Todos os dias, em diferentes locais nos quais se pratica
esportes no mundo todo, atletas preparam-se para competir
com um ritual familiar de alongar os principais
grupos musculares requisitados para aquele esporte.
Essas rotinas de pré-exercícios costumam incorporar
uma variedade de técnicas de alongamento e exercícios
de aquecimento. Textos de medicina esportiva, artigos
de periódicos para profissionais de saúde e treinadores,
e publicações leigas promovem o alongamento como
fundamental para diminuir o risco às lesões.
1. 1
Atletas Devem Alongar
Antes do Exercício?
Jul/Ago/Setembro - 2008
PONTOS PRINCIPAIS
As tradicionais rotinas de alongamento realizadas durante o aqueci-
mento, antes do exercício podem aumentar a flexibilidade por um curto
período de tempo, mas há poucas evidências científicas de que essas
rotinas consigam melhorar o desempenho, diminuir a dor muscular de
início tardio ou evitar lesões.
Oalongamentoregular,porexemplo,3-5dias/semana, isoladodoambien-
tedeexercício podeserefetivoparaaumentaraflexibilidadeedesempenho
de alguns tipos de exercícios, e isso pode diminuir o risco de lesões, mas
é preciso realizar mais estudos para se validar este conceito.
O alongamento passivo por 15-30s é mais eficiente para aumentar
a flexibilidade que o alongamento por períodos mais curtos e é tão
eficiente quanto o alongamento por períodos mais longos.
Aumentaraflexibilidadeéimportanteparaatividadescomobalé,ginásticae
natação,masissopodediminuiraeconomiadecorridaepodeserinadequado
para o os jogadores de futebol americano e para algumas outras atividades
esportivas nas quais a estabilidade das articulações é fundamental.
O alongamento um pouco antes do exercício pode causar déficit de
força temporário.
O risco de lesão aos músculos, tendões e ligamentos parece ser menor
em atletas que apresentam melhor preparo aeróbico.
Há algumas evidências de que os tradicionais procedimentos de aqueci-
mento que não incluem o alongamento podem melhorar o desempenho
de alguns tipos de exercícios e diminuir o risco de lesões esportivas.
INTRODUÇÃO
Todos os dias, em diferentes locais nos quais se pratica
esportes no mundo todo, atletas preparam-se para com-
petir com um ritual familiar de alongar os principais
grupos musculares requisitados para aquele esporte.
Essas rotinas de pré-exercícios costumam incorporar
uma variedade de técnicas de alongamento e exercícios
de aquecimento. Textos de medicina esportiva, artigos
de periódicos para profissionais de saúde e treinadores,
e publicações leigas promovem o alongamento como
fundamental para diminuir o risco às lesões.
Com tamanha aceitação do alongamento antes do
exercício, poderia presumir-se que fortes evidências
científicas corroboram sua eficácia para a prevenção da
lesão ou melhora do desempenho. Entretanto, muitas
publicações científicas questionam a utilização conven-
cional do alongamento pré-exercício. Este artigo resume
resultados de recentes pesquisas sobre alongamento,
flexibilidade e aquecimento.
REVISÃO DE ESTUDOS
Técnica de Alongamento
Uma grande variedade de tipos de alongamento tem
sido propostos. O alongamento ativo ou dinâmico
propõe que os atletas individualmente façam a con-
tração de músculos para alongar outros. Sub-tipos
de alongamento ativo incluem estático, isométrico
e balístico. O alongamento passivo e a facilitação
Karl B. Fields, MD
Director of Family Medicine Residency e Sports Medicine Fellowship
Moses Cone Health System, Greensboro, NC
Professor e Associate Chairman
University of North Carolina Department of Family Medicine
Craig M. Burnworth, M.D.
Sports Medicine Fellow, Moses Cone Health System, Greensboro, NC
Associate Team Physician, Elon University, Elon, NC
Martha Delaney, M.A.
Administrative Director, Greensboro Area Health Education Center
Research Coordinator, Moses Cone Family Medicine Residency Greensboro, NC
2. 2
neuromuscular proprioceptiva (FNP) geralmente envolvem um
parceiro que ajude na atividade. Independentemente do tipo de
alongamento usado, parece que ele é mais eficaz para aumentar
a amplitude de movimento quando realizado após o aquecimento
muscular realizado por exercícios preliminares ou aquecimento
passivo, como por exemplo, com bolsas quentes ou ultrasom
(Knight e col., 2001).
