidor. A falta de conhecimento e de percepção das gerações mais novas é particularmente problemática posto que este grupo começa a ocupar cargos de importância no governo dos Estados Unidos. Sabendo da dependência da NASA com o congresso americano e a Casa Branca para o financiamento de suas missões, se tornou vital que a marca se renovasse para garantir seu futuro. Sua estratégia de comunicação foi redesenhada, visando a adequação aos novos meios e a melhor utilização da já reduzida verba anual. A doutora Alotta Taylor (2015), diretora da Divisão de Integração Estratégica e Management da NASA, enfatiza a necessidade de mudar a percepção do público sobre a marca, ainda em grande parte voltada para a corrida espacial e os programas Apollo e Shuttle. A marca, para se manter atual e relevante, deve propagar suas novas conquistas ao consumidor, reafirmando sua posição no espaço. Assim sendo, Taylor comenta sobre a reformulação da comunicação e seus três objetivos: aumentar o awareness do público e do Congresso Americano sobre o valor da exploração espacial, como forma de garantir sua renda para futuras missões; expor as maravilhas alcançadas via exploração espacial, e como a NASA contribui para o desenvolvimento humano no espaço; aumentar o envolvimento do público com suas missões, de forma a engaja-los nas conquistas da marca. A empresa está angariando fãs e os transformando em embaixadores, colaboradores, criadores e defensores da marca. Taylor (2015) enfatiza o poder das redes sociais para se comunicar em larga escala e em especial com as novas gerações. Com mais de 490 contas em mídias sociais e perfis com milhões de inscritos, a empresa se dedica na expansão de seu conteúdo, criando canais que veiculem novidades relacionadas à exploração espacial, mas ao mesmo tempo construindo um nicho para entusiastas e novos entrantes. Essa estratégia digital condiz com o que Lehu (2007) afirma: no mundo pulverizado em que vivemos hoje, a marca deve ir ao consumidor, se inserindo em seu cotidiano de forma não intrusiva. Da mesma forma, a NASA entendeu que precisava cativar seu público. Ao invés de simplesmente expor informações, as transformaria em entretenimento. E de certa forma, já o vinha fazendo, desde seus primórdios. Ao colocar uma câmera a bordo da Apollo 11 e transmitir os primeiros passos para o mundo todo, a NASA demonstrou que sabia criar um espetáculo cativante21 . Seguindo esse modelo, a agência passou a utilizar os princípios do storytelling, 21 HAYES, Adam. NASA: the first content marketers? Wyzowl [blog], 2015. Disponível em: <http://blog.wyzowl.com/nasa-the-first-content-marketers>. Acesso em: 10 ago. 2016.