Alongamento estático. O alongamento estático é feito de ma-
neira lenta e sustentada, ou seja, os atletas devem mantê-lo por
15-60s. Um exemplo é o alongamento dos músculos isquiotibiais
e das costas fazendo um lento movimento para frente, para tocar
e segurar os tornozelos e os pés na posição sentado fazendo uma
flexão para frente. O alongamento estático é usado pela maioria dos
atletas e é incluído em muitos treinos antes das competições.
Alongamento isométrico. Atletas que fazem o alongamento
isométrico (uma forma de alongamento estático) tentam contrair
o músculo enquanto fazem esforço contra uma resistência fixa.
No exemplo do alongamento estático apresentado no parágrafo
anterior, se o atleta fosse contrair os músculos isquiobitiais en-
quanto mantivesse o alongamento, algumas das fibras isquiotibiais
em contração estariam mais alongadas enquanto outras tentariam
ficar mais curtas. A idéia é que a contração isométrica por alguns
segundos permitiria aumentar o alongamento estático e assim
alongar ainda mais o músculo.
Alongamento balístico. O alongamento balístico envolve o alon-
gamentorápidodemúsculos,geralmentecommovimentosrepetitivos
ou de balanço para tocar os dedos do pé enquanto está em pé com as
pernasemlinhareta.Poucosatletasusamoalongamentobalístico,mas
a técnica parece favorecer alguns esportes. Relatos de lesão de tecido
mole durante o alongamento balístico fez com que muitos instrutores
e terapeutas de condicionamento físico condenassem seu uso.
Alongamento passivo. Durante o alongamento passivo, uma das
técnicas de alongamento assistido, o atleta não contrai ativamente
os músculos para alongar os antagonistas. Em vez disso, a gravida-
de, uma máquina ou mais tipicamente, um parceiro aplica pressão
continua para causar um movimento que aos poucos aumenta a
amplitude de movimento. O alongamento assistido dos músculos
isquiotibiais, enquanto um atleta está sentado com as pernas esti-
cadas e um parceiro lentamente empurra as costas do atleta, é uma
prática comum e um bom exemplo dessa técnica.
Facilitação neuromuscular proprioceptiva. Afacilitação neu-
romuscular proprioceptiva (FNP), outra técnica de alongamento
assistido, utiliza um parceiro que resiste à contração dos grupos de
músculos alongados por um breve intervalo, depois os músculos
são relaxados enquanto o parceiro passivamente alonga o grupo
de músculos além do normal da amplitude de movimento. Usan-
do novamente o mesmo exemplo do alongamento dos músculos
isquiotibiais, com o atleta deitado de costas, um assistente levanta
as pernas estendidas do atleta para cima e em direção ao tronco
para alongar os isquiotibiais por aproximadamente 20 – 30s. Em
seguida, o atleta tenta contrair os isquiotibiais alongados (ou seja,
tenta abaixar as pernas) por 5-6s enquanto o assistente (ou talvez
uma parede) faz resistência à contração, para inibir o movimento.
Os grupos de músculos contraídos são depois relaxados e lenta-
mente o assistente alonga os isquiotibiais, provavelmente além do
alongamento original. Esse processo é repetido por 2-4 vezes.
REVISÃO DE ESTUDOS
Alongamento e Melhora da Flexibilidade
O objetivo de todas as técnicas de alongamento é aumentar a
amplitude de movimento de uma articulação (ou articulações)
aumentando a flexibilidade dos grupos musculares próxi-
mos da articulação (articulações). (Flexibilidade é o quanto
um músculo consegue ser alongado com uma determinada
força. Na prática, uma mudança na flexibilidade é medida
por mudanças na amplitude de movimento, portanto, os dois
termos, flexibilidade e amplitude de movimento, costumam
ser considerados sinônimos). Por exemplo, aumentando a
flexibilidade dos músculos das costas e dos isquiotibiais na
parte posterior das pernas se consegue aumentar a amplitude
de movimento das articulações da coluna para permitir maior
flexão do tronco, ou seja, a capacidade de curvar o tronco
para frente. Todos os tipos de alongamentos conseguem me-
lhorar a amplitude de movimento ao redor de cada uma das
principais articulações pelo menos temporariamente, mas não
há nenhuma clara evidência que uma dessas técnicas ofereça
mais flexibilidade.
Bandy e col. (1998) mostraram que o alongamento passivo dos
isquiotibiais aumentou a flexibilidade do tronco e promoveu um
alongamento ativo, mas isso não ocorreu na articulação do quadril.
Na revisão feita por Thacker e col. (2004), alguns estudos apon-
taram maior flexibilidade com a FNP comparado a outros tipos
de alongamento, mas os resultados não foram consistentes e as
técnicas não eram padronizadas.
Roberts e Wilson (1999) apontam que a duração é importante:
alongamentos de 15–30s promoveram alongamento muscular
tanto quanto alongamentos mais prolongados e foram mais efi-
cazes que os esquemas com duração menor que 15s. Entretanto,
também há estudos que utilizaram protocolos de alongamento
balístico, com resultados favoráveis, que incorporam movimen-
tos curtos, mas repetitivos e rápidos. Por exemplo, Laroche e
Connolly (2006) compararam períodos de 30s de alongamentos
estáticos dos isquiotibiais com alongamentos balísticos dos mes-
mos músculos, repetidos a cada segundo por um total de 30s. Os
dois protocolos promoveram melhoria semelhante na amplitude
de movimento (+9,5% vs. +9,3%)
A melhora da flexibilidade após uma única sessão de alonga-
mento parece persistir por até 90 min, enquanto os esquemas de
alongamento realizados regularmente, por exemplo, 3–5 dias por
semana, pode melhorar a flexibilidade por algumas semanas após
sua conclusão (Zebas & Rivera, 1985).
Efeitos do Alongamento na Força,
Salto e Economia de Corrida
O alongamento aumenta a flexibilidade, mas isso melhora a força?
Provavelmente não. Dois estudos relataram que a força era reduzida
por até 1 h após uma sessão do alongamento (Fowles e col., 2000;
Kokkonen e col., 1998). O resultado de um estudo do torque máxi-
mo durante a extensão concêntrica e isocinética da perna mostrou
que após um exercício ativo e três passivos de alongamento, a
força diminuiu tanto em velocidades altas e baixas (Cramer e col.,
2004). Esses resultados são consistentes com os observados por
Cornwell e col. (2001), que apontaram redução da capacidade de
salto vertical após o alongamento passivo dos músculos. “
3. 3
Young e Behm (2003) compararam cinco protocolos de “aque-
cimento” usados antes dos testes de salto. Os protocolos eram
1) controle; 2) corrida submáxima de 4 minutos; 3) alongamento
estático; 4) corrida e alongamento; e 5) corrida e alongamento,
além de saltos. O desempenho dos 16 participantes foi pior após o
alongamento estático. O grupo de corrida e alongamento não teve
nenhum resultado melhor que o grupo controle, mas tanto o grupo
só de corrida quanto o de corrida, alogamento e salto apresentaram
valores mais altos na produção de força explosiva. O grupo apenas
de corrida foi claramente superior ao de corrida e alongamento em
quatro das seis variáveis avaliadas (altura no drop jump, altura no
salto concêntrico, força concêntrica máxima e taxa do desenvolvi-
mento de força). Quando os cinco estudos foram analisados juntos,
tanto a corrida quanto os saltos tiveram um efeito positivo na força
explosiva e desempenho no salto, mas o alongamento estático teve
impacto negativo no desempenho.
Parece que o aumento da flexibilidade é indesejável em alguns
esportes. Gleim e col. (1990) relataram uma correlação negativa
entre a flexibilidade e economia no caminhar e no jogging em um
grupo de 38 mulheres e 62 homens com idade entre 20-62 anos,
que foram divididos em três grupos referentes à flexibilidade —
mais flexível, flexibilidade normal e menos flexível — em 11
medidas de amplitude de movimento. Para o grupo menos flexível,
a economia na caminhada e no jogging foi melhor que no grupo
nomal e significativamente melhor que no grupo dos mais flexíveis.
Em estudo semelhante, Craib e col. (1996) avaliaram corredores
do sexo masculino pertencentes ao grupo de sub-elite e aqueles
menos flexíveis também costumavam apresentar melhor economia
de corrida. Da mesma maneira, quando Jones (2002) estudou um
grupo de corredores de elite internacional em um teste de sentar
e alcançar (TSA), ele relacionou a flexibilidade à economia de
corrida, sendo que a menor flexibilidade foi associada com melhor
economia. Enquanto esses estudos se concentraram no correr e
caminhar, para alguns movimentos de luta, futebol americano,
boxe e outros esportes nos quais a estabilidade da articulação é
importante, também é razoável presumir que seria contra-indicado
o aumento da flexibilidade nas articulações críticas. Se o alonga-
mento realmente diminui a força máxima disponível para o salto e
diminui a economia de corrida, não seria lógico realizar protocolos
de alongamento antes de esportes de salto ou de corrida.
Entretanto, os estudos que apontavam a associação negativa entre o
alongamento e força e entre flexibilidade e economia do movimento
apresentaram algumas limitações. Além disso, outros estudos não
conseguiram mostrar a associação do alongamento com a queda na
força de maneira consistente (Laroche & Connolly) ou da relação
da falta de flexibilidade com melhor economia de corrida (Nelson e
col., 2001). Portanto, é prematuro recomendar que atletas de salto
e corrida nunca façam alongamento antes do exercício.
Shrier (2004a) sugeriu precaução antes de apresentar amplas
conclusões sobre os efeitos do alongamento no desempenho. Em
sua revisão da literatura, ele observou diferenças nos efeitos de
dois diferentes tipos de alongamento — alongamento agudo, um
pouco antes de um ciclo de exercícios e o alongamento regular,
realizado por uma série de dias ou semanas fora do contexto de
exercícios. Ele não detectou nenhum benefício do alongamento
agudo na produção de força isométrica, torque isocinético ou altura
do salto e estudos mostram resultados mistos sobre os efeitos do
alongamento agudo na velocidade da corrida. Entretanto, parece
que o alongamento regular melhora a força, altura do salto e ve-
locidade da corrida de maneira confiável. Essa noção de que os
efeitos do alongamento imediatamente após o exercício são um
pouco diferentes dos efeitos daquele realizado regularmente fora
do contexto da prática de exercícios, é surpreendente. Intuitiva-
mente, isso sugere ou que outros tipos, durações ou intensidades
do alongamento realizados em dois ambientes ou que os efeitos
benéficos do alongamento são anulados pelo exercício subsequente.
Mais estudos são necessários para confirmar quaisquer diferenças
nos efeitos do alongamento antes do exercício e do alongamento
em contexto não relacionado aos exercícios.
Alongamento e Dor Muscular de Inicio Tardio
A opinião compartilhada por atletas, técnicos e profissionais de
saúde é que o alongamento antes e/ou após o exercício irá preve-
nir ou minizar as dores musculares que costumam surgir 24–48
h após o exercício. Em 2002, Herbert e Gabriel publicaram uma
meta-análise de estudos que mediram o efeito do alongamento,
imediatamente antes ou depois do exercício e as dores musculares.
Identificaram cinco estudos de qualidade suficiente para serem
avaliados. Esses estudos analisaram o retardo da instalação da dor
muscular 24, 48 e 72 h após o exercício. De modo geral, o alonga-
mento não teve nenhum efeito significativo na dor muscular.
Confirmando esses resultados preliminares, LaRoche e Connolly
(2006) estudaram indivíduos que fizeram o alongamento passivo
ou balístico dos músculos isquiotibiais por quatro semanas e não
detectaram nenhum efeito na instalação tardia da dor muscular
após exercícios excêntricos. De maneira semelhante, Dawson e col.
(2005) estudaram jogadores australianos de futebol americano e não
observaram nenhum efeito do alongamento imediatamente após um
jogo na dor muscular, flexibilidade, potência de sprint no ciclismo
ou na capacidade de saltar verticalmente avaliada 48 h depois.
Em vez de estudarem o alongamento antes de exercícios que in-
duzem a dor muscular, Reisman e col. (2005) testaram os efeitos
do alongamento passivo em músculos flexores do cotovelo que já
estavam doloridos na dor subsequente. Observaram que a sensação
de dor após cinco extensões passivas dos flexores do cotovelo di-
minuiram. Os autores levantam a hipótese de que o alongamento
permitiria que atletas com dor muscular treinassem além do que
conseguiriam sem o alongamento.
Alongamento e Prevenção de Lesões
O amplo uso do alongamento e as diversas recomendações para
usá-lo para evitar lesões sugere que deve haver muitos estudos
de alta qualidade sobre o alongamento e prevenção de lesões na
literatura. Por outro lado, podemos considerar algumas das prin-
cipais dificuldades para realizar um estudo definitivo sobre este
assunto: 1) distribuir aleatoriamente um grande número de atletas
com características físicas semelhantes em vários esportes para
que sigam protocolos de alongamento ou de não-alongamento,
2) a duração do experimento para incluir um número suficiente
de meses para acumular um número adequado de relatos de le-
são, 3) supervisão rigorosa e controle de protocolos diários de
alongamento e programas de exercícios, e 4) controle rigoroso e
relato confiável das lesões. Portanto, não deve ser surpreendente
que Herbert e Gabriel (2002) encontraram apenas dois estudos
que se qualificavam a um critério padrão sobre a qualidade
4. 4
metodológica. Esses dois estudos, ambos de Pope e col. (1998,
2000), foram feitos com recrutas do sexo masculino das forças ar-
madas. Os 1284 indivíduos que participaram dos grupos de alonga-
mento tiveram 181 lesões contra 200 lesões entre os 1346 soldados
nos grupos controle, sem diferença estatisticamente significativa.
É interessante que Pope e col. (2000) observaram que apesar de
parecer que o alongamento não teve nenhum efeito aparente no
risco de lesão, provou-se que o nível de preparo aeróbico era um
fator poderoso e consistente do risco da lesão, tanto que o menos
preparado aerobicamente apresentava um risco 14 vezes maior de
ter uma lesão que aqueles com melhor preparo.
Thacker e col. (2004) fizeram uma ampla pesquisa na literatura
sobre o alongamento para prevenção de lesões, incluindo artigos
publicados até 2002. Usando uma ferramenta diferente de avaliação
de qualidade que o empregado por Herbert e Gabriel, eles avaliaram
361 artigos e encontraram apenas seis com qualidade suficiente
para serem analisados. Os participantes de quatro desses estudos
eram recrutas militares em treinamento básico, enquanto que os
outros dois eram de jogadores de futebol americano. Dos seis
estudos, três estudos randomizados não conseguiram demonstrar
a redução de lesões como efeito do programa supervisionado de
alongamento. Os outros três estudos coorte sugeriram fraca evi-
dência do benefício do alongamento, mas a metodologia desses
estudos foi considerada pior. Thacker e col. (2004) concluíram que
não havia evidências convincentes para continuar ou interromper
o alongamento de rotina antes dos exercícios.
As conclusões de Thacker foram baseadas nas revisões feitas por
Gleim & McHugh, 1997; Hart, 2005; Park & Chou, 2006; Shrier,
1999, 2000, 2004a;Yeung &Yeung, 2001, e Witvrouw e col., 2004.
Mas em uma carta ao editor, Shrier (2004b) alertava que os efeitos
de uma sessão aguda de alongamento antes do exercício podem
ter o efeito oposto do alongamento realizado regularmente fora do
contexto da prática de exercícios. Ele citou alguns estudos com
alongamento regular que sugerem um efeito positivo na prevenção
da lesão. Também, tanto Gleim & McHugh quanto Witvrouw e
col. sugeriram que as diferentes atividades esportivas podem se
beneficiar dos diferentes níveis de flexibilidade da articulação e
que essas diferentes demandas podem explicar a falta de consenso
na literatura, na qual a maior parte dos artigos não mostra esses
diferentes tipos de atividades.
Aquecimento como Fator de Confusão
em Estudos sobre o Alongamento
As diferentes atividades de aquecimento não costumam ser fatores
controlados nos estudos sobre o alongamento. Portanto, é possível
que em alguns estudos, o efeito positivo do alongamento tenha sido
na verdade o exercício aeróbico, drills ou exercícios específicos
daquele esporte durante o aquecimento e não o alongamento, o
responsável pelo benefício. Fradkin e col. (2006) revisaram os
estudos randomizados controlados para avaliar as atuais evidências
sobre o aquecimento na prevenção das lesões. Analisando cinco
estudos de alta qualidade, encontraram seu benefício em três
estudos com atletas adolescentes que fazem parte de equipes de
futebol americano e de handebol, mas sem nenhum benefício em
dois estudos sobre lesões nas extremidades inferiores em corredores
recreacionais ou recrutas militares.
De modo geral, observaram que o peso das evidências era
favorável ao aquecimento para diminuir o risco da lesão, sem
quaisquer efeitos prejudiciais. Os potenciais fatores de confusão
deste estudo incluem a variabilidade dos esquemas específicos
usados, os diferentes esportes incluídos e a heterogenicidade dos
participantes. Faigenbaum e col. (2005) estudaram o aquecimento
dinâmico versus alongamento estático em diferentes faixas etárias
e variedade de atletas. Quando comparado ao alongamento estáti-
co, tanto o aquecimento dinâmico quanto o aquecimento dinâmico
mais drop jumps melhoraram o desempenho de crianças para salto
vertical jump e shuttle runs. O desempenho de salto à distância
também melhorou no grupo que fez o aquecimento dinâmico
que incluiu os drop jumps. De maneira semelhante, protocolos
dinâmicos com ou sem alongamento promoveram um melhor
desempenho da atividade anaeróbica em um grupo de atletas da
escola secundária que realizam exercícios de força, principalmen-
te do sexo masculino que seguiram protocolos de alongamento
estático (Faigenbaum e col., 2006a). Os autores concluíram que
o exercício dinâmico pré-evento ou exercícios dinâmicos mais
alongamento estático, e não só o alongamento estático, deveria
ser incorporado em esquemas de aquecimento.
O grupo de Faigenbaum (2006b) também realizou um estudo com
atletas da escola secundária do sexo feminino para testar os efeitos
agudos de quatro protocolos de aquecimento no desempenho.Após
5 min de jogging, os participantes fizeram parte de um dos cinco
grupos: A) cinco alongamentos estáticos, cada um realizado por
duas vezes e por 30s, B) nove exercícios dinâmicos de intensi-
dade moderada a alta, C) os mesmos nove exercícios dinâmicos
realizados com roupa que pesava 2% da massa corporal e D) os
mesmos nove exercícios dinâmicos realizados com roupa que
pesa 6% da massa corporal. O desempenho no salto vertical foi
significativamente maior após o tratamento B (41,3 ± 5,4 cm) e C
(42,1 ± 5,2 cm) comparado a A (37,1 ± 5,1 cm), e o desempenho
do salto à distância foi significativamente melhor após C (180,5 ±
20,3 cm) comparado a A (160,4 ± 20,8 cm).
Não se observou nenhuma diferença significativa entre as situações
de jogar uma bola medicinal estando sentado ou num sprint de
10 metros. Os autores concluíram que o aquecimento dinâmico
realizado com um colete que pesava 2% do peso corporal pode ser o
protocolo de aquecimento mais eficaz para melhorar o desempenho
no salto de atletas do sexo feminino de escolas secundárias.
RESUMO E DISCUSSÃO
Estáclaroqueasrotinasdealongamentorealizadasantesdoexercício
podem aumentar a flexibilidade por até 90 min, mas há poucas evi-
dências científicas para sugerir que tais rotinas consigam melhorar o
desempenhonosexercícios,reduziradormusculardeiníciotardioou
evitar lesões. Ainda não há confirmação se o alongamento realizado
regularmente fora do contexto de exercícios seja eficaz para melhorar
o desempenho de alguns exercícios ou diminuir o risco da lesão.
Apesar de aumentar a amplitude de movimentos das articulações,
o alongamento um pouco antes do exercício pode causar deficits
temporários de força. Dados epidemiológicos indicam que o risco da
lesão aos músculos, tendões eligamentos estámais ligado à condição
aeróbica deficiente do atleta e não à flexibilidade insuficiente.
Como as evidências científicas são fracas para corroborar o benefício
do alongamento pré-exercício, por que é que textos de medicina
esportiva, especialistas médicos, fisiologistas, treinadores, personal
5. 5
trainers e técnicos continuam a recomendar esta prática? Herbert e
Gabriel (2002) estimaram que mesmo na melhor situação possível,
o atleta médio precisaria alongar antes da atividade por 23 anos para
evitar uma única lesão.Além disso, apesar de a ciência ser a maneira
mais objetiva para descobrir a verdade, ela não é a única maneira.
Muitos especialistas em saúde e esportes tiveram experiências clíni-
cas e práticas positivas com o alongamento e há milhares de relatos
de lesões que aconteceram em raras ocasiões quando atletas que
nunca tinham tido lesões deixaram de realizar o alongamento antes
do exercício. Há também críticas válidas sobre os dados científicos.
Estudos sobre o alongamento avaliaram diferentes tipos, durações e
frequências de alongamento em número limitado de atletas e apenas
emalgunspoucosesportes.Porexemplo,muitosdosdadosnegativos
sobre o alongamento estavam relacionados aos atletas de corridas
de longa distância, um esporte no qual a economia de corrida parece
melhorar com a redução, e não com o aumento da flexibilidade. Se
o alongamento talvez não seja útil para corredores de endurance, a
mesma premissa seria aplicada aos atletas que correm com barreira,
ginastas ou dançarinos, todos que tradicionalmente se beneficiam
com a flexibilidade? Finalmente, como descrito anteriormente, é
extremamente difícil, se não impossível, realizar um estudo sem
falhas sobre o efeito do alongamento no risco da lesão.
Como parece que o alongamento atinge o objetivo de aumentar a
flexibilidade ao redor das articulações, talvez o insucesso aparente
do alongamento para evitar lesões ocorra porque ele não é feito
no momento adequado antes do exercício ou o alongamento não
é necessário para todos os atletas. Talvez os atletas devam ser
avaliados individualmente para melhor entender como utilizar seu
tempo de preparo antes do exercício. Atletas inflexíveis podem
ser incentivados a incorporar um pouco do alongamento em uma
rotina global de aquecimento, enquanto outros indivíduos que já
tem uma excelente amplitude de movimento se concentrariam em
integrar a força, salto ou outras atividades no aquecimento.
Ingraham (2003) sugeriu que a maior parte dos técnicos, trei-
nadores atléticos e especialistas da medicina esportiva parecem
automaticamente presumir que quando um atleta estira um mús-
culo, ele teria que aumentar a flexibilidade para evitar lesões no
futuro. Ela especula que seria mais importante que esses atletas
melhorem sua condição física. Certamente, a correlação da condi-
ção aeróbica deficiente com aumento do risco da lesão parece ser
muito maior que aquelas observadas com a falta de flexibilidade
(Herbert & Gabriel, 2002).
Maiores estudos clínicos randomizados e controlados, incluindo
ambos os sexos, vários esportes e tempo adequado de acom-
panhamento ajudariam a esclarecer o papel do alongamento.
Estudos adicionais deveriam analisar o momento ideal para o
alongamento, assim como a padronização da sua qualidade e
duração. O alongamento excêntrico, o aquecimento e o con-
dicionamento aeróbico, estavam presentes em estudos sobre
os efeitos do alongamento no risco da lesão como fatores que
tendem a diminuir esse risco. Apenas quando os estudos apre-
sentarem controle adequado dessas variáveis será esclarecida
a contribuição específica do alongamento na prevenção da le-
são. Até que dados científicos mais fortes sejam apresentados,
aqueles que atuam em medicina esportiva e técnicos deveriam
oferecer conselhos cautelosos para os atletas. Uma abordagem
prática seria enfatizar a condição física aeróbica e o aqueci-
mento e permitir que o atleta, individualmente, tome a decisão
de incluir ou não o alongamento nesse esquema.
7. 7
Você Deveria Alongar
Antes do Exercício?
Jul/Ago/Setembro - 2008
Infelizmente não há nenhuma resposta simples para essa pergunta.
O que podemos dizer é que não há nenhuma evidência científica
sólida de que o alongamento, principalmente aquele realizado um
pouco antes do exercício, tenha quaisquer benefícios. Mas também
podemos dizer que não há nenhuma evidência sólida de que o aloga-
mento vá causar danos.Além disso, há uma longa tradição médica
e de técnicos que recomendam o alongamento antes do exercício,
que não deve ser ignorado. Portanto, os atletas que querem evitar
a lesão podem ou não beneficiar-se do alongamento como compo-
nente chave do aquecimento antes do exercício.
Um fator que claramente diminui o risco de lesão é manter uma boa
condição cardiovascular (aeróbica) durante todo o treinamento, fora da
temporada e enquanto estiver se recuperando de uma lesão. A prática
mais valiosa do aquecimento inclui atividades como corrida leve, nata-
ção,ciclismo,drillsespecíficos,salto,drillsdetiroaoalvo,etc.Essetipo
de aquecimento fará com que você esteja pronto para jogar ou praticar
com menor risco de distender um músculo ou apresentar outra lesão.
A DECISÃO É SUA!
Você deve incorporar o alongamento na sua rotina padrão de aque-
cimento? Lógico, se praticar algum esporte no qual a flexibilidade
é uma vantagem, como ginástica, corrida com barreira, mergulho,
dança, é preciso garantir uma excelente amplitude de movimento
ao redor de suas articulações. Particularmente, se você souber que
não é flexível, considere incluir o alongamento desde que integrado
a um programa que também inclua a atividade aeróbica como parte
do aquecimento. Na verdade, o alongamento deve ser sempre feito
após um período de exercícios aeróbicos quando seus músculos já
estiverem aquecidos, pois é mais fácil alongá-los e o efeito do alon-
gamento durará mais que quando alongados sem estarem aquecidos.
Se você já tiver excelente flexibilidade, seria melhor usar seu tempo
antes do exercício aumentando as atividades aeróbicas ou específicas
daquele esporte em seus procedimentos de aquecimento.
Mais que o alongamento antes do exercício, pense em fazer o alon-
gamento após o exercício ou em casa, fora do contexto esportivo
ou fora do ambiente de treino. A ciência indica que é mais prová-
vel que você se beneficie com este tipo de alongamento realizado
regularmente, talvez 3–5 dias por semana.
Se você pratica um esporte que exija saltos, levantamentos, arremes-
sos ou outros tipos de força de explosão, saiba que o alongamento
um pouco antes do exercício pode causar uma redução temporária
na força e provavelmente deve ser evitado antes da competição .
Portanto, se você sentir que o alongamento ajuda o seu desempenho
esportivo global, considere a implementação do seu programa de
alongamento após e não antes de seu evento.
Dicas de Alongamento
• Se você optar por fazer o alongamento, aqueça seus músculos
primeiramente com atividades aeróbicas tais como jogging, nata-
ção, ciclismo e calistênicos. Músculos aquecidos podem ser mais
facilmente alongados, com menor probabilidade de apresentarem
uma lesão. Muitos especialistas recomendam o alongamento
depois da prática esportiva e não antes.
• Alongamentos lentos mantidos por 15 a 30s e repetidos por até
três vezes em cada grupo muscular oferece tanto benefício quanto
qualquer outro esquema de alongamento. Se tiver um parceiro
para ajudá-lo com o alongamento, tenha cuidado para que esse
não o empurre com muita força, causando uma lesão relacionada
ao alongamento. Evite alongamentos balísticos ou de movimentos
repetitivos que podem causar lesões musculares.
• Como estudos científicos não provam claramente que há be-
nefícios com o alongamento, procure seguir diferentes rotinas
de aquecimento para determinar qual delas lhe deixa mais bem
preparado para participar de treinos e competições.
• Antes de voltar a participar de treinos ou competições muito
fortes após uma lesão, consulte seu treinador, um personal trainer,
um médico especialista em medicina esportiva ou um técnico
com bastante conhecimento para garantir que você tenha força
adequada no membro(s) que sofreu uma lesão. É particularmen-
te importante ter força na fase excêntrica de movimentos (por
exemplo, abaixar um peso, descer escadas, pular de pontos altos,
etc). Também é importante que você tenha força normal de seus
músculos do tronco e abdominais (força central) e ter recupera-
do sua sensação normal de equilíbrio e agilidade. Esses fatores
claramente diminuem o risco de apresentar nova lesão.
OUTRAS FONTES DE INFORMAÇÃO
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muscle soreness e risk of injury: a systematic review. Br. Med J. 325:468–470.
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